Diálogos da Fé

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Igrejas evangélicas e a violência doméstica, um tema urgente

Há sinais que podem nos ajudar a identificar uma mulher em situação de violência nas igrejas

PL 4.875/2020, aprovado no Senado nesta quarta, altera a Lei Maria da Penha. Foto: Freepik/Reprodução
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O dia 25 de novembro, no calendário internacional, é dedicado à luta pela eliminação da violência contra a mulher. Em todo o mundo, milhares de movimentos feministas destacaram, na data, os desafios de eliminar a violência de gênero, principalmente nos ambientes domésticos. Ao contrário da violência contra os homens que costuma ocorrer nas ruas, as mulheres sofrem, segundo a maioria esmagadora dos levantamentos, violência nos ambientes onde deveriam se sentir seguras: dentro de suas próprias casas. 

No contexto evangélico, no qual a família tradicional e a ideia de que casamentos devem ser mantidos a qualquer custo são amplamente defendidas, as marcas da violência doméstica são silenciadas e apagadas. Eu mesma já escrevi sobre inúmeros casos de violência em famílias evangélicas, e até sobre um caso de feminicídio. 

O poder atribuído ao marido, tido na religião como o cabeça e o sacerdote do lar, faz com a violência contra a mulher possa ser justificada pelo simples fato de ela não ser uma esposa virtuosa.  

E esse discurso é recorrente dentro das igrejas: mulheres devem edificar o lar, ser prudentes, garantir o bem estar dos filhos e dos maridos, mas quem cuida dessas mulheres? A família que este discurso defende é uma família que está ao serviço do homem, e nas costas de milhões de mulheres que seguem sendo responsáveis pelo “equilíbrio” do lar. Desse modo, uma família que “não dê certo”, com um divórcio, por exemplo, pode ser considerada um fracasso desta mulher por não ter sido uma esposa idônea, ou uma joia na coroa do marido. 

Estes jargões são repetidos a todo tempo nas igrejas. Líderes midiáticas pregam todos os dias a milhares de mulheres como elas devem cumprir o papel de esposas. Desde consentir sexo toda vez que o marido deseja à rejeição ao feminismo.

Esta violência não se demonstra apenas de forma física ou sexual: temos as violências psicológicas, patrimoniais, morais, dentre outras. E isso faz com que mulheres se sintam envergonhadas de admitir que estão em relacionamentos abusivos – em um imaginário religioso evangélico, isto significa falhar diante da missão divina que lhes cabe. 

Há sinais que podem nos ajudar a identificar uma mulher em situação de violência nas igrejas:

1- desaparecer dos cultos e voltar 20 dias ou 1 mês – pode ser sinal de que esta mulher está esperando as marcas de violência sumirem para poder voltar ao convívio social;

2- não fazer nada sem a permissão do marido e, ficar angustiada ou ir embora antes se alguma atividade da igreja dura um pouco mais;

3- dificilmente aceitar a realização de algum culto ou visita em sua casa;

4- não falar de seus maridos nos encontros de mulheres ou em reuniões de oração. Quando falam, muitas pedem oração afirmando que seus maridos são difíceis, mas nunca dizem o que de fato acontece nos seus lares;

5- se o marido exercer liderança na igreja, demonstrar extrema submissão e não manifestar opinião.

Evidentemente, pode haver mulheres que tenham outros comportamentos frente a situações de violência, mas a ausência nos cultos acaba sendo muito comum entre mulheres evangélicas, porque a vergonha é constante nestes casos. 

É necessário salientar que as lideranças religiosas têm papel fundamental no combate à violência doméstica. Por isso é preciso que elas atentem para posturas imprescindíveis para o acompanhamento das mulheres:

É preciso que as lideranças acolham mulheres que se queixam de relacionamentos abusivos, mesmo que sejam violências verbais. Este tipo de violência pode ter uma escalada para a violência física e até para um possível feminicídio. 

É imperativo que lideranças JAMAIS peçam para uma mulher que tem um relacionamento abusivo orar mais. Isto trará mais sentimento de culpa para essa mulher, como se a falta de fé fosse o motivo para ela sofrer violência. 

Se uma mulher sofre violência doméstica lideranças devem auxiliá-la na denúncia e buscar por uma rede de apoio para que ela saia do lar violento, consiga abrigo, alimentação e condições dignas para ela e seus filhos. Lembremos que violência contra a mulher é crime e quem se cala diante disto, é cúmplice. Para que mulheres admitam a situação e busquem ajuda para sair deste ambiente violento, se faz necessário um longo caminho de conscientização e de trabalho de autoestima. Portanto, é necessário que as lideranças religiosas tratem do tema em suas comunidades de fé. 

Infelizmente, mulheres que denunciam maridos violentos, ou abusivos, acabam sendo isoladas nas comunidades, mal-vistas e, muitas vezes, deixam de participar das expressões de comunhão. Isto ainda desencoraja que outras mulheres busquem ajuda. Portanto temos que superar este comportamento no meio evangélico. 

Afinal de contas, somos todas imagem e semelhança de Deus, e se uma mulher sofre violência, é a própria imagem e semelhança de Deus que sofre violência; é o próprio templo do Espírito Santo de Deus que está sendo violentado. 

Por fim, faço um chamado às organizações de mulheres de todas as igrejas: tratem destes temas em seus grupos de estudos e oração. É possível que tenhamos irmãs que são violentadas dentro de casa e nós não sabemos, porque não acreditamos que isso possa acontecer dentro de nossas igrejas, mas, infelizmente, isto ocorre o tempo todo. A violência contra a mulher é a verdadeira ameaça às famílias, pois não há amor e felicidade, onde há violência! 

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