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Tensão no Congresso atrasa posse de Arévalo como presidente da Guatemala

Arévalo passou para o segundo turno presidencial em junho para enfrentar uma candidata conservadora aliada ao governo, a quem derrotou confortavelmente com 60% dos votos por sua mensagem anticorrupção

Presidente da Guatemala, Bernardo Arévalo. Foto: Johan Ordonez/AFP
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O Congresso da Guatemala se envolveu em discussões de última hora que atrasaram a posse do social-democrata Bernardo Arévalo como presidente, alvo de manobras judiciais que buscaram invalidar a surpreendente vitória que obteve nas urnas com a promessa de combater a corrupção.

Apesar de a Constituição da Guatemala estabelecer que o Congresso deve empossar o novo presidente até as 16h00 locais (19h00 de Brasília), ao final deste prazo, no domingo 14, nem mesmo o novo Parlamento estava instalado.

“Os deputados têm a responsabilidade de respeitar a vontade popular expressa nas urnas. Estão tentando violar a democracia com ilegalidades, trivialidades e abusos de poder”, escreveu Arévalo nas redes sociais.

O Congresso, majoritariamente de direita, não consegue chegar a um acordo na escolha da nova mesa diretora devido à discussão sobre se declarar os deputados do partido de Arévalo, o Movimiento Semilla (Movimento Semente, na tradução literal), como “independentes”, em virtude de uma ordem judicial de suspensão desse movimento político por supostas irregularidades em sua criação.

O atraso na posse gerou descontentamento entre os seguidores de Arévalo, incluindo muitos indígenas, que, em meio a empurrões com a polícia, abriram caminho em direção à sede do Parlamento. Até agora, a polícia não reprimiu a manifestação.

‘O povo está observando’

Sociólogo, ex-diplomata e filósofo de 65 anos, Arévalo passou inesperadamente para o segundo turno presidencial em junho para enfrentar uma candidata conservadora aliada ao governo, a quem derrotou confortavelmente com 60% dos votos por sua mensagem anticorrupção.

Desde então, Arévalo e o Semilla enfrentaram uma ofensiva judicial que ele denunciou como um “golpe de Estado”, envolvendo a elite política e econômica que tem governado o país por décadas.

O Ministério Público tentou retirar sua imunidade como presidente eleito, desmantelar seu partido progressista e anular as eleições, alegando irregularidades eleitorais.

A investida, baseada em casos “espúrios”, segundo Arévalo, foi condenada pela ONU, OEA, União Europeia e Estados Unidos, que sancionaram centenas de promotores, juízes e deputados por “corrupção” e “minar a democracia”.

Como mostra de apoio, a cerimônia de posse conta com a presença do chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, delegados de Washington, o rei da Espanha, Felipe VI, e, entre outros, os presidentes da Colômbia, Chile, Honduras e Panamá.

“O povo guatemalteco e a comunidade internacional estão observando”, acrescentou Arévalo nas redes sociais.

Uma reunião de chanceleres que participam da posse foi convocada urgentemente pela Costa Rica.

Poderá governar?

Arévalo substituirá o direitista Alejandro Giammattei, que foi vinculado ao chamado “pacto de corruptos”, durante cujo governo dezenas de promotores, juízes e jornalistas tiveram de se exilar após denunciarem atos de corrupção.

Filho do primeiro presidente democraticamente eleito da Guatemala, Arévalo reconhece que enfrentará enormes desafios, pois as “elites político-criminosas, pelo menos por um tempo, continuarão arraigadas” nos poderes do Estado.

Arévalo pedirá esta semana a renúncia da procuradora-geral Consuelo Porras, líder da ofensiva judicial. Analistas não descartam, porém, que o Ministério Público continue a perseguição e insista em pedir ao Congresso que retire sua imunidade presidencial.

“Estará sob cerco permanente. Seu maior desafio é atender ao desejo do povo: não ser governado pelo pacto de mafiosos. Ele precisa desmantelá-lo; caso contrário, não poderá governar”, disse o analista Manfredo Marroquín à AFP.

“Não está tudo em suas mãos”

A Guatemala que Arévalo herda ocupa o 30º lugar entre 180 países no ranking de corrupção da Transparência Internacional e tem 60% de seus 17,8 milhões de habitantes vivendo na pobreza, um dos índices mais altos da América Latina.

Dezenas e milhares de cidadãos emigram todos os anos para os Estados Unidos em busca de trabalho e fugindo da violência das gangues e do tráfico de drogas.

“Não está tudo em suas mãos, não esperamos uma mudança de 100%, mas que cumpra o que disse”, declarou Hellen Chua, estudante universitária de 18 anos.

Arévalo disse no sábado que “o mais urgente” é recuperar as instituições “cooptadas pelos corruptos”, mas “o mais importante” é trabalhar pelo desenvolvimento social no ataque à pobreza.

Com esse objetivo, ele nomeou um gabinete com 14 ministros. Mas foi criticado por alguns apoiadores por incluir figuras do setor privado ou vinculadas a governos anteriores, e somente um indígena.

Filho de Juan José Arévalo (presidente de 1945-1951), defensor de importantes reformas sociais no país, nasceu em Montevidéu. Na infância, morou na Venezuela, no México e no Chile, no exílio de seu pai após o golpe orquestrado pelos Estados Unidos em 1954 contra o progressista Jacobo Árbenz.

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