Justiça

Adiamento de ADO de criminalização de homofobia mostra omissão do STF

A criminalização da homofobia e o seu mais recente adiamento para a fevereiro evidencia que há omissão no Congresso e STF sobre o tema

(Foto: Agência Senado)
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Observo sempre com alguma apreensão a forma como tratamos determinados fatos, notícias, comportamentos, especialmente quando são oriundos de instituições que disputam narrativas. Neste caso, falo especificamente do Supremo Tribunal Federal. Começo assim para dizer do processo que trata do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) nº 26, a qual pede que o tribunal declare a omissão do Congresso Nacional por não ter votado projeto de lei que criminaliza atos de homofobia. A criminalização da homofobia e o seu mais recente adiamento para a data de 13 de fevereiro de 2019 evidencia que há omissão no Congresso e há omissão no STF.

Então vamos por partes.

Por ora, o termo “homofobia” no contexto da proposta visa tratar da criminalização pela morte de homossexuais mulheres e homens, bissexuais, travestis e transexuais. Ou seja, abarca um crime a ser tipificado no Código Penal em razão da orientação e/ou identidade de gênero.

É sabido, repito, é sabido, que o Brasil figura entre os países que mais matam lgbts em relação ao restante do mundo, inclusive aqueles em que a homossexualidade é conduta criminosa. Só no primeiro trimestre de 2018 foram 126 mortes, segundo dados subnotificado do Grupo Gay da Bahia – GGB. A Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA, até 04/12/2018, nos informa que foram mortas 152 pessoas transgêneros. Esses dados não são oficiais em razão das estatísticas brasileiras não incluírem informações de morte por motivo de identidade de gênero e/ou orientação sexual.

Isso, por si só, seria fato suficiente para que as autoridades judiciárias se manifestassem de maneira incisiva com o intuito de coibir essa conduta, instar o Congresso a se manifestar em caráter de urgência, urgentíssima. No entanto, o que temos visto é uma recorrente reorganização da agenda, ora do Congresso, ora do Supremo e a postergação de uma discussão que passou do tempo. Vale dizer, eu me preocuparia com o tamanho do voto de um Ministro relator? Neste momento em vidas urgem, não!

Aproveito esse espaço para desqualificar, neste caso, o termo homofobia. Há um constante e reiterado propósito de patologizar determinadas condutas, quando as mesmas condutas são nitidamente oriundas do ódio, neste caso, da existência do outro, das diferenças. Portanto, não sei dizer qual o termo correto, mas homofobia não é. Prefiro tratar neste espaço como heteroterrorismo.

Vale dizer que esse baile entre a discussão ou a negativa de, o agendamento e a votação faz com que uma série de direitos sejam negados, sobretudo o mais caro deles: a vida. Acabamos de comemorar 70 anos da Declaração Universal de Direitos, sem que vidas tivessem sido poupadas. A negação de direitos reitera a afirmação de que, enquanto uns merecem viver, outros precisam morrer, sob o estigma da invisibilidade, da indignidade, para que a máquina estatal continue a funcionar com suas formas burocráticas. Reafirmo meu direito, negando o seu.

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Isso me lembra o filósofo italiano Giorgio Agamben ao discorrer sobre o Tribunal de Nuremberg e dizer que ao direito não cabe a verdade ou a justiça, mas o julgamento. Sim, é de Kafka que estamos falando. Mas é de vidas que o Estado tem insistindo em não se importar também.

Fábio Mariano da Silva é bacharel e mestre em Direito e doutorando em Ciências Sociais, ambos pela PUC-SP. Pesquisador do grupo Inanna com os temas: Políticas de Morte e Gênero e Masculinidades.

Foto: Agência Brasil

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