Diálogos da Fé

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Diálogos da Fé

Retomando a leitura popular da Bíblia

A Teologia da Libertação e a leitura popular da Bíblia da década de 70 nos auxiliam a compreender a história da América Latina, mas não dão mais conta das nuances e complexidades do século XXI

Foto: Pexels/Creative Commons/Pixabay
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Já falamos aqui que a Bíblia é o livro da classe trabalhadora. Mas como ler a Bíblia?  Aqui, trago um breve retomada, para que possamos nos inspirar nos passos já dados por companheiros e companheiras e buscar novas respostas para o Brasil de 2022, que tem se tornado cada vez mais evangélico.

A tradição latino-americana da leitura popular da Bíblia, a partir da Teologia da Libertação, foi construída a muitas mãos, daqui e de fora, de gente compromissada com gente. Nomes como Carlos Mesters, Milton Schwantes, Nancy Cardoso, Maricel Mena Lopez, Francisco Orfino, Odja Barros, entre outros. E também instituições como o Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), o Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (CESEEP) contribuíram para essa construção, e continuam nesta empreitada até os dias de hoje. 

A leitura popular da Bíblia  surgiu a partir dos encontros populares e das comunidades eclesiais de base na tentativa de encontrar correlações bíblicas para a história do povo sofrido. Os métodos de leitura da LPB consistem na tríade Realidade – conviver com o povo, aprender o que eles sabem;  Bíblia – trazer a Bíblia para o diálogo com o cotidiano, para a realidade, e buscar respostas;  Comunidade – partilhar o pão, a vida, através da transformação comunitária da realidade 

Os esforços e a resistência foram grandes, mas não podemos esquecer as investidas contra o povo construindo a sua própria fé. O lema “seja patriótico, mate um padre” foi levado ao pé da letra em El Salvador, quando em 1977, Rutilio Grande, padre jesuíta, foi assassinado pelas forças de segurança salvadorenhas. Na década de 70, junto à CIA, a inteligência boliviana construiu um dossiê contra os teólogos da Teologia da Libertação. Na década seguinte, o governo dos EUA estreitou laços com a Igreja Católica e, no mesmo período, o Papa João Paulo II esteve na revolução nicaraguense atacando os padres progressistas. No Chile, 32 Igrejas pentecostais celebraram o golpe de Pinochet contra o socialista Salvador Allende.

Com isso, o campo progressista religioso e teológico foi ganhando outros contornos, e alguns deles distanciaram-se do povo. Como alerta a pastora e teóloga Odja Barros Santos, em sua dissertação de mestrado, os estudos bíblicos feministas estão se tornando cada vez mais elitistas e academicistas, se distanciando das camadas populares e das bases eclesiásticas.  Dessa forma, os espaços vazios da espiritualidade popular foram sendo preenchidos de leituras fundamentalistas, conservadoras e opressoras que tomaram os territórios periféricos e rurais.

Neutralizar as leituras fundamentalistas já não basta. Neutralizar já não é uma alternativa, pois esses discursos se tornam uma verdade absoluta, dogmática, que vai muito além da religião.”A Teologia da Libertação e a leitura popular da Bíblia da década de 70 nos auxiliam a compreender a história da América Latina, mas não dão mais conta das nuances e complexidades do século XXI. É preciso expandir as formas interpretativas da Bíblia, trazendo as memórias dos povos oprimidos e excluídos, abarcando os hibridismos, negociações, miscigenações da sabedoria, como as teologias feministas, mulheristas, asiáticas, negras, queer etc. 

Como Mariátegui nos avisa, temos que aprender. Precisamos dar a continuidade criativa às teologias da libertação e à relação entre os movimentos populares e os companheiros e companheiras de fé, que também se encontram na mesma trincheira, buscando novas formas de se relacionarem com o Sagrado.

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