Economia

O otimismo de Lula com a economia, apesar do juro do BC

Em café com jornalistas, presidente ensaia discurso do “espetáculo do crescimento”. O motivo? Haddad

Café da manhã promovido pelo presidente Lula com jornalistas em 6 de abril. Foto: Evaristo Sá/AFP
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Luiz Inácio Lula da Silva começou o ano em campanha contra o Banco Central, seu comandante, Roberto Campos Neto, e a taxa de juros do BC. Via a taxa, a maior do mundo, como um entrave à economia. Para ele, seus ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) tinham de se preocupar com a previsão do Fundo Monetário Internacional de crescimento do País neste ano, de só 1%. Perto de 100 dias no poder, o presidente parece outro.

“Vamos ver mudança no ritmo da economia brasileira”, disse Lula nesta quinta-feira 6 em café da manhã com jornalistas, do qual CartaCapital participou. No terceiro encontro com a mídia neste ano, o petista ensaiou o discurso de que o País verá um “espetáculo do crescimento”, expressão usada por ele em 2004, no primeiro mandato. Não quer repeti-la categoricamente, afirmou agora, mas já a namora. Vamos “reverter essa mediocridade” de baixo crescimento, declarou ele.

A nova postura de Lula havia despontado em uma reunião ministerial na segunda-feira 3. “Eu acho que nós vamos crescer mais do que os pessimistas estão prevendo”, tinha dito ali. Aos jornalistas, comentou no café que não quer “ficar brigando com o presidente do Banco Central”. O que explica a mudança do presidente? Por que ele próprio parecia pessimista e hoje tenta vender otimismo?

Segundo um ministro, Lula foi convencido por Haddad de que a ampliação de gastos públicos (sobretudo sociais) neste ano, graças a uma alteração na Constituição feita em dezembro, será capaz de impulsionar o PIB. Enquanto o FMI calcula crescimento de 1% e o tal do “mercado”, de 0,9%, a Secretaria de Política Econômica, subordinada a Haddad, aposta em 1,6%.

No fim de março, a ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, que é economista, havia dito à reportagem que o orçamento deste ano, aquele aprovado em dezembro, “tem um potencial importante para dar uma acelerada na economia, mesmo com esse freio (representado) pelas taxas de juros altas (dos bancos, em razão daquela praticada pelo BC)”.

O que não quer dizer que Lula deixou de achar que a chamada taxa Selic, de 13,75%, seja um pepino. Para ele, o  juro atual “é humanamente inexplicável” e “incompreensível”, pois não há “inflação de demanda”.

Para o BC, há, sim, inflação de demanda, conforme se viu na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária. Na reunião concluída em 22 de março, o Copom manteve o juro em 13,75%. Ao explicar sua decisão na semana seguinte, o BC apontou inflação de demanda. Explicitou que quer que o Brasil cresça menos, pois é assim que os preços serão controlados. Anotou que certo desemprego e arrocho salarial é bem-vindo.

A postura do Banco Central na ata foi uma espécie de desafio ao governo, por tudo o que Lula havia dito desde o início do ano. Como o BC desfruta de autonomia graças a uma lei de 2021 e seus diretores podem decidir o que quiserem sem correr o risco de demissão, isso talvez ajude a entender a mudança de postura do presidente. A lei da autonomia é uma amarra ao governo.

No café, Lula comentou uma declaração atribuída a Campos Neto de que o juro não estaria tão alto, pois para cumprir a meta de inflação do ano que vem, de 3%, teria de ser o dobro (26%) do atual. Para Lula, uma paulada dessa magnitude no juro é totalmente indesejada e, se fosse necessário, a meta de inflação poderia ser alterada. Essa meta é fixada pelo governo e, desde o início do ano, paira no ar a hipótese de alterar a de 2024 (3%). Não há decisão a respeito, segundo Lula.

“Estou muito preocupado com a situação do desemprego”, disse ele no café com jornalistas. O desemprego subiu de 7,9% em dezembro, último mês de Jair Bolsonaro no poder, para 8,6% em fevereiro, último dado disponível no IBGE, o órgão oficial das estatísticas. É uma sazonalidade típica dessa época do ano, mas que cai na conta do governo Lula. O salário médio dos trabalhadores nesse período ficou praticamente igual: era de 2.841 em dezembro e chegou a 2.853 em fevereiro.

Ao falar do mercado de trabalho, Lula citou especificamente o setor automobilístico. Contou ter recebido um telefonema recente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (presumivelmente de seu presidente, Moisés Selerges Junior) e ouvido que várias montadoras estão paralisadas.

O setor, disse Lula, “parou de vender porque o povo parou de comprar”, não existe mais carro popular, “não está fácil comprar carro”. Em 2010, último ano dos governos anteriores de Lula, as montadoras venderam 3,8 milhões de carros no Brasil. Agora, comercializam a metade, afirmou o petista. O financiamento mais barato por parte delas, na visão de Lula, precisa voltar.

Na segunda-feira 10, o presidente reunirá seus ministros parra um balanço de 100 dias de governo e para apresentar planos futuros. Entre estes, está justamente o de tentar baratear o crédito bancário, sobretudo para pequenas e médias empresas, pequenos e médios agricultores. A Fazenda desenhou um programa, o Desenrola, para desafogar quem tem dívidas bancárias e tentar fazer com que essas pessoas voltem a tomar empréstimos.

É outra medida que agora deixa Lula um pouco mais otimista com o futuro da economia. Idem um plano de obras de infraestrutura e na área social que deve ser lançado em 28 de abril. Até agora, é chamado dentro do governo de “novo PAC”, um nome provisório.

Alguns petistas no Congresso têm mostrado nos últimos dias uma postura mais pessimista, mais parecida com aquela de Lula no início do ano. A visão é de que o plano Haddad de controle de gastos pode travar a economia em 2024, em razão do objetivo de zerar o déficit público. Lula acredita que o plano é uma “engenharia muito bem pensada pela equipe do Haddad”.

O tempo dirá quem tem razão: os pessimistas ou os otimistas.

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