Justiça

Moraes proíbe entrevista de Nem da Rocinha para série da Netflix

A PGR alertou para o que considera um ‘risco de glamourização inaceitável’ da figura do traficante

Moraes proíbe entrevista de Nem da Rocinha para série da Netflix
Moraes proíbe entrevista de Nem da Rocinha para série da Netflix
Reprodução/Justiça Federal
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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, negou um recurso do traficante Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem da Rocinha, e manteve a decisão que o impede de conceder entrevistas no presídio federal de Catanduvas (PR) para a produção de uma série documental da Netflix. A decisão foi assinada na última quarta-feira 5.

A defesa recorreu ao STF após o Colegiado de Juízes Federais da Seção de Execução Penal de Catanduvas rejeitar o pedido, ordem posteriormente confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. A obra audiovisual é produzida pela Nono Produções e se chamará Nem.

Nem assumiu o comando do tráfico na Rocinha, maior comunidade do Rio de Janeiro, em 2004, após a morte de Luciano Barbosa da Silva, o Lulu. O traficante cumpre pena de 134 anos de prisão e é considerado um “criminoso de altíssima periculosidade” pelas forças de segurança.

Ao negar a solicitação, o TRF-4 concluiu que Nem “permanece envolvido em atividades ligadas ao tráfico de drogas no Rio, preservando o status de ‘Chefe da Rocinha’, sendo concreto o risco de que as entrevistas ora pleiteadas sejam, assim como as visitas sociais e atendimentos, utilizadas de forma desvirtuada para a transmissão de mensagens extramuros e com fins criminosos“.

No recurso ao Supremo, os advogados do traficante argumentaram que a decisão viola o direito à liberdade de expressão e citaram possível tratamento discriminatório contra seu cliente, uma vez que outros presos teriam sido autorizados a conceder entrevistas em situações semelhantes. A Procuradoria-Geral da República defendeu manter o veto em parecer enviado a Moraes.

O relator concordou com os argumentos da PGR, cuja manifestação alertou para o que considera “risco de glamourização inaceitável” da figura de Nem. O órgão sustentou que a exposição midiática de líderes de facções criminosas pode enfraquecer a função social da pena e incentivar a romantização da criminalidade.

“Para que sejam alcançados os objetivos da sanção penal, como a retribuição pelo crime, a prevenção de novos delitos e a reinserção social, é necessário que o contato de presos com a mídia, especialmente em casos como o do Recorrente, chefe de uma facção criminosa, não gere notoriedade excessiva nem contribua para sua romantização ou sua transformação em figura heroica”, observou Moraes.

O ministro também apontou que a Constituição não garante um “direito subjetivo” do preso de ser entrevistado e negou haver afronta ao princípio da liberdade de expressão. Além disso, ressaltou que a negativa não impossibilita a produção da série, já que Nem ainda pode se comunicar por meio de cartas.

Ao rebater o argumento da defesa de que outros presos tiveram o direito de conceder entrevistas, Moraes anotou que nos casos citados havia “nítido propósito ressocializador e educativo”.

“No caso dos autos, contudo, o pedido desvincula-se de qualquer produção intelectual do apenado, referindo-se à realização de série documental de cunho biográfico e midiático, sem a demonstração de que tal atividade se coaduna com as finalidades legítimas do sistema de execução penal, sobretudo no que tange ao modelo adotado no sistema penitenciário federal”.

À reportagem, o advogado Luiz Gustavo Battaglin, defensor de Nem, afirmou que recorrerá. “Acredito que o eminente relator não compreendeu bem o objeto da controvérsia”, disse. Não conseguimos contato com a Nono Produções, mas o espaço segue aberto.

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