Edição da Semana
Moro é um candidato fraco e com apelo limitado a setores da classe média
Não se deixe enganar pelas bobagens repetidas pela mídia. Sobra torcida e falta racionalidade nas análises eleitorais


Ninguém aguenta mais a quantidade de bobagens a respeito de pesquisas que inunda a imprensa e o debate político. Um verdadeiro Febeapá. Para quem não conhece, a sigla foi criada há muitos anos pelo jornalista Sérgio Porto e significa “Festival de Besteiras Que Assola o País”. A discussão das sondagens sobre a próxima eleição está repleta de equívocos. Para evitá-los, temos de lembrar de quatro coisas:
1) Quem está de olho nas eleições?
A população brasileira não se interessa muito por política, a não ser perto da eleição. O interesse já foi maior, quando as pessoas estavam mais satisfeitas com o País e suas lideranças. De 2013 para cá, depois que atacar os políticos e a política passou a ser moda, o desinteresse subiu.
Na mais recente pesquisa Vox Populi, apenas 24% dos entrevistados disseram estar “sempre” ou “na maior parte do tempo” interessados em política. Igual ao que ocorre com as “campanhas e as eleições”: 63% não se interessam por elas.
Os resultados variam em função da renda: dizem-se interessadas 17% das pessoas de baixa renda e 40% das que ganham mais. Quanto às campanhas e às eleições, o mesmo padrão: 50% dos que têm renda maior se interessam e apenas 29% dos de renda menor.
A esta altura, a maioria do povo está distante e pouco informada acerca das movimentações de partidos e candidatos. O que quer dizer que, na aferição de oscilações conjunturais (provocadas por declarações, novos apoios ou mudanças de partido, por exemplo), as pesquisas limitam-se, na prática, a identificar os sentimentos de 20% do eleitorado.
2) Pesquisas remotas são de pequena utilidade
Sondagens eleitorais por telefone ou internet servem para mostrar o que pensam as pessoas que têm telefone ou computador e se interessam o suficiente por esses assuntos para responder a longos questionários, na maior parte das vezes aplicados sem interação pessoal.
Depois que voltamos a fazer pesquisas presenciais, na medida em que a pandemia amainou, vimos um retrato da próxima eleição completamente diferente do que tínhamos. Lula ficou maior, Bolsonaro menor e os demais candidatos diminuíram de tamanho. A razão é óbvia: quando o método de pesquisa é adequado, mais gente do povo é ouvida. Seus candidatos ficam maiores, enquanto os das classes médias se apequenam. Pesquisas remotas ajudam pouco a entender o eleitorado.
3) Em 2022, faremos nossa nona eleição moderna
Nove eleições não é tanto, mas não é pouco. Há o que aprender com nossa experiência, se a olharmos direito. A próxima eleição não está “mais indefinida” ou com “menos votos na espontânea” que as anteriores. A rigor, a um ano das eleições de 2006, 2010 e 2014, o total de respostas nominais à pergunta de voto sem apresentação de listas pouco passava de 35%, de acordo com levantamentos do Datafolha. No mesmo instituto, em setembro último, chegava a 52% e o espaço para o crescimento de novas candidaturas era significativamente menor.
Lula não está “grande demais” por se contrapor a um desclassificado como Bolsonaro. De 2002 para cá, ele nunca teve menos de 40% das intenções estimuladas de voto, no primeiro turno, em nenhuma eleição, incluindo as duas que venceu, as duas que não disputou porque não quis e aquela em que foi impedido por uma sucessão de atos de força. Podemos ler as pesquisas atuais torcendo pelo candidato que preferimos. O que não podemos é reescrever o passado.
4) É preciso respeitar os números das pesquisas
A elite e a grande mídia são tão antilulistas que só veem aquilo que querem nas pesquisas. Quando se metem a fazer contas, ignoram a aritmética da escola primária. Encantadas com o heroizinho que inventaram, atualmente só especulam a respeito do “potencial de Moro”.
Esse cidadão, em pesquisas presenciais, tem algo abaixo de 10%. É “bem conhecido” por 60% das pessoas e apenas 20% dizem não o conhecer. Entre os 80% que têm alguma informação a seu respeito, 54% dizem que não votariam nele “de jeito nenhum”. Quando o capitão não está na lista, Moro cresce modestos 5 pontos. Em qualquer critério, é um candidato fraco, com apelo limitado a setores da classe média (na Vox mais recente, obtém 2%, quase traço, entre os mais pobres).
Pode crescer? Claro, quem é pequeno sempre tem espaço para melhorar. Mas só com muita torcida é possível imaginá-lo disparando para tirar o capitão do páreo. Quanto a Lula, continuará lá na frente, como favorito. O povo pode ter pouco interesse no dia a dia da política, até porque sua vida concreta é muito difícil, mas tem lado. As pesquisas mostram qual. •
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1186 DE CARTACAPITAL, EM 2 DE DEZEMBRO DE 2021.
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Muita gente esqueceu o que escreveu, disse ou defendeu. Nós não. O compromisso de CartaCapital com os princípios do bom jornalismo permanece o mesmo.
O combate à desigualdade nos importa. A denúncia das injustiças importa. Importa uma democracia digna do nome. Importa o apego à verdade factual e a honestidade.
Estamos aqui, há 30 anos, porque nos importamos. Como nossos fiéis leitores, CartaCapital segue atenta.
Se o bom jornalismo também importa para você, nos ajude a seguir lutando. Assine a edição semanal de CartaCapital ou contribua com o quanto puder.
Leia também

IstoÉ/Sensus: Lula lidera disputa para 2022, teria 50,8% dos votos válidos e poderia vencer no 1º turno
Por CartaCapital
Lula lidera corrida eleitoral em São Paulo, diz pesquisa Ipespe
Por CartaCapital
Lula lidera, Bolsonaro e Ciro caem e Moro cresce, diz pesquisa Ipespe
Por Getulio Xavier
Declarações de Moro não empolgam plateia em lançamento de livro em Curitiba
Por Getulio Xavier
‘Em algum momento vou processar’, diz Lula sobre Moro e procuradores da Lava Jato
Por Getulio Xavier