Carta Explica

Por que seu voto nem sempre ajuda a eleger o candidato que você escolheu

Entenda como funciona o sistema proporcional de votação para deputados e vereadores

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Quando se fala em sistema eleitoral, é preciso entender que, no Brasil, existem dois sistemas distintos: o majoritário e o proporcional. E como veremos adiante, nem sempre o seu voto ajudará a eleger o candidato que você votou.

Presidente, governadores e prefeitos

Quando falamos de cargos do Executivo – presidente, governadores e prefeitos –, usamos o sistema majoritário. Ou seja: ganha o que tiver mais votos. Simples assim. Se a maioria de 50% + 1 voto não for atingida em um primeiro turno, os dois mais votados concorrem entre si no segundo turno. 

Um adendo: no Brasil, somente existe segundo turno para cidades com mais de 200 mil eleitores. Naquelas cidades menores, se elege o candidato que tiver mais votos no primeiro turno.

Senado

Já no caso do Senado, é um pouco diferente: ara os senadores, não existe segundo turno. Cada estado tem três senadores, independentemente da população do estado. Os mandatos duram oito anos, então eles são renovados na proporção de um terço em uma eleição, e dois terços na próxima. No caso da eleição para senador, trata-se também de uma eleição majoritária no estado, mas o eleitor deposita dois votos quando são duas as vagas a serem renovadas e apenas um quando se renova uma única vaga, como é o caso destas eleições de 2022.

Deputados e vereadores

Aqui, a história se complica um pouco. Em eleições para deputados estaduais e federais e vereadores, usamos o sistema proporcional de votos. Nesses casos vota-se em apenas um candidato, mas se elege um maior número de representantes. A quantidade de deputados federais por estado será proporcional à população daquele estado. Por exemplo, em São Paulo, elege-se 70 deputados federais; no Acre, apenas 8.

Para se eleger, um candidato precisa atingir o quociente eleitoral.

O quociente eleitoral é calculado dividindo o número de votos válidos pelo número de vagas naquela casa. Brancos e nulos não entram nessa conta. 

Um exemplo: imagine que, nas eleições de uma cidade, tenham sido contabilizados 100 votos válidos, e haja 10 cadeiras na Câmara de Vereadores. Para calcular o quociente eleitoral, é preciso pegar o número de votos válidos (ou seja, 100), e dividir pelo número de cadeiras, no caso, 10. Dessa divisão teremos o resultado 10. Este é o quociente eleitoral.

Isso significa que, para eleger um candidato, um dos partidos precisa ter recebido pelo menos 10 votos. Sim, um partido, não candidato.

Isso mostra outra complicação do sistema proporcional que costuma causar dúvidas: quando você vota em um determinado candidato de um partido, na verdade você está fazendo duas escolhas: a qual partido deve pertencer uma vaga na Câmara e, em segundo lugar, qual sua predileção por um candidato de dentro daquele partido.

O eleitor pode ainda escolher votar apenas na legenda partidária: ao fazer isso, ele escolhe apenas o partido, sem elencar nenhuma preferência por um nome ou outro no interior dele.

Daí a importância de escolher bem não só seus candidatos, mas também observar a qual partido eles pertencem. É importante entender que a vaga nas casas do Legislativo pertencem aos partidos e não aos candidatos.

Nesse sentido, é importante destacar que caso o candidato eleito por um partido se desfilie, deixe de fazer parte desse partido, ele perde o mandato. Isso está especificado na Lei dos Partidos Políticos (lei nº 9.096/1995), em seu artigo 22-A.

Há, no entanto, três condições previstas para que um deputado ou vereador possa se desfiliar sem perder o mandato. São elas: a incorporação ou fusão do partido; mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário, grave discriminação pessoal.

No entanto, se o político for expulso do partido, ele também mantém o seu mandato. Isso acontece porque a jurisprudência do TSE entende que não houve infidelidade partidária em casos de expulsão.

E como os partidos escolhem para quais candidatos vão aquelas vagas? No Brasil adotamos também o sistema de lista aberta, que em resumo, significa que as vagas destinadas àqueles partidos serão ocupadas pelos candidatos mais votados.

Portugal, por exemplo, usa o sistema de lista fechada, ou seja, cabe ao partido escolher quais serão os candidatos que terão direito àquelas vagas independentes de seus votos. Apesar de parecer injusto, esse sistema é usado para equilibrar os gêneros nas casas legislativas. Lá, a cada homem eleito, uma mulher também será. Isso já não é possível no nosso sistema.

O sistema proporcional costuma causar muita confusão, porque é bastante comum observarmos candidatos com poucos votos sendo eleitos pelos chamados puxadores de voto. Como funciona isso?

Voltando ao nosso exemplo imaginário: se um candidato nessa cidade onde o quociente eleitoral é 10 tiver 20 votos, o partido dele terá direito a duas vagas. Sendo assim, os votos dele servirão para eleger um candidato que pode ter tido 2 votos.

Esse foi o caso do candidato a deputado federal por São Paulo, Tiririca. Movido pelos votos de protesto, ele teve a maior votação entre os postulantes a uma vaga na Câmara dos Deputados em todas as unidades da federação em 2010. 

Concorrendo pelo PR-SP, ele teve 1,35 milhão de votos. Ficou muito à frente do segundo mais votado do país, Anthony Garotinho (PR-RJ), ex-governador do Rio de Janeiro, que recebeu 700 mil votos, e teve mais que o dobro do segundo mais votado em SP, Gabriel Chalita (PSB), escolhido por 560 mil eleitores.

Os votos do Tiririca permitiram que o partido dele elegesse outros três deputados, que tiveram uma votação bem menos expressiva.

Outro caso interessante de se analisar foi o de Luciana Genro (PSOL). Em 2010, ela recebeu pouco menos de 130 mil votos para deputada federal pelo Rio Grande do Sul, sendo a oitava mais votada no estado. Genro não conseguiu um lugar entre os 31 deputados do estado. Isso ocorreu porque o PSOL não conseguiu atingir o quociente eleitoral do estado, e ficou sem vagas.

Também em 2010, Jean Wyllys foi beneficiado pelo mesmo sistema que prejudicou sua colega de partido. Com 13 mil votos, Wyllys se tornou o deputado federal eleito com a menor proporção de votos do País. O psolista ganhou uma vaga na Câmara graças à votação do seu colega Chico Alencar (PSOL-RJ), que teve 240 mil apoiadores. Com os votos de Alencar, Wyllys e outros, o PSOL-RJ teve direito a duas vagas na Câmara. Como Wyllys foi o segundo mais votado do partido, teve direito a essa vaga.

Ou seja, antes de votar, você precisa pesquisar sobre o partido e ter certeza que os valores do programa partidário são parecidos com aqueles em que você acredita. Além disso, também vale conferir os outros candidatos da legenda – principalmente aqueles com mais tempo de propaganda eleitoral. Caso contrário, você pode ajudar a eleger alguém que não tenha nenhuma concordância com o que você pensa e quer para o País.

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