Diálogos da Fé

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Você gostaria de conhecer um terreiro? Saiba quais os caminhos

Se seu coração lhe chama para ouvir a voz dos tambores, aceite o convite e venha de coração aberto e sem medo

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“O terreiro é um território ancestral de encruzilhada; O terreiro fertiliza a linha reta, cruzando-a; Território ancestral de cura espiritual por meio de tudo o que é plural; O terreiro é som, é voz, é grito; Som dos tambores que atravessam a linearidade temporal e os muros que nos dividem.”

Iyalorixá Joesia de Oyá

Vivemos na sociedade da linha reta, do dogma, das verdades absolutas, do caminho único e de um único caminho regular e aceitável. Há um uso discursivo odioso para tudo que, de uma perspectiva universalista, é considerado fora da linha. 

Podemos dizer que, hoje, há muitos narcisos que acham feio tudo que não lhes é espelho e isso tem engessado sentimentos, comportamentos, pensamentos, palavras e até a criatividade das pessoas. 

No mito grego, Narciso é um jovem belíssimo, mas fútil e orgulhoso, a quem todos amam, mas que não ama ninguém. Um dia, Narciso aproxima-se de um lago (a versão de Ovídio aponta que essa foi um castigo da deusa Nêmesis, pela frivolidade do rapaz) e, ao ver o próprio reflexo, apaixona-se perdidamente por si mesmo, ao ponto de nunca mais conseguir sair de lá. Assim, definha e morre.

O amor, a bondade e a generosidade de Narcisos só existe a partir das próprias existências, das próprias ações, das próprias imagens e dos próprios comportamentos. Um Narciso odeia tudo o que não lhe reflete de modo idêntico. No narcisismo há muito medo também. Um medo de se reconhecer diferente e ter de conviver com a diferença. 

Narciso vive do medo e projeta medo sobre o mundo para controlar as pessoas e criar o seu próprio mundo. É o medo da alteridade. 

Se seu coração lhe chama para ouvir a voz dos tambores, aceite o convite e venha de coração aberto e sem medo

A alteridade expressa e determina a natureza, existência, estado ou características do outro, ou seja, aquilo que é diferente daquilo que vivemos e tomamos como mais ou menos adequado. As relações entre o “eu” e o “outro” e as diferentes percepções de um “eu” em contraste com os “outros” estabelecem o conceito de alteridade. No conceito antropológico, o “eu” só pode ser entendido a partir da “interação com o outro”.

Na sociedade do medo e das interações rápidas, fugazes e superficiais, o medo tem sido potencializado por forças que se beneficiam do ódio entre os diferentes e as diferenças e isso tem cada vez mais nos encapsulado e nos afastado por meio de algo que, em verdade, também nos constitui. 

Na condição de uma religiosidade não dominante, não hegemônica e tomada pelo senso-comum como menor e irregular, as manifestações de terreiro, em sua pluralidade, representam a manutenção da alteridade, representam o cruzar da linha reta e, por isso, têm sido cada vez mais procuradas por aqueles que se sentem silenciados, encarcerados e adoecidos pela sociedade do controle e de controladores. 

A linha reta é adoecedora, é estéril, é árida; as religiões afro-brasileiras são de cruzo. São manifestações ancestrais de encruzilhada e a encruzilhada é fértil e multiplicadora. A encruzilhada é criativa porque oferece caminhos diversos e possibilidades múltiplas. 

Desse modo, cada vez mais, as diferentes tradições de terreiro; Umbanda, Quimbanda, Candomblé, Jurema, Tambor de Mina, Nagô, Nagô-Vodum, Nagô-Egbá, Umbandaime, Xangô e tradições irmãs, por todo o Brasil, têm sido procuradas como espaços de conforto emocional e cura espiritual, evidenciando que a alteridade é saudável. 

Mas como chegar em um terreiro? Qual caminho seguir? Quais as maneiras mais respeitosas de acessar e conhecer estes territórios?

Jogo de búzios

O acesso ao terreiro pode se dar por meio de uma consulta ao jogo de búzios. O jogo de búzios é um oráculo de origem iorubá que traz a mensagem dos Orixás e fala da “orixalidade” e caminhos espirituais da pessoa que procura o oráculo. Melhor que seja por indicação de alguém e que já conheça o trabalho do Pai ou da Mãe de Santo;

Visita a uma celebração aos Orixás e/ou aos Espíritos Encantados

A maioria dos Terreiros possui um calendário anual de celebrações públicas e qualquer pessoa pode comparecer. Há alguns na internet, na página e no Instagram dos terreiros ou por meio de algum filho do terreiro. Durante a visita, as roupas devem ser apropriadas para uma celebração religiosa e, de preferência, na cor branca, evitando-se as cores pretas e vermelhas – exceto nas celebrações e trabalhos espirituais para os Exus e Pombagiras. Basta chegar e procurar um Ogã e/ou uma Ekede, uma mãe e/ou pai pequeno e se apresentar, dizendo que é a sua primeira vez na comunidade, onde e como deve se acomodar. Fotos e filmagens não são bem-vindas sem uma prévia consulta e há casas em que são totalmente proibidas;

Consulta aos Espíritos Encantados

A Umbanda e tradições afins costumam ter atividades abertas semanais ou quinzenais e a aproximação pode se dar por meio de conversas e passes espirituais com os espíritos encantados da casa. Recomenda-se, durante a visita, roupas brancas e/ou claras, evitando as cores pretas e vermelhas e roupas inadequadas a um ambiente religioso

Indicação de um amigo

Sempre é possível receber um convite de alguém que já é da comunidade de terreiro e, nesse caso, convém se informar com a pessoa que convidou como devem ser as vestimentas, horário de chegada e como se comportar durante a visita; 

Redes virtuais

 é possível fazer contato com uma comunidade de terreiro por meio de espaços virtuais. Convém acompanhar e avaliar primeiro. Perceber se dialoga com seus valores e princípios. Se decidir conhecer o trabalho pessoalmente, pode enviar uma mensagem por meio das redes virtuais e solicitar uma visita. As pessoas respeitosas e educadas sempre são bem-vindas.

Muito embora terreiro não seja uma massa única e uniforme, a cultura de terreiro é acolhedora e as pessoas adoram receber e divulgar seus saberes. A visita não é diferente de uma visita a uma família, de uma visita a um templo, de uma visita a um espaço ancestral que atravessa o tempo e o espaço do lado de fora. 

Diz-se que um terreiro não tem portas nem janelas e todas, todes e todos são bem vindes. Se seu coração lhe chama para ouvir a voz dos tambores, aceite o convite e venha de coração aberto e sem medo.  

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