Carta Explica

O que é o Hamas, grupo palestino que enfrenta Israel e protagoniza ofensiva sem precedentes

O movimento lidera embates com os israelenses, sempre sob o argumento da legítima defesa, mas é denunciado como terrorista por diversos países

A Faixa de Gaza em outubro de 2023, em meio ao cerco israelense. Foto: Mohammed Abed/AFP
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Uma ofensiva sem precedentes deflagrada no último sábado 7 por uma coalizão liderada pelo Hamas levou a uma nova e incerta escalada nas tensões entre palestinos e o Estado de Israel, com mais de 1,5 mil mortes registradas.

Ao anunciar uma operação paramilitar via terra, ar e mar, o comandante militar do Hamas, Mohammad Deif, disse se tratar de uma “batalha para acabar com a última ocupação do planeta”. Nesta segunda-feira 9, a reação em larga escala lançada pelo Exército israelense é marcada por um incessante bombardeio sobre a Faixa de Gaza, e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu afirma ser apenas o começo.

Hamas é um acrônimo de Harakat al-Muqāwama al-Islāmiyya, ou Movimento de Resistência Islâmica. Em sua carta fundadora, de 1988, não reconhecia a existência de Israel e, portanto, pregava contra o Estado judeu.

Embora o grupo seja, via de regra, retratado por suas violentas ações militares, tem uma série de ramificações a se confundirem com a gestão dos territórios onde se insere – por exemplo, por meio do Dawah, dirigindo escolas, restaurantes populares e espaços de lazer na Faixa de Gaza.

Ou seja, o objetivo era insistir em uma luta armada contra as forças de Israel ao mesmo tempo em que ofereceria uma espécie de plano de bem-estar social aos palestinos.

Sem renunciar a incursões agressivas contra seus inimigos, o Hamas conquistou um expressivo resultado nas eleições de 2006 na Faixa de Gaza e, nos meses seguintes, ampliou a ofensiva contra grupos considerados moderados. Uma das consequências foi a derrubada do movimento rival Fatah, do presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas.

Israel e Egito, por sua vez, mantêm um bloqueio sobre a Faixa de Gaza, na tentativa de sufocar o Hamas e forçá-lo a negociar em bases enfraquecidas. Os egípcios, históricos mediadores de cessar-fogo na Faixa de Gaza, são peças fundamentais no cerco ao enclave.

Desde que ascendeu ao poder político, o Hamas protagonizou uma série de embates com as forças de Israel, sempre sob o argumento da legítima defesa, em especial em 2008, 2012, 2014, 2021 e 2023.

Em 2021, por exemplo, Hamas e Israel recorreram ao lançamento de mísseis após um grupo de palestinos ser impedido de entrar na mesquita Al-Aqsa, em Jerusalém, um dos locais mais reverenciados pelo islamismo, no dia mais sagrado para o Islã.

Diversos países, a exemplo de Estados Unidos, Israel, Canadá, Reino Unido, Japão e o conjunto da União Europeia definem o Hamas como uma organização terrorista. Outros atores relevantes da geopolítica, como China e Rússia, não chancelam essa classificação, posição seguida pelo Brasil.

O caminho diplomático adotado pela Nova Zelândia é chamar de terrorista somente a fração militar do Hamas, os Batalhões do Mártir Izz ad-Din al-Qassam.

Por outro lado, o Hamas conta com o endosso, em maior ou menor escala, de Irã, Síria e Catar. O Hezbollah, baseado no Líbano e apoiado pelo Irã, também realiza ações em solidariedade ao movimento extremista palestino.

Bruno Huberman, professor de Relações Internacionais da PUC-SP, afirmou em entrevistaCartaCapital que Israel e seu principal aliado ocidental, os Estados Unidos, poderiam ter aplicado mais esforços nos anos 1990 pela formação de um Estado da Palestina. Essa saída teria gerado um quadro absolutamente distinto do atual e evitado milhares de mortes.

Segundo Huberman, criou-se um cenário em que o Hamas, com seus métodos violentos, obtém mais conquistas que outros grupos, como o Fatah, por meio de uma política executada pelo Estado de Israel e pelo Ocidente que, na prática, fortalece a opção agressiva e enfraquece a via pacífica.

“Esse retorno mais agressivo da opção violenta e o apoio da sociedade palestina resultam desses 30 anos de decepção e de acúmulo dessa panela de pressão de raiva, rancor, depressão, ausência de futuro e distopia”, diz o professor.

O pano de fundo do conflito Israel-Palestina remonta, ao menos em sua versão contemporânea, a 1947, diante da proposta de criação de dois Estados, um arábe (Palestina) e um judeu (Israel). No ano seguinte, veio a proclamação do Estado de Israel, com enfática participação do Brasil. E só.

Há aproximadamente seis anos, o Hamas atualizou seu estatuto de fundação e definiu que não lutaria contra os judeus em abstrato, mas diante dos “agressores sionistas de ocupação”.

Bruno Huberman diz que a Faixa de Gaza vive “em estado de sítio”, a partir da ação de Israel para cortar o fornecimento de energia, água e alimentação.

“Todo mundo diz que a Faixa de Gaza está desocupada, mas o que a gente vê desde 2005 é um cerco. Israel retirou os assentamentos que tinha na Faixa de Gaza e desde então tem um cerco marítimo, terrestre e aéreo. Ninguém entra, ninguém sai”, explica. “É uma panela de pressão esquentada há mais de 50 anos que explodiu.”

Nesta segunda, o Hamas ameaçou matar reféns israelenses em resposta aos bombardeios contra a Faixa de Gaza. “Cada ataque contra o nosso povo sem aviso prévio será respondido com a execução de um dos reféns civis”, afirmaram, por meio de nota, os Batalhões do Mártir Izz ad-Din al-Qassam.

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