Economia
PIB surpreende, mas perspectiva de estagnação permanece
Quando se analisa o ritmo de alta trimestral em 2021, apontam economistas e analistas, nota-se um crescimento fraco e recessão em muitos setores
Apesar dos resultados superiores aos esperados pelo mercado para o quarto trimestre e para o agregado do ano, os números do PIB (a soma de todos os bens e serviços do País) não convencem os economistas que 2022 venha a ser melhor do que 2021; na melhor das hipóteses, o ano termina em zero a zero.
Ante expectativas de crescimento de 0,1% no quarto trimestre de 2021 na comparação com os três meses anteriores, o IBGE divulgou nesta manhã que o PIB cresceu 0,5% de outubro a dezembro passado. Com isso, o agregado do ano cravou 4,6%, ante expectativa de 4,5%.
Gustavo Cruz, economista e estrategista da plataforma RB Investimentos destaca o avanço do setor de Serviços, cuja atividade se beneficiou do avanço na vacinação, que permitiu a retomada de eventos, festas, reuniões, etc. “Muitos estados liberaram estádios, por exemplo. O brasileiro se sentiu mais seguro para consumir serviços e consumiu até mais do que o normal. Com a ômicron, janeiro deve mostrar menor atividade”, sublinha.
Mas, quando se analisa o ritmo de crescimento trimestral em 2021, aponta a economista Fernanda Consorte, do Banco Ourinvest, nota-se um crescimento fraco, e motivado somente pela baixa performance de 2020 na comparação. “Quando se olha para a evolução do PIB, o que se tem é um ritmo de dinamismo muito baixo e de uma nova recessão em muitos setores, notadamente na indústria de transformação, que não cresceu em nenhum trimestre de 2021”, completa Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos do Desenvolvimento Industrial, o Iedi. “A única coisa que esse 0,5% faz é compensar a queda do segundo e do terceiro trimestres, de modo que, no fundo, a economia está parada, na margem, está parada”, enfatiza.
Além disso, o resultado agregado do PIB esconde “evoluções preocupantes”, segundo o economista do Iedi, a começar pela queda contínua da indústria por quatro semestres consecutivos, que resulta em três anos consecutivos de encolhimento, desde 2019. Depois, há o problema do desemprego, que já completa seis anos com uma taxa de dois dígitos. “E isso é muito preocupante, porque quanto mais tempo o trabalhador fica fora do mercado de trabalho, mais difícil ele voltar ao mercado de trabalho. E pela projeção de estagnação para o próximo ano, a situação deve permanecer nesse nível”, sublinha Cagnin. Para piorar, o emprego existente é marcado por níveis recordes de subutilização de horas trabalhadas, o que significa que as pessoas subocupadas não dispõem de uma cesta de consumo razoável. “A empregada doméstica trabalha um ou dois dias na semana; continua com a corda no pescoço e consequentemente o consumo é reprimido”, exemplifica.
Cagnin lembra que a indústria já passou por duas crises muito fortes: a de 2014-2016 e, agora, de 2019, com crescimento negativo, depois 2020, com o choque da pandemia e, agora, 2021, ainda negativo – são três anos de desindustrialização. Essa trajetória longa vai dificultando o processo de recomposição do tecido industrial, porque não se trata apenas de ritmo de crescimento. Ele é importante para gerar receita, margens, expectativas de crescimento, para alavancar e viabilizar os investimentos necessários em modernização a entrada no que se chama de indústria 4.0, a digitalização da indústria, etc. E mesmo na questão ambiental, tornar os processos da indústria ambientalmente corretos. “Na linguagem do pessoal da Administração, a indústria brasileira não pode se restringir a cases de sucesso, porque se restringe quantos cases o sistema pode ter se o tecido industrial não evoluir junto; está tudo interrelacionado”, sustenta o economista do Iedi.
Pedro Secchin, assessor e sócio da gestora Golden Investimentos aponta o agronegócio como destaque positivo, que sofreu em 2021, mas encerrou o ano em alta e 2022 tende a ser um ano forte, com o contexto de commodities em alta, favorecendo o setor. Cruz atenta que as eleições devem inflar os gastos dos governos federal e estaduais.
Eduarda Korzenowski, economista da Somma Investimentos, por sua vez, chama atenção para o crescimento de 17,2% da Formação Bruta de Capital Fixa – medida do investimento no País, fazendo, porém, a ressalva de que, apesar de ter surpreendido e ter levado a FBCF para 19,1% do PIB, continua aquém dos 25% do PIB necessários para um crescimento sustentado da economia. Para isso acontecer, seria necessária uma taxa de 25%, o que demanda estabilidade econômica e também política, o que já se sabe que não vai acontecer neste ano. O cenário eleitoral envolve muita incerteza, o que acarreta instabilidade econômica e consequentemente postergação de consumo e de investimento. As perspectivas para este ano são mais complicadas com o cenário inflacionário – que o conflito na Ucrânia piora, causando elevação de juros.
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