CartaCapital
Forças Armadas/ Poder Moderador?
O PSOL pede ao STF para definir interpretação do artigo 142 da Constituição


Citado com frequência pelos extremistas que sonham com intervenção militar, o artigo 142 da Constituição é objeto de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de autoria do PSOL. O partido pede ao STF a nulidade parcial do texto, sem perda da redação original, para evitar interpretações golpistas do texto constitucional. Nos últimos anos, bolsonaristas passaram a explorar o artigo 142 na defesa de um golpe de Estado, como se a Constituição de 1988 concedesse às Forças Armadas uma espécie de Poder Moderador, como na época do Império.
O artigo 142 diz que as Forças Armadas “se destinam à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer um destes, da lei e da ordem”. Em momento algum confere aos militares o direito de intervir na política e assumir o poder. Além disso, para ter valor legal, o artigo precisaria de Lei Complementar, que jamais foi redigida.
Na ADPF, o PSOL pede que sejam declaradas inconstitucionais “todas as variantes interpretativas que caracterizem as Forças Armadas como ‘Poder Moderador’; ampliem suas atribuições para além daquelas fixadas pelo texto constitucional, quais sejam: a defesa do território nacional contra ameaças estrangeiras, permitam a ruptura total ou parcial do regime democrático vigente ou a instauração de um governo de exceção pelas Forças Armadas ou civis apoiados por elas”. No Brasil, o óbvio precisa ser reiterado.
“Juiz corrupto”
O Tribunal de Justiça do Paraná rejeitou uma ação movida pelo senador Sergio Moro, do União Brasil, e decidiu manter postagens do jornalista Glenn Greenwald que o chamam de “juiz corrupto”. Em uma das publicações, o vencedor do Prêmio Pulitzer de 2014 é categórico: “O corrupto juiz brasileiro que ordenou a prisão de Lula em 2018 para impedi-lo de concorrer à Presidência, e que em seguida foi trabalhar para Bolsonaro ocupando o cargo de ministro da Justiça, está agora concorrendo à Presidência da República, e acusa Bolsonaro e Lula de fazerem campanha de apoio a Putin”. O texto faz referência às mensagens interceptadas por um hacker, que revelaram um conluio de Moro com os procuradores da Lava Jato para obter a condenação do líder petista a qualquer custo.
Unicef/ Infância perdida
O Brasil tem 32 milhões de crianças e adolescentes na pobreza
A taxa de analfabetismo nessa faixa etária dobrou em dois anos – Imagem: Renato Luiz Ferreira
Ao menos 32 milhões de crianças e adolescentes viviam em situação de pobreza no Brasil em 2019, revela uma pesquisa divulgada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância, o Unicef, na terça-feira 14. O contingente representa quase dois terços da população nessa faixa etária no País.
Segundo o estudo, muitos desses brasileiros estão submetidos ao trabalho infantil ou privados de acesso a moradia digna, água, saneamento, informação, renda, alimentação e educação. Os dados têm como base informações oficiais da Pnad Contínua do IBGE.
Ainda de acordo com o levantamento do Unicef, 16,1% das crianças e adolescentes viviam em situação de extrema pobreza em 2021. No ano passado, o analfabetismo nessa população era de 3,8%, o dobro do registrado em 2020.
CartaCapital/ Mulheres de luta
Antonia Quintão, Célia Xakriabá, Maria Rita Kehl e Marjorie Marona reforçam o nosso time de colunistas
Antonia Quintão, Célia Xakriabá, Maria Rita Kehl e Marjorie Marona irão se revezar a cada semana – Imagem: Redes sociais e Marizilda Cruppe/Amazônia Real
Primeira deputada indígena de Minas Gerais, Célia Xakriabá estreou sua coluna em CartaCapital na primeira semana de fevereiro, ao tomar posse na Câmara Federal. “Entro aqui não com as gravatas do protocolo, mas com a gravata dos nossos ancestrais. As gravatas Xavantes, as gravatas Xakriabás e de todos nós. Entro para assinar, não para assassinar direitos”, escreveu na ocasião. “É o começo da resistência em um Parlamento anti-indígena.”
A partir de março, o time de colunistas da revista será reforçado com outras três mulheres, referências nas áreas em que atuam. Uma delas é a socióloga Antonia Quintão, presidente da Geledés, ONG criada em 1988 em defesa das mulheres negras. Professora e coordenadora dos cursos de pós-graduação lato sensu do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Quintão também atua como pesquisadora na USP e no Instituto Universitário de Lisboa, em Portugal.
Neste mesmo mês, a psicanalista, escritora e ensaísta Maria Rita Kehl inaugura sua coluna. Doutora em Psicologia Clínica pela PUC de São Paulo e integrante da Comissão Nacional da Verdade (2012-2014), ela é autora de mais de uma dezena de livros, entre eles Sobre Ética e Psicanálise (Cia das Letras, 2000), Bovarismo Brasileiro (Boitempo, 2018) e O Tempo e o Cão: a Atualidade das Depressões, este último vencedor do Prêmio Jabuti de 2010.
Por fim, Marjorie Marona passa a escrever sobre o intrincado cenário político nacional. Professora do Departamento de Ciência Política da UFMG e coordenadora do Observatório da Justiça no Brasil e na América Latina, ela é coautora de obras como A Política no Banco dos Réus: a Operação Lava Jato e a Erosão da Democracia no Brasil (Autêntica, 2022) e Democracia e Justiça na América Latina: Para Onde Vamos (Eduerj, 2021). Os leitores de CartaCapital não poderiam estar em melhor companhia.
Discriminação oficial
Com a promessa de oferecer mais segurança aos paulistanos, o sistema Smart Sampa representa uma ameaça aos direitos humanos, em especial da população negra e LGBTQIA+. Foi o que revelou um relatório preliminar do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, a apontar falhas no projeto de monitoramento e reconhecimento facial que a prefeitura pretende implantar. O Smart Sampa prevê a instalação de 20 mil câmeras na capital paulista com o objetivo de identificar as pessoas por características físicas, incluindo a cor da pele, além de ser capaz de cruzar dados com redes sociais. O parecer foi preparado a pedido de vereadores da oposição.
Violência/ Barril de pólvora
Número de armas nas mãos de civis chega a quase 3 milhões no Brasil
Imagem: iStockphoto
Nos quatro anos do governo Bolsonaro, o número de armas de fogo nas mãos de civis mais que dobrou no Brasil. É o que mostra um levantamento realizado pelos institutos Sou da Paz e Igarapé, divulgado na segunda-feira 13. Em 2018, antes de Bolsonaro tomar posse, eram 1.320.582 armas. No fim de dezembro do ano passado, este número chegou a 2.965.439. Os dados foram colhidos a partir da Lei de Acesso à Informação e consideraram as armas pessoais ou particulares de propriedade de caçadores, atiradores desportivos e colecionadores (CACs), cidadãos comuns com registro para defesa pessoal, caçadores de subsistência, servidores públicos civis com prerrogativa de porte e integrantes de instituições militares que compram armas para uso pessoal.
Além do aumento considerável na quantidade de armas nas mãos de civis nesses quatro anos, chama atenção o explosivo crescimento do número de CACs, fortemente estimulados por Bolsonaro. Em 2018, 27% das armas pertenciam aos CACs e no fim de 2022 o porcentual chegou a 42,5%. Saiu de 59.417 armas há quatro anos para 431.137 em dezembro passado.
Haley desafia Trump
Nikki Haley anunciou, na terça-feira 14, a intenção de disputar com Donald Trump a indicação do Partido Republicano para a eleição presidencial dos EUA, em 2024. “Sou uma candidata à Presidência”, afirmou a ex-embaixadora na ONU em vídeo divulgado nas redes sociais. Em 8 de fevereiro, ela havia prometido um “anúncio especial” para seus seguidores em Charleston, Carolina do Sul, estado do qual foi governadora entre 2011 e 2017. Além de Haley, o ex-vice-presidente de Trump, Mike Pence, o ex-chefe da diplomacia Mike Pompeo, e o governador da Flórida, Ron DeSantis, figuram entre os possíveis desafiantes de Trump em sua própria legenda.
Israel/ Golpe branco em curso
Netanyahu tenta limitar poderes da Suprema Corte e povo reage
“Salvem a democracia”, clamavam os manifestantes emJerusalém – Imagem: Ahmad Gharabli/AFP
Cerca de 100 mil manifestantes se concentraram ao redor do Knesset, o Parlamento de Israel, para protestar na segunda-feira 13 contra uma proposta de reforma judiciária apresentada pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que limita poderes da Suprema Corte. No plenário, parlamentares trocaram insultos e ao menos três representantes da oposição foram obrigados a se retirar da sessão, após protagonizarem um tumulto.
Muitos israelenses viajaram de várias partes do país para aderir ao ato convocado pela oposição em Jerusalém, segundo o jornal local Haaretz. Com bandeiras nacionais e cartazes com dizeres como “Salve a democracia” e “O mundo inteiro está de olho”, os manifestantes chegaram a entrar em confronto com a polícia ao avançar sobre a grade de proteção do Knesset.
Netanyahu argumenta que a mudança é necessária para retirar a Justiça das mãos de “magistrados elitistas e tendenciosos”. Caso a reforma seja aprovada, o Parlamento israelense teria o poder de derrubar decisões da Suprema Corte por meio de votações com maioria simples, algo que a ultradireitista coalizão governista já tem.
Crise dos balões/ E.T. inocentado
EUA e Canadá abatem três óvnis e negam “invasão alienígena”
Washington acusa a China de usar balões para espionagem – Imagem: Tyler Thompson
A notícia de que as Forças Aéreas dos EUA e do Canadá derrubaram três objetos voadores não identificados, de sexta-feira 10 a domingo 12, causou reboliço entre os ufólogos e os bolsonaristas que sonham com uma intervenção alienígena para abreviar o mandato de Lula. Coube à porta-voz da Casa Branca, Karine Jean Pierre, desmentir as teorias da conspiração a ganharem asas nas redes sociais. “Não há qualquer indicação de aliens ou atividade extraterrestre”, disse a funcionária, uma fã declarada do filme E.T., clássico dos anos 1980 dirigido por Steven Spielberg. Ou esta seria mais uma ação diversionista de Washington para esconder o contato imediato?
Bem, a realidade não é menos intrigante neste caso. O Pentágono suspeita que os óvnis abatidos – um sobre o Alasca, outro sobre o território canadense de Yukon e um terceiro sobre Michigan – são balões espiões da China. A informação foi confirmada pelo líder da maioria no Senado, o democrata Chuck Schumer, à rede de televisão ABC. “Até alguns meses atrás, não sabíamos desses balões. Nossa inteligência e nossos militares não sabiam. Isso remonta ao governo do presidente Trump”, afirmou o parlamentar. Em resposta, o porta-voz da chancelaria chinesa, Wang Wenbin, trocou acusações: “Desde o ano passado, balões de alta altitude dos EUA operaram mais de dez voos ilegais no espaço aéreo chinês”.
Sem trégua
Nem mesmo o devastador terremoto que provocou mais de 35 mil mortes na Turquia e na Síria, no início de fevereiro, foi capaz de sensibilizar o Estado Islâmico por um cessar-fogo. Ao menos 11 pessoas, a maioria civis, morreram em um ataque no centro da Síria atribuído ao grupo terrorista, anunciou o Observatório Sírio para os Direitos Humanos no domingo 12. O grupo jihadista “atacou perto de 75 pessoas no sábado, enquanto coletavam trufas na zona de Palmira”, informou a ONG, acrescentando que morreram no ataque dez civis e um integrante das forças armadas do regime sírio.
Igreja Católica/ Silêncio diabólico
Sacerdotes portugueses abusaram de quase 5 mil crianças desde 1950
A maior parte dos crimes sexuais cometidos pelo clero prescreveu – Imagem: Curia Metropolitana de Lisboa
O clero católico em Portugal abusou de quase 5 mil crianças desde 1950, revelou, na segunda-feira 13, uma comissão independente que investiga denúncias de pedofilia na Igreja Católica a convite do papa Francisco, que em 2019 prometeu punir todos os sacerdotes envolvidos nesses crimes. Os investigadores ouviram os relatos de mais de 500 vítimas, mas sabem que a subnotificação é gigantesca. “Esses testemunhos nos permitem estabelecer uma rede muito maior de vítimas, pelo menos 4.815”, afirmou o psiquiatra Pedro Strecht, durante coletiva de imprensa em Lisboa.
O prazo para a apresentação de queixa criminal expirou para a grande maioria dos casos, mas 25 processos foram transferidos para a polícia e resultaram na abertura de inquéritos. Um desses raros casos em andamento diz respeito a “Alexandra”, uma mulher de 43 anos que pediu anonimato. Ela afirma ter sido estuprada por um padre durante a confissão, quando era freira noviça, aos 17 anos de idade. A comissão sugeriu às autoridades portuguesas a extensão do tempo de prescrição para o crime de pedofilia.
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1247 DE CARTACAPITAL, EM 22 DE FEVEREIRO DE 2023.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “A Semana”
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