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Frustração marca um ano do início dos protestos na Turquia

Em 28 de maio de 2013, ambientalistas montaram barracas no Parque Gezi, em Istambul, que deram início manifestações em todo o país contra o governo. Um ano depois, ativistas dizem que nada melhorou

A forma de protesto dos turcos: ficar em pé, imóveis, diante do retrato de Ataturk, fundador da República Turca
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Para o artista turco Erdem Güngüz não há motivo para comemorar o primeiro aniversário do início dos protestos no Parque Gezi. Há um ano, ele passou horas na Praça Taksim, imóvel, com o olhar voltado para o retrato do fundador da República da Turquia, Mustafá Kemal Atatürk. Güngüz protestava em silêncio contra a violência policial durante as manifestações.

Milhares de pessoas o imitaram. Como o “homem em pé”, ele se tornou um símbolo do movimento de protesto. Em entrevista à DW, o ativista de 34 anos diz que, hoje, o governo turco ainda controla tudo – “a mídia, a Justiça e o aparato policial”. E continua aplicando a força para controlar as vozes opositoras.

“Se dez manifestantes saem às ruas, então logo aparecem 60 policiais e um canhão de água. Nós não ganhamos nada com as manifestações. Não há progresso nenhum. A mídia ainda não é livre e independente. Nós nos encontramos na mesma situação, se não pior, que um ano atrás”, conta.

Gündüz lembrou o acidente na mina de carvão em Soma, que provocou, recentemente, a morte de mais de 300 mineiros. Para que o aniversário dos protestos faça algum sentido, segundo ele, as pessoas deveriam se dirigir aos túmulos das vítimas em Soma.

A importância da mídia social
No ano passado, a restrita liberdade de imprensa esteve no foco dos protestos de massa. Enquanto a mídia turca, inicialmente, pouco noticiou sobre o movimento no Parque Gezi, em redes sociais registrou-se um verdadeiro estado de emergência.

Milhões de cidadãos furiosos utilizaram a internet para divulgar as suas causas. Em questão de segundos, vídeos e fotos foram divulgados. Imagens de pessoas detidas e jornalistas agredidos correram o mundo – como um vídeo que mostra o jornalista Gökhan Bicici sendo pisoteado por quatro policiais. “A solidariedade nas redes sociais me toca até hoje”, diz Bicici.

Em entrevista à DW, ele conta que a internet se tornou um poderoso instrumento da sociedade. “Essa era a única forma de contornar a censura. Até hoje, o governo vê as redes sociais como um perigo.” Por isso, continua o jornalista de 35 anos, o Twitter e o YouTube foram bloqueados.

Desde os protestos do Parque Gezi, surgiram muitos projetos jornalísticos na internet, conta Bicici. Neste ano, ele criou a agência de notícias Dokuz8haber, que agrega diversas redes sociais. “O interesse das pessoas cresce a cada dia”, afirma o jornalista.

Esperança na sociedade civil
Mas precisamente devido aos protestos do Parque Gezi o estilo de governo em Ancara tornou-se mais autoritário, critica o cientista político e colunista Cengiz Aktar. Ele afirma que as manifestações de massa foram o primeiro grande desafio para o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan. “Ele não tem medo dos partidos de oposição, mas do poder das ruas e dos protestos”, assinala.

Além disso, o cientista político enfatiza que na Turquia, mesmo um ano após os protestos, não existe alternativa política significativa para o partido islâmico conservador no governo, o AKP. Após o êxito de Erdogan nas eleições municipais, de acordo com ele, quem está por fora pode realmente achar que os protestos não levaram a nada.

“Mas as manifestações foram um divisor de águas na mente das pessoas. O medo de expressar livremente a opinião diminuiu agora”, opina.

Segundo Bicici, através dos protestos do Parque Gezi, surgiu uma sociedade civil corajosa e dinâmica: “Particularmente o procedimento duro do governo é uma prova disso.”

Mas não se deve esquecer, afirma o jornalista, que o poder de um governo tem sempre uma limitação temporal – ao contrário de mudanças sociais sustentáveis, que podem ter um efeito de longo prazo: “A sociedade civil é o futuro da Turquia.”

  • Edição Rafael Plaisant

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