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Evo Morales retorna à Bolívia em caravana histórica após exílio

Ex-ministro da Economia de Evo, Luis Arce, tomou posse neste domingo como presidente no país

Evo Morales, ex-presidente da Bolívia. Foto: Twitter
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O ex-presidente Evo Morales vai atravessar a fronteira da Argentina com a Bolívia, acompanhado pelo presidente argentino, Alberto Fernández, de quem se despedirá para iniciar a travessia de quase 1.100 Km por três departamentos bolivianos, onde fará atos políticos.

 

Em vídeo divulgado antes de viajar, ele agradeceu a solidariedade de presidentes da esquerda latino-americana entre os quais Lula e Dilma Rousseff.

“Voltaremos e seremos milhões” é o título do livro que Evo Morales lançou em agosto na Argentina. A frase é seu mantra desde o 11 de novembro de 2019, quando abandonou a Bolívia rumo ao México e, um mês depois, à Argentina.

O lema, na verdade, baseia-se nas palavras do cacique aimará Tupac Katari que, em 1781, foi capturado pelos colonizadores espanhóis depois de, por duas vezes, cercar com mais de 40 mil homens a cidade de Chuquiago (atual La Paz). Antes de ser cortado em pedaços, o líder indígena pronunciou a profecia que Morales, também aimará, adotou ao longo do último ano.

A frase é erroneamente atribuída à argentina Eva Duarte de Perón, a protetora dos pobres. Em 1959, os pais do bebê Juan Evo Morales Ayma pretendiam chamar a filha com o nome da famosa argentina. Nasceu um menino. Ficou Evo, um nome incomum, mas que há 15 anos ecoa pela América Latina.

A caravana que parte nesta segunda-feira 9 da cidade boliviana de Villazón, na fronteira com a Argentina, vai chegar a Chimoré, em Cochabamba, na próxima quarta-feira 11, exatamente um ano depois do périplo que Morales traçou como refugiado. Ao chegar a Chimoré, Evo poderá dizer que voltou e que representa milhões, os mesmos que votaram no seu candidato eleito com 55,1% dos votos no primeiro turno, Luis Arce.

O ex-ministro da Economia de Evo Morales tomou posse neste domingo 8, mas Morales preferiu não participar da cerimônia para “não lhe roubar protagonismo”.

Volta triunfal

Na manhã desta segunda-feira, ainda do lado argentino da fronteira, em La Quiaca, o presidente argentino Alberto Fernández fará um ato de despedida para Evo Morales. Será também o momento do agradecimento de Morales, que repete que “Fernández lhe salvou a vida”.

“Parte de mim, fica na Argentina”, disse um emocionado Evo Morales antes de viajar à fronteira, depois de onze meses em Buenos Aires, desde 12 de dezembro, dois dias depois da posse do argentino Alberto Fernández.

“Quero agradecer ao irmão presidente Alberto Fernández, que nunca me abandonou desde o primeiro momento”, ressaltou, incluindo também o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador.

Num vídeo que divulgou antes de viajar à fronteira neste domingo, Evo Morales também agradece “o apoio incondicional e solidário de Dilma e Lula”.

Desde o começo, o plano de Evo Morales era, na verdade, instalar-se em La Quiaca para, a partir da fronteira com a Bolívia, coordenar melhor a campanha eleitoral do seu candidato. Na época, o governo argentino, dependente do apoio de Donald Trump para renegociar a dívida externa, cedeu aos interesses dos Estados Unidos.

“Eu tinha um plano de ficar na fronteira para ter reuniões porque estávamos em campanha, mas os Estados Unidos não deixaram e eu não queria causar problemas (à Argentina)”, contou Morales, para quem “os Estados Unidos não queriam que ele voltasse à Bolívia e queriam destruir o Movimento Ao Socialismo”, seu partido.

“Os Estados Unidos conseguiram duas coisas: que o Evo não seja o presidente por mais cinco anos e destruir a economia nacional”, acusou Morales, referindo-se a si em terceira pessoa.

O presidente argentino também chegou a La Quiaca na noite de domingo, vindo da posse de Luis Arce em La Paz. Depois da despedida simbólica do lado argentino, Alberto Fernández e Evo Morales vão atravessar a fronteira até Villazón, do lado boliviano, onde haverá outro ato, desta vez, de boas-vindas.

Por volta do meio-dia, a caravana com cerca de mil veículos começará uma travessia que por três departamentos (estados) bolivianos, Potosí, Oruro e Cochabamba, até o destino final em Chimoré, Cochabamba, reduto eleitoral e berço político-sindical de Evo Morales.

“No dia 11 de novembro, eu saí de Chimoré para salvar a minha vida. No dia 11, voltarei com vida a Chimoré”, compara Morales com tom épico.

A procissão cruzará cerca de 30 municípios, em alguns dos quais haverá também atos políticos entre bandeiras Wiphala, o colorido símbolo dos povos indígenas que a reconhecem mais do que a própria bandeira da Bolívia.

Futuro de Evo Morales

O ex-presidente garante que ficará em Chimoré, onde será dirigente das chamadas Seis Federações de cocaleiros (cultivadores de coca). Evo Morales promete que não intercederá no governo de Luis Arce e que se dedicará ainda à agricultura e à piscicultura.

“Posse compartilhar a minhas experiências com Luis Arce e vou apoiá-lo com os movimentos sociais para defender o nosso processo de mudança como ex-autoridade ou como militante, mas não serei parte”, afirma. “Vou também compartilhar a minha experiência de luta sindical e de gestão pública com os jovens e formar novos lideres”, acrescenta.

No entanto, poucos acreditam nessa promessa. No dia 23 de outubro, Evo Morales viajou a Caracas para se reunir com o venezuelano Nicolás Maduro. Muitos viram nessa reunião política o indício de que não ficará afastado das decisões de governo. Arce deverá cuidar dos assuntos relacionados com a Economia enquanto Morales deve ficar com a política interna e com a relação com os aliados externos.

“Com Evo Morales de volta, a Bolívia alinha-se novamente com a Venezuela e com a Argentina. Ele é o dono do partido e da extensão territorial do partido. Luis Arce vai governar, mas o poder estará com Morales, o verdadeiro presidente respirando na nuca de Arce”, afirma à RFI o analista político boliviano, Raúl Peñaranda.

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