Justiça

Muito prazer! Nós somos as Sororas e viemos falar de Sororidade!

Há dois anos, nós, mulheres, juízas, espalhadas pelos quatro cantos desse país, até então sozinhas com nossas angústias, resolvemos dar as mãos e tecermos uma linda teia de escrita, afeto e luta por direitos. Foi aí que surgiu a coluna do COLETIVO SORORIDADE EM PAUTA, […]

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Há dois anos, nós, mulheres, juízas, espalhadas pelos quatro cantos desse país, até então sozinhas com nossas angústias, resolvemos dar as mãos e tecermos uma linda teia de escrita, afeto e luta por direitos. Foi aí que surgiu a coluna do COLETIVO SORORIDADE EM PAUTA, que publicamos durante dois anos no Justificando, a quem externamos nossa profunda gratidão pela acolhida e pela oportunidade.

Nesses dois anos, escrevemos sobre liberdade, patriarcado, naturalização do ódio, misoginia, maternidade, paternidade, a decisão por ser ou não ser mãe, maternidade negra, maternidade e trabalho, trabalho da mulher brasileira, terceirização e as mulheres, greve, desvalorização do trabalho feminino, reforma trabalhista, trabalho das mulheres em comunidades tradicionais e comunidades extrativistas, feminismo e agroecologia, ecofeminismo, resistência indígena feminina, estupro, cultura do estupro, aborto, as regras impostas ao corpo da mulher, violência doméstica, violência contra a mulher, menopausa, mercantilização da saúde e violência obstétrica, a mulher e a democracia, golpe contra a primeira mulher Presidenta da República do Brasil, literatura e direitos, a mulher no Poder Judiciário, diversidade de gênero, (in)visibilidade trans, transfeminismo, futuro da sororidade, mulheres negras, mulheres no cárcere, alienação parental, casos da vida real na jurisdição, juízas sororas, sororas no sertão, ensino religioso em escolas públicas e escola sem partido, prisão domiciliar a presas gestantes ou com filhos pequenos, mulheres escritoras, manterrupting, gaslighting, mansplaining e bropriating, carnaval e política, desigualdade de gênero na filosofia e na ciência, política pró-equidade de gênero raça e diversidade no TRT-4, Dia Internacional da Mulher, Carta ao Presidente Lula, mulher e espaços de poder, o medo dos homens, construção da história, solidariedade, incesto, revitimização, austeridade e austericídio, política: substantivo feminino, além de destacar o exemplo de tantas mulheres inspiradoras, dentre elas Antonieta de Barros, Kenarik Boujikian – nossa musa,  Lyège – nossa eterna saudade e, como não poderia deixar de ser, Marielle, Sempre Presente!

Hoje se abre um novo e delicioso desafio às Sororas! Embarcamos agora na CartaCapital e estamos prontas para singrar novos mares, cruzarmos oceanos, remarmos, trabalharmos, escrevermos, lutarmos incansavelmente por direitos humanos, pelos direitos das mulheres, para contarmos casos, estórias, histórias, juntas nos emocionarmos, denunciarmos injustiças, esclarecermos direitos, refletirmos, instigarmos, estamos prontas para “avariarmos a máquina de dominação patriarcal”.

Neste novo desafio, aprofundamos as nossas reflexões para afirmar que continuamos precisando entender o que é sororidade e, na condição de mulheres que ocupam cargos de poder, assumimos o compromisso de continuar falando sobre ela. Isso porque, sem a pretensão de invadirmos lugares de fala, temos a consciência dos nossos privilégios e da responsabilidade deles decorrente na construção de uma realidade onde todos consigam compreender as estruturas que encobrem e naturalizam violências que se voltam contra o convívio pacífico e igualitário entre os seres humanos.

Aqui não se trata apenas de falar de assuntos de mulher mas sim um outro jeito de criar, coletivo, acolhedor, que abra mão da solidão do protagonismo para irmos além.

Como magistradas, somos cientes de que ocupamos um espaço privilegiado em nossa sociedade. No entanto, ao integrarmos o Poder Judiciário, eminentemente masculino, constituímos uma minoria política e, a partir deste lugar de fala, buscamos reverberar essa vontade premente de que as mulheres (magistradas ou não) ocupem os espaços públicos, com a consciência de que ainda o faremos sem desocupar aquele outro (o “espaço privado”, “doméstico”) no qual nos colocaram em tempos passados e que, pela própria forma de constituição de nossa sociedade patriarcal, continuamos a preencher.

Leia também: Eu, mulher e juíza pelos direitos humanos

Encontro das Sororas. Foto: Arquivo Pessoal

Ousamos dizer que, daqui pra frente, mais do que nunca, a Sororidade se torna fundamental, pois temos ciência de que não somos apenas uma variável a ser incluída em quaisquer políticas públicas, negligenciadas pelo debate do que verdadeiramente importa: políticas afirmativas que observem os recortes de classe, raça e gênero, o que continuaremos denunciando neste espaço.

Mesmo que a distância geográfica deste nosso Brasil tão imenso quanto desigual teime em nos separar, a tecnologia e principalmente a afinidade e o afeto da luta compartilhada nos fornecem o fio para tecer a rede da construção coletiva tão necessária em tempos de individualismo e entorpecimento.

E acreditamos que uma forma de sairmos desse individualismo e torpor é trazer esse debate para o nosso cotidiano, falar de direitos, falar do patriarcado, de cidadania, e também falar dos medos das pessoas, do medo que o neoliberalismo necessita que todos nós sintamos, de felicidade e de amor. Falar disso é falar de política, é pensar de forma crítica, é, enfim, “desdemonizar” a política, naturalizá-la, trazê-la para as conversas com amigos, filhos, na hora do almoço, para o intervalo no trabalho, enfim, no nosso dia a dia, e aí avançarmos como sociedade.

Queremos mais do que a presença física das mulheres no espaço de poder, ou a composição paritária em uma mesa científica – não que isso não seja importante e é, porque isso já demonstra o nível de preocupação da temática. Nosso anseio é por mulheres engajadas com as causas, especialmente comprometidas com a perspectiva democrática de construção das ações políticas afirmativas. Isso sim fará toda a diferença.

Leia também: Boas vindas à editoria de Justiça da Carta Capital

Não nos basta a fala política, projetada através de uma mulher, em ministério denominado “das Mulheres”, que reforce a perda de pequenas vitórias alcançadas ao longo dos anos, como é o caso da proposta de desengavetamento do antigo projeto de “bolsa estupro”.

O protagonismo dessas mulheres precisa ser valorizado em todos os campos, da esfera de relações públicas, às dimensões privadas de convivência. Neste ponto, acreditamos que a ocupação do espaço público somente será viável se enfrentarmos uma das muitas barreiras: a politização do espaço doméstico, pela luta igualitária do cuidado, afinal não basta para nós mulheres terceirizamos o cuidado, remunerando-o, que ele será executado por outra mulher, de classe social mais baixa, muito provavelmente negra, tampouco exigir do Estado a implementação de creches (ainda que elas sejam necessárias, mas não resolverão o problema), porque elas serão também ocupadas por mulheres. A luta deve ser pela divisão equânime da responsabilidade pelo cuidado, assim estaremos efetivamente buscando a almejada igualdade de gênero.

Somos e seremos tantas mais nos espaços públicos, redimensionando papéis e redistribuindo responsabilidades nos espaços íntimos que abater Marielles não será uma opção ao patriarcado. Estamos multiplicadas em tantas Marielles: Joênia Wapichana (RR), primeira mulher indígena eleita deputada federal; Renata Souza, Dani Monteiro, Mônica Francisco e Talíria Petrone, vereadora em Niteroi e hoje eleitas para a ALERJ e Câmara Federal; Érica Malunguinho, primeira transgênera eleita deputada estadual em SP; Juntas, primeira composição coletiva a ocupar uma das cadeiras da ALEPE, sendo integrada por cinco mulheres (uma estudante, uma ambulante, uma jornalista e uma advogada – a primeira trans nesse cargo).

Nossa caminhada até aqui nos ensinou a encontrar nas outras mulheres inspiração e apoio, não mais risco e competição. Sinergia é a ação que nos define. Juntas produzimos uma força maior que a soma dos nossos esforços. Nossa decisão de caminharmos juntas, com as mãos presas umas às outras, nos fez perceber que a construção histórica, em especial dos direitos humanos, tem sido erguida por mãos femininas e por esta razão entendemos que também devemos assumir esta narrativa. Ninguém solta a mão de ninguém. Vamos juntxs!

Quem somos

  • Ana Cristina Borba Alves – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Ana Carolina Bartolamei Ramos – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Célia Regina Ody Benardes – Juíza Federal e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Cláudia Maria Dadico – Juíza Federal e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Daniela Valle da Rocha Müller – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Elinay Melo – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Fernanda Menna Pinto Peres – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Fernanda Orsomarzo – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Gabriela Lenz de Lacerda – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Janine Soares de Matos Ferraz – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Juliana Castello Branco – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Laura Rodrigues Benda – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Lúcia Rodrigues de Matos – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Naiara Brancher – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Nubia Guedes – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Patrícia Maeda – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Renata Nóbrega – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Roselene Aparecida Taveira – Juíza do Trabalho e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
  • Uda Schwartz – Juíza de Direito e membra da AJD (Associação Juízes para a Democracia)
Foto: Arquivo Pessoal

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