Educação

‘De onde vêm os bebês?’: Professora é demitida de escola ao tirar dúvida de alunos

O caso ocorreu em uma escola particular do município de Cerejeiras, no interior de Rondônia

Créditos: Reprodução
Apoie Siga-nos no

Uma professora afirma ter sido demitida de uma escola particular de Cerejeiras, interior de Rondônia, após explicar aos alunos ‘de onde vêm os bebês’. O tema foi abordado em sala de aula depois de uma estudante do 5º ano pedir explicações.

“Eu estava dando aula normal, quando nos 10 minutos finais uma aluna perguntou: ‘Professora, de onde vêm os bebês? Como eles são gerados? Perguntei para a minha mãe e ela mandou eu perguntar para a senhora’, narrou Elaine Cosmo, 36 anos, que trabalhava na Escola Dimensão.

A docente relata que, diante da questão, perguntou à classe quantos tinham a dúvida. Quatro crianças levantaram as mãos, de um total de dezesseis.

A partir dali, a professora iniciou a explicação. “Falei que precisa de um homem e de uma mulher. Os dois, quando maiores de idade, responsáveis pelos seus atos, em um ato sexual vão conceber um bebê. Também expliquei que o homem produz o espermatozoide e que a mulher gera o bebê por ter o útero”, contou a professora a CartaCapital.

No dia seguinte, após o turno no trabalho, a professora foi chamada para uma reunião com a direção da escola, que afirmou ter sido procurada por um grupo de mães contrárias à abordagem em sala de aula e que exigiam providências. Segundo a instituição, o grupo representava todas as mães do 5º ano.

Elaine diz ter ouvido que ela havia se utilizado de ‘gestos obscenos’ e ‘linguagem inapropriada’ com a turma, o que a professora nega.

A conversa com a direção levou à sua demissão em 25 de outubro, um dia após a aula. A professora trabalhava há três meses na escola e lamenta pelo modo como a situação foi conduzida, sem diálogo.

A professora Elaine Cosmo foi demitida após explicar a alunos como os bebês são gerados. Créditos: Reprodução

“Me senti muito agredida. Senti que invadiram o meu espaço, o meu trabalho como pedagoga. Eu fui à escola para ser demitida, não para ser ouvida. Em nenhum momento foi proposta sequer uma reunião entre a escola, eu e as famílias.”

Elaine acrescentou que após a demissão foi impedida imediatamente de retornar à unidade para devolver materiais didáticos e se despedir de seus alunos.

Também afirmou que ao anunciar sua saída em um aplicativo de mensagens, muitas mães se mostraram surpresas e negaram fazer parte do grupo que criticou a docente.

Elaine reconhece que o tema levantado pela aluna não consta do material oferecido pela escola aos alunos. No entanto, reforça que a abordagem é prevista pelas diretrizes curriculares nacionais.

A reportagem de CartaCapital acessou o documento do Ministério da Educação que estabelece os parâmetros curriculares nacionais em Ciências Naturais para o primeiro ciclo da educação. A peça lista alguns conteúdos no capítulo ‘ser humano e saúde’. Entre eles, estão: • comparação do corpo e de alguns comportamentos de homens e mulheres nas diferentes fases de vida; • conhecimento de condições para o desenvolvimento e preservação da saúde: atitudes e comportamentos favoráveis à saúde em relação a alimentação, higiene ambiental e asseio corporal; modos de transmissão e prevenção de doenças contagiosas, particularmente a AIDS; entre outros.

Além de se preocupar com o desemprego, a professora se diz abalada emocionalmente. “A cidade é pequena, eu estou sendo taxada como a professora que usa gestos obscenos para explicar conteúdo”, lamentou Elaine, que trabalhou por quase oito anos como professora em Mato Grosso, nas redes municipal e estadual.

“Nunca tive uma ocorrência”, prosseguiu. “Estou me sentindo ofendida, humilhada. Teve mãe que disse que eu tirei a inocência da filha dela, por ter explicado algo natural a eles.”

O que diz a escola?

A reportagem de CartaCapital procurou a Escola Dimensão para comentar o caso. Em nota, a instituição disse que ‘a versão apresentada pela professora não corresponde em nenhum momento com a realidade dos fatos’.

“Longe disso, ao contrário do afirmado, é fato que a versão da professora foi ouvida pela Equipe Gestora da Escola; também é fato que não existe a disciplina ‘reprodução humana’ no material escolar a ser utilizado pela turma”, diz um trecho da nota.

A escola acrescentou que o desligamento da professora não se deu apenas pela abordagem do tema em sala de aula e que para ministrar conteúdos sobre educação sexual é necessário um planejamento pedagógico.

“A Escola Dimensão trabalha em Cerejeiras há mais de vinte e sete anos e sempre teve como fundamento basilar o ensino de qualidade e excelência, com conteúdo preparados com antecedência e apropriados para cada faixa etária, adequados não apenas com nossa realidade cultural, mas, igualmente, certo ao nível de desenvolvimento dos estudantes.”

ENTENDA MAIS SOBRE: , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo