Justiça
Só Kássio e Mendonça fazem ‘ponderações’ sobre decisão de Dino a respeito de emendas
Em julgamento no plenário virtual, o STF referendou por unanimidade a liminar do relator


Os ministros do Supremo Tribunal Federal Kassio Nunes Marques e André Mendonça foram os únicos a apresentar votos individuais no julgamento em que a Corte confirmou a decisão do ministro Flávio Dino de liberar o pagamento das emendas parlamentares, condicionado ao cumprimento de regras sobre transparência, rastreabilidade e controle público do dinheiro.
O julgamento ocorreu no plenário virtual entre a segunda-feira 2 e esta terça 3. Nesta modalidade, os ministros apenas depositam seus votos no sistema eletrônico, sem uma reunião presencial. Todos os magistrados acompanharam o relator, inclusive Mendonça e Kássio, mas os dois indicados por Jair Bolsonaro (PL) publicaram os chamados “votos vogais”.
Mendonça frisou a “elevadíssima relevância” do princípio de transparência e o “caráter imprescindível” da rastreabilidade. Também enfatizou a possibilidade de uma nova análise do tema quando o STF julgar o mérito de ações correlatas, “segundo parâmetros que consideram a boa governança e a necessidade de continuidade das políticas públicas”.
Kássio Nunes, por sua vez, afirmou que apresentaria “ponderações”. Ele defendeu um “balanço entre transparência e discricionariedade nas escolhas dos governos federal, estaduais e municipais”.
“Nossos representantes eleitos, tanto no Executivo quanto no Legislativo, são os responsáveis primeiros pela definição e concretização das políticas públicas, cujas balizas já se encontram definidas na Carta Federal, razão por que devem, dentro de sua margem de discricionariedade, isto é, dentro de seus critérios de conveniência e oportunidade, dar cumprimento aos princípios e garantias de nossa Lei Fundamental.”
Ele disse já ter reconhecido “a maior autonomia do Congresso na alocação das verbas por meio de emendas” e elogiou uma recente lei sancionada pelo presidente Lula (PT) para tratar desses recursos.
Segundo Kássio, a Lei Complementar 210, de 25 de novembro, “trouxe novas balizas que buscam trazer ainda maior grau de transparência, rastreabilidade e eficiência, tudo em harmonia com os objetivos previstos na Constituição Federal acerca da alocação das verbas públicas por meio de emendas”.
Na decisão de segunda-feira, agora referendada pelo plenário, Dino definiu uma série de critérios para liberar o pagamento das emendas — suspenso desde agosto —, como a indicação do autor e do beneficiário final dos recursos no Portal da Transparência, além da separação entre o relator do Orçamento e o autor das emendas.
Nas emendas Pix, Dino exigiu que, a partir de 2025, a liberação somente ocorra com a apresentação de um plano de trabalho prévio e em contas especificas. No caso das emendas de exercícios anteriores, haverá um prazo de 60 dias para resolver o plano de trabalho.
Para os outros tipos de emenda, há critérios específicos:
- Emenda de Bancada: é fundamental, segundo Dino, que não haja “individualização da emenda”. Nesse caso, será marcada uma auditoria para outubro de 2025, a fim de acompanhar o processo de execução;
- Emenda de Relator (RP 9) e Emenda de Comissão (RP 8): o primeiro caso é o tipo de emenda apresentada pelo próprio parlamentar, enquanto no segundo caso cabe às comissões técnicas do Congresso. Dino determinou que ambas estão “liberadas com a devida identificação dos parlamentares”. Segundo o ministro, “cabe ao Executivo aferir a transparência e liberar caso a caso”;
- Emenda para ONGs: nesse caso, ela “só pode ser liberada com a devida publicação em site”. Assim, segundo a decisão, “caso não haja, não pode haver liberação nem das antigas e nem das futuras”;
- Emenda para a Saúde: elas “precisam de indicações técnicas do gestor federal, com necessidade de aprovação nas comissões bipartite e tripartite do SUS”. Se não houver aprovação prévia, a emenda não será liberada.
O relator anotou, a partir de relatórios da Controladoria-Geral da União, ter havido um descumprimento dos requisitos de transparência e rastreabilidade na execução das emendas de todas as modalidades. Entre 2019 e 2024, o montante pago chegou a 186,3 bilhões de reais, com origem e destino desconhecidos.
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