Justiça

Caso Marielle: veja como foi o 1º dia do júri de Lessa e Queiroz e o que esperar da 2ª etapa do julgamento

No primeiro dia, os réus confessos detalham o planejamento do crime; oitivas foram marcadas por emoção dos familiares e comoção dos presentes

Caso Marielle: veja como foi o 1º dia do júri de Lessa e Queiroz e o que esperar da 2ª etapa do julgamento
Caso Marielle: veja como foi o 1º dia do júri de Lessa e Queiroz e o que esperar da 2ª etapa do julgamento
Julgamento de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz; Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
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O segundo dia do julgamento dos acusados de executarem a vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes será iniciado nesta quarta-feira 31, após um primeiro dia marcado pela emoção do depoimento das famílias das vítimas. Ao todo, nove testemunhas prestaram depoimentos, incluindo a assessora Fernanda Chaves, a única sobrevivente do ataque. 

A sessão, no primeiro dia, se estendeu por mais de 13 horas e foi interrompida após os réus confessos, Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, apresentarem suas versões dos fatos aos jurados. 

O julgamento será retomado às 8h da manhã, com o início das alegações finais do Ministério Público e dos advogados que representam os réus e os assistentes de acusação, que representam as famílias das vítimas e auxiliam o órgão acusatório. 

A expectativa é de que o promotor de Justiça defenda que os acusados sejam condenados a 84 anos de prisão, pena máxima para os crimes dos quais Lessa e Queiroz são acusados. Logo em seguida, os advogados farão o uso da palavra. Ainda haverá tempo para réplica e tréplica, sendo a defesa sempre a última se manifestar. 

Encerrado o período de argumentação, os jurados deverão, enfim, se reunir para a votação, que deve definir se a dupla de ex-policiais são, de fato, culpados pelos crimes. Os jurados, contudo, não poderão discutir entre si o caso antes da votação, que acontece em uma sala secreta. 

Após todos depositarem seus votos para cada uma das perguntas feitas, sendo a principal delas se os acusados são culpados pelos crimes, as cédulas de votação serão abertas pelo juiz até que se forme a maioria. Ainda que todos os jurados tenham votado pela condenação dos réus, o resultado anunciado para a imprensa deverá ser de 6 a 4, para não violar o sigilo do voto dos jurados. 

Marielle Franco e Anderson Gomes foram mortos em uma emboscada no dia 14 de março de 2018, quando deixavam um compromisso na região central do Rio de Janeiro. 

O primeiro dia

Em um dos momentos mais comoventes, Fernanda relembrou os últimos minutos ao lado de Marielle e Anderson. 

“Estava tarde, era noite. Anderson dirigia bem. Eu e Marielle conversávamos sobre o dia e sobre o evento que tínhamos acabado de participar”, recordou. Em lágrimas, relatou a aflição ao pedir ajuda e a luta para acreditar que Marielle pudesse ainda estar viva.

“Eu estava muito ensanguentada, muito suja de sangue e comecei a pedir ajuda, a gritar por socorro: “Ajuda, ajuda. Liga para uma ambulância”. Essas pessoas se aproximaram. Uma mulher ofereceu ajuda. Vi uma mulher atravessando, vindo com um bebezinho pequenininho de colo. Essas lembranças sempre foram difíceis e confusas porque eu não enxergava direito. Meu corpo inteiro ardia. Eu não tinha certeza se tinha sido atingida ou não. Eu olhava para a Marielle lá dentro e queria acreditar que ela estava viva. Que ela… imaginei que ela pudesse estar desmaiada. Como eu saí tão inteira dali, não queria admitir que ela pudesse estar morta”, relatou. 

Marinete Silva, mãe de Marielle, também prestou depoimento e falou da dor incessante que sente desde a perda da filha. “É um vazio, um coração que tem um pedaço arrancado covardemente, injustamente, naquela noite”, desabafou. 

“Fico imaginando que alguém foi pago para matar minha filha”, contou. 

A viúva de Marielle, a vereadora Mônica Benício (PSOL), disse ter ficado surpresa ao saber que a morte da vereadora tinha sido uma execução. 

“O assassinato da Marielle, a notícia da morte dela, quando vem com a confirmação da execução e não como uma tentativa de assalto, tinha também em si esse requinte de crueldade, da surpresa, da dúvida, porque a Marielle no geral era uma pessoa que se dava bem com todo mundo”. 

Ágatha Arnaus, viúva de Anderson, compartilhou o impacto da perda para o filho do casal, Arthur, que tinha apenas um ano e sete meses na época do crime. 

“Ele viveu uma vida com uma mãe destruída”, afirmou, levando o plenário às lágrimas.

Além das famílias, ainda foram ouvidos investigadores da Polícia Civil que participaram das investigações do caso. 

Carlos Alberto Paúra Júnior contou como foi a etapa do trabalho da Polícia Civil comandada pelo delegado Giniton Lages, que, por sua vez, está sendo investigado no Supremo Tribunal Federal por tentar dificultar a apuração para encobrir os mandantes do crime – Chiquinho e Domingos Brazão. 

O investigador, que participou da apuração do veículo utilizado no crime, explicou como o carro foi identificado e a importância de preservar informações sensíveis durante a investigação. Ele relatou que o veículo teria sido levado a uma oficina para desmontagem logo após o crime.

A perita Carolina Rodrigues, também envolvida na investigação, confirmou em um vídeo enviado ao tribunal que a arma usada no ataque foi uma submetralhadora HK MP5, reforçando a brutalidade da ação.

O delegado Guilhermo Catramby, que ingressou no caso em 2023, destacou os laços pessoais entre os réus Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, mencionando passeios e viagens entre as famílias dos acusados. Catramby também apontou um alinhamento ideológico de Lessa com o extremismo de direita, o que levantou questões sobre possíveis motivações para o crime.

O depoimento de Lessa

A família de Marielle e integrantes do PSOL assistiram em completo silêncio o depoimento de Ronnie Lessa, assassino confesso, dando detalhes do planejamento do crime. Em determinado momento, a filha de Marielle, profundamente abalada, precisou se retirar do plenário, amparada por pessoas próximas.

No final do depoimento, Lessa pediu perdão às famílias das vítimas, afirmando que está tentando trazer à luz todos os envolvidos na ação para aliviar um peso na consciência. Ele reconheceu que nunca poderá desfazer o ocorrido, mas expressou remorso. Na declaração, mencionou que recentemente perdeu o pai e, ao refletir sobre a dor de perder um ente querido, sentiu a necessidade de pedir desculpas.

Esse pedido de perdão, no entanto, gerou uma forte reação entre os familiares de Marielle e Anderson. Mônica Benício e Anielle Franco, parentes de Marielle, ficaram de pé, enquanto a filha da vereadora e Ágatha Arnaus, esposa de Anderson, deixaram a sala em lágrimas, evidenciando o desconforto e o impacto emocional causado pelas palavras do atirador.

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