Lula, CartaCapital nunca se deixou enganar por Moro e pela República de Curitiba

Em entrevista, o ex-presidente se esquece do nosso papel na denúncia das mazelas da Lava Jato

Leia antes que aconteça, dizia um velho slogan de CartaCapital. Atualíssimo, como se vê

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Em seu périplo de entrevistas a emissoras de rádio, o ex-presidente Lula, líder das pesquisas e favorito nas eleições presidenciais deste ano, conversou com profissionais da ­Super Notícia, de Belo Horizonte. No fim do encontro, os apresentadores provocaram o petista a analisar três adversários: Jair Bolsonaro, Ciro Gomes e ­Sergio ­Moro. Bolsonaro é “um psicopata”, na visão do ex-presidente, e Ciro, apesar de ser um “quadro político muito qualificado”, anda “perdido”.

Reproduzirei de forma menos sucinta o que Lula disse a respeito de Moro: “Nem me fale dessa pessoa, porque é uma pessoa asquerosa. É o maior mentiroso que já passou pela história do Brasil (…) Ele conseguiu enganar 100% da imprensa e 100% da política e da sociedade. Mas, como mentira não dura a vida inteira, a casa caiu”.

Nada disso, Lula. Moro pode ter ludibriado o oligopólio, a imprensa que se autointitula profissional, os meios de comunicação hegemônicos, a “grande mídia”, como dizem pateticamente alguns. Fica ao talante do ex-presidente escolher o termo que melhor lhe convém. Também caberia perguntar se o ex-juiz enganou, cooptou, foi cooptado ou fez uma parceria com essa turma. O verbo enganar dá o benefício da dúvida que grande parte do jornalismo brasileiro não merece. Injusto é, no entanto, o porcentual de 100%.

CartaCapital nunca se deixou enganar e pagou um preço, ao ser perseguida por Moro e pela República de Curitiba. Desde o início, a revista manteve a independência e recusou-se à submissão da máquina de propaganda da Lava Jato, na qual profissionais com um mínimo de espírito crítico, que se recusassem a servir de meros taquígrafos dos procuradores, eram imediatamente excluídos do circuito de distribuição das “notícias”. Para ser agraciado com a boa vontade do juiz e da força-tarefa, convinha não perguntar, questionar, ponderar. Apontamos os esbirros autoritários, os abusos de poder, os atropelos legais da operação, a destruição da economia, a omissão dos poderes que poderiam ter impedido o projeto político da força-tarefa e do ex-magistrado. Sim, falamos em “projeto político” antes mesmo de ele se tornar inegável, com a nomeação de Moro ao posto de ministro da Justiça de Bolsonaro, maior beneficiado pela prisão de Lula e pelo ­impeachment de Dilma Rousseff, e pela posterior pré-candidatura à Presidência. Apontamos o conluio do juiz que deveria se portar de maneira imparcial com os procuradores da República. Buscamos informações a respeito da influência dos Estados Unidos, denunciamos o uso de procedimentos ilegais, entre eles grampos na cela de suspeitos, prisões por tempo indeterminado e a evocação de processos fora da jurisdição do Paraná. E o fizemos quando a Lava Jato era inquestionável, unanimidade nacional, antes de o hacker de Araraquara ter cedido a Glenn ­Greenwald e ao Intercept Brasil as conversas via ­Telegram que expuseram as entranhas da operação e não deixaram pedra sobre pedra. A sequência de capas reproduzida neste espaço ilustra a coragem do nosso jornalismo.

De fato, Lula, muita gente, na imprensa, na Justiça e na sociedade, se enganou, se deixou enganar, virou o rosto, se escondeu, emudeceu, fez de conta, aplaudiu, se beneficiou. Não foi o caso de CartaCapital. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1201 DE CARTACAPITAL, EM 30 DE MARÇO DE 2022.


Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Lula, tu quoque?”

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5 comentários

CLOVIS DEITOS 12 de maio de 2022 12h42
Acredito que ninguém é ou foi tão estupido para se deixar enganar por esse lesa-pátria. O que aconteceu com a mídia entreguista/golpista é que recebiam dos organismos imperiais para enganar a população. Infelizmente foram bem sucedidas!
PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 31 de março de 2022 16h23
Exatamente isso, caro Sérgio Lírio, muitas vezes Lula peca por generalizar demais, esquece dos detalhes. Talvez no afã da retórica, não dê a devida atenção a quem é quem. Essa revista, Carta Capital, sempre atenta aos acontecimentos e crítica ao golpismo que vivenciamos desde 2016 passando pela prisão e condenação de Lula foi sempre um dos poucos baluartes do libelo contra o golpismo que desgraçou esse país. Lula não deve esquecer jamais dos companheiros que o visitaram na sede da Polícia Federal em Curitiba, da Vigília Lula Livre. Das comitivas de jornalistas, intelectuais, políticos, trabalhadores que o visitaram em Curitiba e sempre estiveram ao seu lado. Agora é o momento de separar o joio do trigo, pois, neste momento em que as pesquisas indicam a recondução do ex presidente de volta ao poder, os oportunistas e vira-casacas estão a cerca-lo e bajula-lo o tempo todo. A mídia hegemônica brasileira, foi atroz contra o ex presidente, eis que nos tempos nebulosos de sua prisão por diversas vezes o difamou, caluniou e injuriou desmedidamente. Sabemos que Lula é sábio, e está mais maduro agora, mas é humano, e não pode se inebriar com os excessos de elogios e acenos de alguns diante de seu retorno ao poder. Lula tem que saber que os verdadeiros amigos, os que sempre estiveram com ele, estão alertas aos seus movimentos. Para um amigo, o pior sentimento em relação ao outro é a sensação de ingratidão, de indiferença ou do esquecimento da própria amizade. E, com raras exceções, Carta Capital, sempre demonstrou e defendeu com denodo intransigentemente a figura de Lula, o Partido dos Trabalhadores e a esquerda que sempre esteve do lado do povo e na defesa do país.
Tomás Iuconvite Martins 31 de março de 2022 10h16
CartaCapital me representa!
JOSE CARLOS GAMA 29 de março de 2022 19h36
Reconheço em carta capital um porto seguro como o era senhor nos anos 80 que lia com esperança alegre da ingenuidade de que tudo mudaria para melhor nesse pais. O tempo passou e eu amadureci alegremente por ter boa informação, porém triste por elas.
KATIA MARIA CALDEIRA PIRES 28 de março de 2022 18h43
Com todo o respeito ao meu Presidente Lula, concordo plenamente com o Sergio Lirio, nosso Redator-chefe. Pensei exatamente a mesma coisa no momento que ouvi o Presidente. Não foi 100% da imprensa que acreditou no juiz com letra minúscula mesmo ...

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