Justiça

CNJ afasta juíza investigada por se recusar a voltar ao trabalho e atacar ministros do STF

Ludmila Lins de Grilo guarda milhares de processos paralisados fora do prazo; nas redes sociais, a magistrada incentivou aglomeração durante a pandemia e foi contrária à nota que criticou Bolsonaro por discurso golpista

Foto: Reprodução/Redes Sociais
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O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu, na última terça-feira 14, afastar a juíza Ludmila Lins de Grilo, da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Unaí (MG). A decisão foi tomada por unanimidade pelo colegiado. O CNJ decidiu, ainda, abrir duas investigações contra a magistrada.

Em um dos casos, Ludmila Lins de Grilo é investigada por se recusar a voltar a trabalhar presencialmente na comarca em que atuava, ainda que não tivesse autorização.  Em outro, a juíza é investigada por ter feito postagens em redes sociais com ofensas ao Judiciário, o que fere o Código de Ética da Magistratura.

Em 2021, a magistrada já tinha sido alvo de pedido de apuração no CNJ por ter incentivado, nas redes sociais, que fossem feitas aglomerações quando estas não eram permitidas, por conta da fase inicial da pandemia de Covid-19. Naquela oportunidade, a magistrada chegou a elogiar aglomerações em Búzios (RJ), afirmando que se tratava de uma cidade “que não se entregou docilmente ao medo, histeria do depressão”.

No julgamento do CNJ, o advogado Marcos Vinicius Jardim Rodrigues, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Acre, afirmou que a juíza produziu um “doutrinamento pérfido” no caso.

O julgamento foi marcado por posicionamentos sobre o papel da justiça brasileira. A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, afirmou que “ver o ataque que se faz e o desrespeito com que se trata o CNJ me abala”. O membro do Ministério Público da União, Sidney Pessoa da Silva, afirmou estar “perplexo com os termos utilizados pela magistrada, que se referiu, nas redes sociais, à magistratura como “um carguinho”.

Ataques nas redes sociais

Em 2022, o Corregedor Nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, abriu procedimento investigativo contra Ludmila Lins de Grilo, determinando a suspensão das suas contas nas redes sociais, em razão do fato dela exercer “juízo depreciativo sobre decisões proferidas por órgão de cúpula do Poder Judiciário”.

No dia 7 de setembro de 2021, quando o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) lançou um discurso golpista ameaçando não cumprir mais as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) condenou os “atos e discursos autoritários” do então presidente. Ludmila Grilo, então, criticou a postura da AMB diante dos mais de 300 mil seguidores que possuía nas redes, afirmando que “ato autoritário é juiz abrir inquérito e figurar como vítima, investigador e julgador ao mesmo tempo”.

Em outra oportunidade, Ludmila criticou como “absurdo e grotesco” o fato do STF conduzir o inquérito das fake news. Ela se manifestou no programa “Pingos nos Is”, da Jovem Pan, rede que vem sendo investigada pelo Ministério Público Federal por divulgar notícias falsas e incentivar atos antidemocráticos.

Em relação à sua atuação nas redes sociais, a magistrada já compartilhou um texto intitulado “Os Perseguidores-Gerais da República do Brasil”, em referência aos ministros do STF Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.

Segundo o CNJ, sete episódios envolvendo a magistrada nas redes sociais são objetos de investigação. Entre eles, está a participação em eventos públicos de cunho político e a divulgação de postagens do site do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, que está foragido da justiça depois de ter sido condenado a um ano e sete meses por calúnia. Ludmila Lins de Grilo referiu-se a Allan dos Santos como “amigo”.

Violação aos deveres funcionais

O CNJ irá investigar, ainda, se a magistrada teria violado os deveres da função. Segundo inspeção preliminar na comarca em que Ludmila atuava, foram identificados extravios de processos e ausência física da juíza todos os dias da semana.

Além disso, o CNJ identificou, preliminarmente, 1.291 processos paralisados em cartório, seis processos físicos já conclusos para sentença fora do prazo de 100 dias, baixa produtividade, 1.160 processos paralisados indevidamente há mais de 100 dias e 23 processos parados aguardando despachos há mais de um ano.

Defesa

Em sua defesa, Ludmila Lins de Grilo afirmou que havia deixado o expediente presencial e passado a fazer audiências em cidades alternadas porque estaria sofrendo ameaças no trabalho. Sobre as faltas, disse que representavam “burocracia” e “coisas de secretaria”.

Ela alegou ser vítima de ameaças por conta da sua atuação como juíza, que teriam sido “transformadas” em um “assassinato de reputação” realizado pelo CNJ. A juíza protestou sobre uma suposta dificuldade de conseguir um plano de segurança do CNJ e do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG).

Acerca desse ponto, o corregedor Luis Salomão afirmou que “vários magistrados sofrem ameaça e nem por isso deixam de cumprir sua função”.

Sobre a baixa produtividade, ela criticou a investigação do CNJ e disse que o órgão fez um “estardalhaço midiático com uma juíza”.

O caso seguirá no CNJ, que dará curso às investigações.

Segundo o Portal da Transparência do TJ-MG, os dados públicos mais recentes sobre rendimentos dos servidores do tribunal são de outubro de 2022. Àquela altura, Ludmila Lins de Grilo possuía um rendimento mensal líquido de 27.933,54 reais. 

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