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Entenda a COP26 em cinco destaques que marcaram a Conferência do Clima de Glasgow

As decisões finais da Conferência do Clima da ONU devem ser anunciadas neste sábado

Foto: ELLIS / AFP
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As negociações entre os 196 países participantes da COP26, em Glasgow, avançaram na madrugada nesta sexta-feira 12 e as decisões finais da Conferência do Clima da ONU devem ser anunciadas apenas neste sábado 13. Entenda os fatos marcantes da cúpula.

O principal objetivo da reunião era definir uma trajetória clara até o fim desta década, para que os países consigam atingir as promessas do Acordo de Paris sobre o Clima. O tratado estabelece as linhas gerais para que seja possível limitar o aquecimento do planeta a no máximo 2°C e, tendo como ideal uma alta de 1.5°C até o fim do século, em relação ao período pré-industrial.

A conferência trouxe avanços, ao incluir pela primeira vez a intenção de promover o abandono progressivo de energias fósseis – como carvão, petróleo e gás – e mencionar a necessidade de os países aumentarem a ambição das suas metas nacionais de redução de emissões de gases de efeito estufa já no ano que vem. Entretanto, esses dois aspectos permanecem vagos e não resultaram em compromissos concretos em Glasgow.

“O que importa mesmo para termos avanços é a gente ter mais ambição. Ter os países dizendo quanto vão fazer, como vão fazer, com qual estratégia de implementação, quais os valores envolvidos, de onde virão os recursos. O que se consegue fazer nessas conferências é dar uma melhorada nesse panorama geral, detalhar como esses caminhos serão seguidos”, resume Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, que reúne 70 organizações e especialistas em mudanças climáticas.

“É por isso que, no final, sempre fica esse gosto agridoce. É tudo muito lento, e lá fora as mudanças climáticas já estão avançando sobre milhares de pessoas. O caminho não está traçado porque se você pegar todas as promessas que estão em cima da mesa hoje, a gente vai chegar num planeta com o dobro do aumento da temperatura recomendada pela ciência”, ressalta Astrini.

Financiamento

A questão do financiamento climático acirrou as tensões nas negociações ao longo da COP26 – as nações mais pobres perderam a paciência com as ricas, que até hoje não cumpriram a promessa de liberar 100 bilhões de dólares por ano. A COP26 reconheceu que esse valor, que sequer foi liberado, já é insuficiente e será necessário atualizar o aporte de recursos para que as nações em desenvolvimento sejam capazes de promover transições econômicas que custam caro, como a energética. O Brasil, por exemplo, insiste na liberação de mais dinheiro para ajudar a controlar o desmatamento da Amazônia, maior fonte de emissões do país.

Ao mesmo tempo, os países africanos e pequenas ilhas, os mais vulneráveis às mudanças climáticas, também não abrem mão de compensações pelos danos que eles já sofrem por causa do aquecimento global – provocado pelas emissões históricas dos países desenvolvidos.

“Na concepção dos países ricos, seria como se eles assumissem a culpa de tudo que aconteceu no planeta e criassem uma espécie de jurisprudência sobre qualquer coisa que vier a acontecer. É uma visão extremamente mesquinha e na defensiva dos países desenvolvidos”, frisa Astrini. “A gente vê os países se unindo para garantir os seus próprios interesses, e não para atacar o problema da crise climática.”

Volta dos Estados Unidos

O retorno dos americanos às negociações climáticas foi um ponto fundamental para a retomada de avanços nas Conferências do Clima. A saída do país do Acordo de Paris, promovida pelo ex-presidente Donald Trump, e a ausência dos Estados Unidos na última cúpula, em Madri, influenciaram países importantes no jogo climático, como o Brasil, e levaram o encontro de 2019 a um fracasso.

Desta vez, porém, foram as tensões políticas com a China que atrapalharam avanços maiores. Os dois países, responsáveis por 40% dos gases que causam o aquecimento global, chegaram a assinar uma declaração conjunta prometendo “fortalecer a ação climática”, mas não colocaram mais metas sobre a mesa. “Sempre que tivemos avanços mais significativos, como no Acordo de Paris, tínhamos uma movimentação mais decisiva e enfática dos americanos junto com os chineses, promovendo acertos meses antes da conferência, que geraram uma pressão muito grande sobre o restante do mundo”, relembra Astrini.

O especialista chama a atenção para um aspecto importante do documento, que pode atingir diretamente o Brasil: a intenção de acabar com “importações ilegais” de desmatamento – o que significa parar de comprar produtos que resultem da devastação das florestas.

“Isso deve mexer muito com a percepção nacional, no Brasil, sobre o desmatamento. O agronegócio já é muito preocupado com as restrições que a Europa já impõe e que vão ser endurecidas, com as restrições parciais nos Estados Unidos que poderão ser ampliadas para além da madeira. A China agora cita essa intenção pela primeira vez”, analisa Astrini. “Isso deve estar tirando o sono de muita gente lá.”

Brasil mais conciliador

A cúpula foi usada pelo governo brasileiro para tentar melhorar a sua imagem no exterior, degradada pelos sucessivos aumentos do desmatamento da Amazônia, entre outros retrocessos na área ambiental. O Brasil se apresentou com uma postura mais “construtiva” na COP e reiterou ter trabalhado por um consenso em todos os principais tópicos discutidos na conferência.

Logo no início do encontro, o país aderiu a dois compromissos importantes: um acordo internacional para a proteção de florestas e outro para reduzir em 30% as emissões mundiais de metano, num tópico que repercute na pecuária brasileira.

Sobre a regulamentação de um mercado global de carbono, previsto no Artigo 6 do Acordo de Paris, o Brasil fez concessões que até pouco tempo atrás não eram negociáveis para Brasília. Na última conferência, o governo brasileiro foi um dos que bloqueou um acordo sobre essa questão, insistindo num instrumento que permitiria a dupla contagem dos créditos de CO2 negociados – tanto para o país vendedor, quanto para o comprador, nas suas metas nacionais de redução de emissões. Agora, o Brasil aceitou o chamado mecanismo de ajustes correspondentes, que impede essa anomalia no cálculo.

Entretanto, embora mais conciliador, o atual ministro do Meio Ambiente insistiu em utilizar dados duvidosos para afirmar que o Brasil está combatendo adequadamente o desmatamento – a principal missão ambiental do país em termos de compromisso internacional. Nesta sexta, Ricardo Leite chegou a dizer que não tomou conhecimento dos últimos dados, revelados pelo sistema Deter, apontando que a área de alertas de desmatamento em outubro foi a maior para o mês em cinco anos, num total de 877 km2 de floresta derrubada na Amazônia.

De concreto, o que o governo apresentou nesta COP26 foi o maior aumento em 12 anos da devastação da Amazônia. Resultado: o Brasil estava apagado na conferência em Glasgow – longe de ter a relevância diplomática que costumava ter antigamente.

Participação indígena

Jovem brasileira Txai Surui na COP26.
Foto: Paul ELLIS / AFP

A COP de Glasgow também marca uma nova era da participação dos povos indígenas nas negociações internacionais sobre o futuro do planeta. Eles sempre atraíram olhares e flashes nas cúpulas da ONU, mas pela primeira vez as suas vozes ecoaram nas plenárias principais do evento, discursando diante de chefes de Estado.

A fala da jovem brasileira Txai Suruí na abertura da cúpula dos líderes, na semana passada, sensibilizou os participantes e consolidou o devido lugar dos indígenas nas COPs: junto à mesa de negociações. “Não é em 2030 ou 2050, é agora. Os povos indígenas estão na linha de frente da emergência climática e precisamos estar no centro das decisões que acontecem aqui”, disse Txai, em inglês.

Lideranças indígenas como Sônia Guajajara foram recebidas por nomes como o americano John Kerry, enviado especial do governo americano para as questões de clima, e o príncipe Charles, do Reino Unido. Um sinal claro deste reconhecimento foi o anúncio de um fundo inédito de 1,7 bilhão de dólares especificamente para os povos originários, para ajudá-los a proteger as florestas. Os recursos serão financiados por governos como Reino Unido, Alemanha, Noruega e Estados Unidos, além de grandes multinacionais.

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