Diálogos da Fé

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Não há lugar para Jesus em Maceió

Na beira da lagoa Mundaú não há mais marisqueiras pescando sururu, não há mais crianças na rua, não há mais riso. O que há é morte

Maceió (AL) 02.12.2023, Bairros com risco de afundamento desocupados em Maceió. Minas da Braskem. Foto: Gésio Passos/Agência Brasil
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Em fevereiro de 2022, escrevi,  neste espaço, sobre a Braskem. Detalhei como a comunidade da Igreja Batista do Pinheiro, em união com moradores locais de Maceió, estava enfrentando os impactos negativos causados pela mineradora em cinco bairros da cidade

Há cerca de 15 dias, o noticiário nacional começou a veicular a possibilidade de um possível colapso nas minas deixadas pela Braskem. Uma delas chegou a desabar e o terreno tem cedido cerca de 12 centímetros por dia. O caos em Maceió, resultante da exploração desenfreada e destrutiva pela Braskem, tem sido convenientemente atribuído a fenômenos naturais por técnicos da Defesa Civil local. Esta postura não poderia ser mais enganosa, já que o culpado tem nome e sobrenome.

Recentemente, a Igreja Batista do Pinheiro, reconhecida como patrimônio histórico e cultural de Alagoas pela Lei Estadual nº 8.515/2021, teve suas atividades temporariamente suspensas pela Defesa Civil da cidade. O Pastor Wellington Santos explicou que a decisão de fechar a igreja foi voluntária, adotada como precaução até que se possa assegurar a ausência de riscos de desabamento na área.

Depois que a comunidade optou por suspender os cultos na igreja como medida de precaução, a Defesa Civil determinou a interdição, devido ao risco de desabamento da Mina 18. Ao ser perguntado sobre o impacto de não poder usar o espaço sagrado para fé e união, o pastor comparou a situação à uma passagem fundamental da Bíblia: “Estamos sem lugar, assim como Jesus não teve lugar para nascer”. 

A Igreja Batista do Pinheiro segue unida e ativa na denúncia contra os atos da Braskem. “Estamos sem o templo, mas não fechamos. A igreja continuará nas praças, nas ruas, nas estrebarias”, diz Santos. A prova disso foi um evento realizado neste último dia 10. O ‘Pinheiro Vivo e de Pé’ reuniu fiéis e ativistas para denunciar os danos ambientais causado pela Braskem e celebrar a resistência contínua da comunidade, que busca justiça após a interdição de seu local de culto. É importante destacar que, junto à Igreja Batista do Pinheiro, há também movimentos sociais de moradia, ambientais, dentre outros, que seguem na  resistência. 

As atrocidades da Prefeitura e das demais instituições do poder público também não podem passar impunes. Nestes últimos dias, famílias que resistiam e ainda moravam no bairro foram obrigadas a sair de suas residências, com ações extremamente truculentas da Polícia Militar do Estado. 

Há relatos de empurrões, gritos e desrespeito circularam. Algumas famílias tiveram dez minutos para saírem de suas casas, deixando documentos, roupas e até animais. Eu sigo perguntando: a quem interessa que cinco bairros sejam evacuados, desta maneira? Lembrando que a Braskem comprou praticamente todas as casas evacuadas a preço de miséria. E, agora, com o alarme do colapso da Mina 18, conseguiu tirar as últimas famílias que ainda moravam ali. 

O cenário é de terror: na beira das lagoas Mundaú não há mais marisqueiras pescando sururu, não há mais crianças na rua, não há mais riso, nem vizinhas conversando no portão. O que há é morte. A cada casa evacuada, um menino Jesus fica sem lar.  A cada ação de despejo, um Herodes segue em marcha contra a vida. 

Hoje, não há lugar para Jesus em Maceió. Jesus não nasceria nos condomínios que cercam a praia. Jesus nasceria nos Flexais, em uma casa sem teto, sem porta. Jesus nasceria na luta por moradia, por dignidade, por emprego, por educação, por cultura. E todas essas pessoas, que hoje lutam por justiça, estão na estrebaria, como Jesus. 

Porém, para os conhecedores da história de nascimento do Salvador do Mundo, ele nasce onde há o verdadeiro amor. A comunidade do Pinheiro segue lutando, adaptando-se para realizar  em espaços diversos, desde praças até auditórios. Enquanto isso, aguarda a resposta da Justiça Federal sobre o pedido de revisão da decisão que resultou na interdição do seu espaço de culto, localizado na Rua Miguel Palmeira, 1300, no bairro do Pinheiro.

 A comunidade também tem se beneficiado da solidariedade de empresas que, com generosidade, ofereceram seus espaços para as cerimônias, mostrando suporte e empatia pelas dificuldades enfrentadas pela igreja. Para os que optam por uma participação online, as celebrações também estão acessíveis no canal do YouTube da igreja

A Braskem precisa pagar pelo maior crime ambiental em área urbana do mundo. O povo de Maceió merece Justiça! Não é um acidente! #ForaBraskem

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