Justiça

Partidos pedem que o STF suspenda acordos entre empresas e Lava Jato feitos em ‘situação de coação’

Pedido foi feito pelo PSOL, PCdoB e Solidariedade, que argumentam que os acordos foram feitos em situação de ‘extrema anormalidade’; partidos criticam o MPF por ter agido de maneira ‘inconstitucional’ durante a Lava Jato

Foto: Jorge Araújo/Folhapress e Evaristo Sá/AFP
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Partidos que compõem a base do governo federal ingressaram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de suspender as multas e indenizações impostas em todos os acordos de leniência firmados antes de agosto de 2020 entre a Justiça e as principais empresas investigadas no curso da Operação Lava Jato. Assinam a ação o PSOL, o PCdoB e o Solidariedade.

Os argumentos dos partidos

A ação proposta pelos partidos é uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), um instrumento que visa, segundo a Constituição, evitar ou reparar uma lesão a algum preceito fundamental, em decorrência de um ato do poder público. No pedido, os partidos argumentam que os acordos foram realizados em “situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional”, mediante uma “situação de coação”.

“Um modelo constitucionalmente adequado de enfrentamento da corrupção por meio de acordos de leniência tem de (i) prever a possibilidade de repactuação; (2) preservar a companhia, prevendo, conforme o caso, a compensação de crédito tributário ou em precatórios. Caso contrário, o Judiciário chancelará uma dicotomia inconstitucional, a pretexto de combate à corrupção, entre a persecução estatal e a garantia fundamental da função social da empresa”, argumentam os partidos no pedido ao STF.

Entre as empresas que, segundo os partidos, foram coagidas aos acordos de leniência pela Lava Jato, estão as empreiteiras Odebrecht, OAS, Andrade Gutierrez, UTC e Camargo Corrêa.

Segundo os partidos, esse conjunto de empresas foi obrigado a celebrar acordos com agentes da Operação Lava Jato, a fim de se evitar “um mal maior”. De acordo com a ação, os documentos assinados pelas empresas possuem vício de validade.

Dessa forma, seria necessária uma revisão nos acordos realizados, que estariam, de acordo com os partidos, “superfaturados”. Os partidos dizem que as indenizações e multas impostas estão acima da capacidade de pagamento das empresas.

Críticas ao MPF e pedido sobre a CGU

No corpo da ação, os partidos afirmam que o Ministério Público Federal, durante a Operação Lava Jato, agiu “de forma inconstitucional”. Os partidos acusam o MPF de “chamar para si todos os acordos de leniência”. Um dos membros do MPF durante o período da Operação Lava Jato ao qual os partidos se referem é o atual deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR).

O MPF, segundo os partidos, agiu de modo a causar “graves distorções na parte pecuniária dos acordos, que não observaram, nem de longe, os critérios revelados pelo ACT”.

O ACT – Acordo de Cooperação Técnica -, foi firmado entre o STF, a Controladoria Geral da União (CGU), a Advocacia-Geral da União (AGU), o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério da Justiça. Em resumo, o acordo atribuiu à CGU um papel central no desenvolvimento de termos de leniência com as empresas. Segundo os partidos, os acordos para os quais pedem a suspensão não contaram com a participação órgãos representativos da União.

Por isso, os partidos pedem, também, que a celebração de acordos dessa natureza seja feita pela CGU, de modo que o órgão fique responsável pela revisão de todos os acordos, por meio de critérios que, segundo pedem os partidos, sejam fixados pelo STF.

Lava Jato e o setor de construção

Desde que os primeiros casos envolvendo empreiteiras foram sendo investigados – e julgados –, um dos argumentos contrários ao modo de atuação da Lava Jato (principalmente, na atuação do ex-juiz Sergio Moro e de membros do MPF) é o de que, na prática, as multas e indenizações foram responsáveis pelo desmonte do setor de construção no Brasil, assim como a perda de empregos.

Segundo cálculos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), revelados em 2021, o valor de total de multas e indenizações aplicadas pela Operação Lava Jato, até o ano de 20202, era de aproximadamente 153 bilhões de reais. O valor representa 25 vezes mais do que o montante que a Lava Jato afirma ter recuperado.

Além disso, o mesmo estudo mostrou que as multas e indenizações aplicadas pela Operação Lava Jato causaram cerca de 4,4 milhões de desempregos. Do total, cerca de 1 milhão aconteceu apenas no setor de construção civil, uma vez que as empreiteiras – historicamente, as principais do país – declararam incapacidade financeira e paralisaram obras.

Moro e Dallagnol reagem

Dois dos principais nomes das primeiras fases da Operação Lava Jato, Sergio Moro e Deltan Dallagnol, pronunciaram-se sobre a ação promovida pelos partidos da base do governo federal.

Nas redes sociais, Dallagnol perguntou se os partidos desejam impedir que as empresas paguem os valores. “O que você sentiria ou pensaria, em uma frase, se descobrisse que partidos aliados de Lula querem impedir que as empreiteiras que fizeram acordos na Lava Jato devolvam o dinheiro de corrupção desviado dos cofres públicos?”.

Sergio Moro, por sua vez, disse que a ação “está sendo usada em prol do mundo do crime e contra o cidadão”. 

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