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Congresso argentino aprova texto-base de reformas ultraliberais de Milei

Projeto inclui a concessão de superpoderes, ou “poderes delegados”, a Milei para governar por decreto

O presidente da Argentina, Javier Milei, no Fórum Econômico Mundial. Foto: Fabrice COFFRINI/AFP
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O pacote de reformas proposto pelo presidente argentino, Javier Milei, deu um primeiro passo, nesta sexta-feira 2, com a aprovação de seu texto-base pelos deputados, que continuarão analisando o projeto artigo por artigo a partir de terça-feira, após um longo debate acompanhado por protestos e incidentes em frente ao Congresso.

No encerramento do terceiro dia de sessões, a Câmara Baixa aprovou a chamada “Lei Ônibus” por 144 a 109, com os 38 votos da minoria oficialista de extrema direita e o apoio de forças aliadas e opositoras de centro direita, com as quais negociou até reduzir o projeto original pela metade.

“O objetivo é apoiar o governo e o presidente para que tenha os instrumentos”, disse Miguel Pichetto, líder de um grupo parlamentar misto crucial para obter a aprovação do texto-base.

Pouco antes da votação, ao compartilhar um texto que instava os legisladores a encerrar o debate, Milei publicou na rede social X: “Vocês têm hoje a oportunidade de mostrar de que lado da História querem estar”.

A votação é uma conquista política para o presidente, embora o projeto ainda precise ser debatido “artigo por artigo”, podendo sofrer alterações antes de passar para o Senado, onde a minoria oficialista espera reeditar alianças.

O projeto inclui a concessão de superpoderes, ou “poderes delegados”, a Milei para governar por decreto, dispor a venda de empresas públicas, contrair dívida externa sem aval parlamentar e desregulamentar toda a atividade econômica, entre outras reformas de sua ideologia autodefinida como “anarcocapitalista”.

Poderes delegados e dívida

Grande parte da discussão centrou-se nos “poderes delegados”, que, segundo os opositores, implicam “conceder a soma do poder público”, bem como nas privatizações e na captação de dívida externa sem aprovação do Congresso.

O deputado opositor Máximo Kirchner lembrou que o atual ministro da Economia, Luis Caputo, era funcionário do ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019) quando a Argentina negociou um empréstimo de US$ 44 bilhões (R$ 217,6 bilhões, na cotação atual) com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

E Caputo “foi à comissão bicameral de dívida quase com as mesmas frases que está dizendo agora de recuperar a confiança no mundo”, alertou o filho dos ex-presidentes Néstor Kirchner e Cristina Fernández de Kirchner.

“Nós argentinos já sabemos o que acontece quando o modelo econômico se centra no ajuste e na desregulamentação”, alertou por sua vez o deputado opositor Leandro Santoro, evocando os ajustes que desencadearam a crise econômica e social de 2001.

Vários deputados opositores denunciaram não ter visto uma cópia da versão final redigida pelo oficialismo após negociações difíceis.

“Temos duas opções claras”, leu a deputada Lorena Villaverde, do partido A Liberdade Avança, de Milei: “Nos tornarmos a maior favela do mundo, ou dar continuidade a este caminho, em direção à prosperidade e à liberdade”.

Balas de borracha e gás lacrimogêneo

Na quinta-feira, centenas de manifestantes contrários às reformas que protestavam em frente ao Congresso foram reprimidos por policiais com balas de borracha, bombas de gás lacrimogêneo e jatos d’água, até serem dispersados.

“Houve excessos”, respondeu um dos líderes da bancada governista, José Luis Espert, em coletiva de imprensa na porta do Congresso, ao ser perguntado sobre a ação das forças de segurança que deixou dezenas de feridos, segundo a AFP conseguiu comprovar.

O porta-voz da Presidência, Manuel Adorni, informou nesta sexta-feira que os incidentes deixaram oito presos e que sete agentes das forças de segurança ficaram feridos devido aos “atos de violência”.

Forças da polícia militarizada haviam alertado que respeitariam o protocolo de restrições severas às manifestações de rua criado por Milei e por sua ministra de Segurança, Patricia Bullrich.

“Houve alguns pequenos momentos de tensão”, comentou Bullrich aos jornalistas, alegando que os argentinos precisam de uma “mudança cultural” para acabar com a “tomada das ruas”.

Ajustes em andamento

Milei já ditou um megadecreto que modifica centenas de normas e leis, para reverter com amplas desregulações uma crise que mantém mais de 45% dos argentinos na pobreza, com uma inflação anual de 211% em 2023.

Antes, o ultraliberal avançou com uma desvalorização do peso de 50% e a liberação de todos os preços da economia, o que acelerou a inflação a 25,5% em dezembro.

Milei também renovou o programa creditício de US$ 44 bilhões com o FMI, que elogiou esses primeiros ajustes, mas previu uma recessão de 2,8% da economia argentina em 2024.

Na quarta-feira, o Fundo aprovou o desembolso de US$ 4,7 bilhões (R$ 23,1 bilhões) – para pagamento de sua própria dívida – em apoio às “medidas econômicas” de Milei, embora tenha advertido que “o caminho para a estabilização será difícil”.

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