Justiça

‘In Fux we Trust’: Como um ministro indicado pelo PT se converteu em esperança da ultradireita no STF

O voto de Luiz Fux no processo por tentativa de golpe de Estado empolgou o bolsonarismo e remete a episódios recentes de sua história na Corte

‘In Fux we Trust’: Como um ministro indicado pelo PT se converteu em esperança da ultradireita no STF
‘In Fux we Trust’: Como um ministro indicado pelo PT se converteu em esperança da ultradireita no STF
O ministro Luiz Fux, integrante da 1ª Turma do STF, responsável pelo julgamento de Jair Bolsonaro e aliados por tentativa de golpe de Estado – Foto: Evaristo Sá/AFP
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“In Fux we Trust”. Em bom português, “Nós confiamos em Fux”. A mensagem, acompanhada de uma imagem gerada por inteligência artificial, mostra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em postura altiva, com olhar para o horizonte, cercado de ‘patriotas’ em segundo plano. Foi postada às 11h desta quarta-feira 10, cerca de duas horas após o início do voto de Fux no STF pelo ex-procurador da Operação Lava Jato e deputado federal cassado Deltan Dallagnol (Novo-PR).

A expressão remete a uma mensagem recebida pelo próprio Deltan, em 2016, em conversa virtual com o então juiz Sergio Moro, revelada há três anos na série conhecida como ‘Vaza Jato. Segundo o então procurador, o ministro do Supremo teria dito que Moro “foi ótimo” ao responder fala do ministro do STF Teori Zavascki (morto em acidente aéreo em 2017). “Excelente. In Fux we trust”, respondeu Moro.

Ao retomar a expressão, Deltan mostra que a ultradireita e o bolsonarismo estão satisfeitos com a atuação de Fux – cujas divergências abertas no julgamento de Jair Bolsonaro podem, no futuro, beneficiar o ex-capitão.

Após uma longa trajetória como magistrado, incluindo passagem pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), Luiz Fux foi indicado ao STF pela presidenta Dilma Rousseff em 2011. Já havia tentado outras três vezes, disse, em entrevista à Folha de S. Paulo. Sua “epopeia”, contudo, não envolve exatamente heroísmo e sim uma intensa articulação política. Fux buscou apoio de diversas figuras de destaque para viabilizar sua indicação, inclusive adaptando posicionamentos e decisões para agradar a diferentes grupos e facilitar sua candidatura.

Se hoje Deltan usa o “In Fux we Trust” com orgulho, na época do vazamento não foi bem assim. Ele e Moro tentaram, das mais diversas formas, desacreditar o vazamento das mensagens, divulgadas inicialmente pelo Intercept Brasil.

Conforme destacou CartaCapital na época do vazamento, Fux indicou apoio à dupla Deltan e Moro após o vazamento de gravações obtidas após grampo telefônico que envolveu a própria presidenta Dilma. O material foi enviado ao Jornal Nacional. Antes, já havia declarado que as decisões de um juiz devem levar em conta o ‘anseio da sociedade’.

Em 2020, com nove anos de casa, Luiz Fux assumiu a presidência do Supremo. Quando ocupava a cadeira, chegou a exaltar a Operação Lava Jato, mesmo diante dos vazamentos. “Eventuais erros da operação devem ser tratados como questões pontuais e analisados no foro adequado. Mas não há dúvida do êxito da Lava Jato no combate aos crimes de colarinho branco”, disse, em entrevista à revista IstoÉ.

Dois anos mais tarde, ao deixar o cargo às portas das eleições de 2022, citou “ataques em tons e atitudes extremamente enérgicos” à Corte. “Não houve um dia sequer em que a legitimidade de nossas decisões não tenha sido questionada, seja por palavras hostis, seja por atos antidemocráticos”, prosseguiu. Parte considerável desses ataques veio diretamente de Jair Bolsonaro e de seus aliados mais próximos.

Nos últimos tempos, porém, algumas diferenças parecem ter ficado para trás. Fux se tornou uma espécie de ‘última esperança’ do bolsonarismo na Primeira Turma do Supremo. Foi quem apresentou mais divergências nos votos a pessoas condenadas pelos ataques de 8 de Janeiro. Os advogados de Bolsonaro fizeram diferentes menções a decisões do ministro em suas alegações finais no processo do golpe. Não escreveram a expressão em inglês, mas deixaram claro que, em Fux, confiavam.

O gosto de Fux pela articulação nos bastidores parece também ter favorecido o futuro de sua prole. Ainda em 2016, mesmo ano da troca de mensagens citada acima, Marianna Fux, filha do ministro, se tornou juíza do Tribunal de Justiça do Rio, indicada para compor o chamado ‘quinto constitucional’: pela Constituição de 1988, um a cada cinco juízes dos tribunais devem ser advogados (caso de Marianna) ou integrantes do Ministério Público indicados por seus pares.

Marianna não é filha única. Fux tem mais um filho, Rodrigo, que também é advogado. Reportagem publicada em 2019 por CartaCapital mostrou que Rodrigo tinha, na cartela de clientes, o Conselho Nacional de Praticagem (Conapra), que defende os práticos (profissionais que atuam nos portos para auxiliar os navios no processo de atracamento). A Conapra foi financiadora da campanha de Flávio Bolsonaro (hoje no PL) ao Senado pelo Rio de Janeiro. Flávio foi eleito em 2018 e está no cargo.

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