Cultura
Tico Santa Cruz teme que rock prefira Bolsonaro a Lula em 2022
Detonautas lança 7º álbum, o mais carregado de crítica social e política desde a criação da banda; a ênfase se deve ao momento
Com o nome de Álbum Laranja, a banda Detonautas Roque Clube apresenta seu sétimo disco de estúdio com 11 faixas – oito já haviam sido lançadas no formato single – com muitas críticas, algum humor e desejo de esperança. Trata-se do trabalho sócio-político mais contundente do grupo desde sua criação, em 1997.
“O Detonautas, desde 2002, tem músicas de questões sociais, mas não com essa ênfase que demos agora”, diz o vocalista Tico Santa Cruz. Segundo ele, contribuiu para isso o momento delicado que o Brasil vive, de “processo de ruptura da democracia”, e a pandemia.
Álbum Laranja (Sony Music) é uma “brincadeira” alusiva a dois discos clássicos do rock: branco dos Beatles (de 1968) e preto do Metallica (de 1991). “Colocamos como uma referência ao que está acontecendo aqui no Brasil, com a utilização sistemática de laranja pelo governo”, afirma Tico.
O trabalho conta com participações de Gabriel, o Pensador e Gigante no Mic, e os títulos das faixas já dão uma ideia do que se pode ouvir no trabalho forte e direto: Micheque (sobre os cheques depositados na conta da primeira-dama), Kit Gay, Roqueiro Reaça, Mala Cheia, Político de Estimação, Bandeira Brasileira, Carta ao Futuro, Racismo é Burrice, Clareiras, Fica Bem e Carta ao Futuro (versão acústica).
Eleições
Na música Roqueiro Reaça (uma crítica ao reacionarismo encrustado no movimento), que trata muito de perto do universo da banda, Tico Santa Cruz aponta o País com um peculiaridade com relação ao rock que o impulsiona para o campo da direita, embora seja contraditório para um gênero estabelecido sob a égide da contracultura.
“No aspecto do Brasil, o rock é um movimento tradicionalmente de classe média. Até porque para você comprar uma guitarra, um baixo, uma bateria, é caro”, diz. “A periferia ouve muito pouco o rock”. O músico lembra que quando o Detonautas começou, os equipamentos eram emprestados. “E eu era de classe média”, ressalta.
“A classe média aqui se identifica com rico, mas ela está dentro da classe trabalhadora e mais próxima dos pobres. O brasileiro de classe média tem uma visão preconceituosa de não se encarar como classe trabalhadora. O rock reproduz esse olhar confuso”.
Tico lembra que a partir dos movimentos de 2013, a “galera do rock and roll” fez muita confusão sobre o que de fato ocorria: “Quando começou a criminalização da esquerda e a tentativa de golpe em cima da Dilma, uma parte muito grande do rock entendeu que “se é contra governo, eu também sou contra” e “político é tudo bandido”.
Isso, segundo o cantor e compositor, somou forças com a extrema direita. “Agora que eles começaram a colocar a cara para falar ‘Fora, Bolsonaro’. Mas tem um público do rock conservador e totalmente contraditório com o que o rock se propõe a fazer”. O vocalista do Detonautas acrescenta que o gênero não compactua com conservadorismo, fundamentalismo e negacionismo.
Nas eleições do ano que vem, Tico diz ser incerto em quem os roqueiros darão seu voto. “Já declarei apoio ao Ciro (Gomes), apesar das ressalvas que tenho feito a ele publicamente. Agora, no segundo turno, se for o Lula e um projeto de direita, eu vou votar no Lula. O que estou dizendo para essas pessoas que não vão votar em Lula porque é do PT e tal é que tem que sair disso e defender a democracia”.
O músico diz ainda que os artistas do mainstream do rock nacional dificilmente se posicionarão, em um primeiro momento, a favor do campo progressista. “Talvez escolham o Ciro para não se envolver na polêmica Lula x Bolsonaro. Mas se esses dois forem para o segundo turno e eles fugirem da responsabilidade de se posicionarem, vai ficar muito feio”, finaliza.
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