Diálogos da Fé

Blog dedicado à discussão de assuntos do momento sob a ótica de diferentes crenças e religiões

Diálogos da Fé

A resistência religiosa nos 60 anos do golpe militar no Brasil

Em 5 de abril próximo, acontecerá, na Cinelândia, no Centro do Rio, um ato público que recordará a resistência religiosa nos 60 anos do golpe militar no Brasil

Foto: Arquivo Nacional/ Correio da Manhã
Apoie Siga-nos no

Em 5 de abril próximo, acontecerá, na Cinelândia, no Centro do Rio, um ato público que recordará a resistência religiosa nos 60 anos do golpe militar no Brasil (31 de março de 1964). O ato, aberto ao público, é promovido por onze organizações não-governamentais e coletivos. 

Haverá uma concentração com ato simbólico, nas escadarias da Câmara de Vereadores (Praça Floriano, Centro), às 17h30, seguida de caminhada para a Sala de Sessões do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF, sede do antigo Supremo Tribunal Federal, quando a cidade era a capital do país), onde serão realizados os debates, às 19h.

Também será lembrada a resistência de grupos e lideranças religiosas à ditadura que durou 21 anos, entre cristãos, católicos e evangélicos, tradições de matrizes africana e indígena. O encontro será também oportunidade de enfatizar que esta resistência permanece ativa, diante das práticas repressivas e persecutórias que sobrevivem entre instituições do Estado. 

Os grupos organizadores, com o apoio de igrejas, coletivos e mandatos parlamentares com identidade religiosa, produziram a seguinte carta-manifesto, que está aberta para receber apoios de indivíduos e de outras organizações e coletivos, por meio deste link.

Confira:

VIOLÊNCIAS E ABUSOS DO PODER, NUNCA MAIS!

A resistência religiosa nos 60 anos do golpe militar no Brasil

sessenta anos o Brasil sofreu um profundo golpe civil-militar, que resultou em um regime ditatorial, com violências diversas contra críticos e opositores. Prisões arbitrárias, sequestros, torturas, desaparecimentos, execuções, assassinatos, censura, entre outras violações praticadas ao longo de 21 anos, cujas drásticas implicações perduram até hoje.

O golpe militar de 1964 teve apoio de poderosos grupos econômicos e midiáticos, nacionais e estrangeiros, e adesão de segmentos obscurantistas da sociedade, incluindo setores das igrejas e de outras religiões. Esta é uma memória que não pode ser apagada, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça!

Por esta razão nos reunimos nesta articulação de organizações, coletivos, movimentos e mandatos parlamentares populares, com identidade religiosa. O intuito é dialogar com a sociedade sobre as memórias da ditadura e suas violações de direitos, bem como as implicações nefastas ainda presentes. Além disso, considerando o nosso perfil e experiência, ressaltar o lugar das igrejas e das religiões em geral na resistência à violência e aos abusos de poder.

É também de fundamental importância pensar sobre a relação da ditadura militar com questões estruturais de violências que se mantêm e se reproduzem ainda hoje, decorrentes dos processos repressivos da época. Neste sentido, também julgamos necessário e oportuno o diálogo com as juventudes, tanto as das igrejas quanto a da sociedade mais ampla, para compartilhar as experiências das décadas anteriores, ouvir e aprender conjuntamente a discernir os sinais e demandas que a conjuntura atual nos apresenta.

Com esta iniciativa, desejamos contribuir para o fortalecimento da democracia, especialmente tendo em mente as instabilidades vividas no país a partir de 2016, com o golpe que destituiu um governo democraticamente estabelecido, agravadas posteriormente com a ascensão da extrema direita ao poder da República. 

Para isso, é importante também ampliar as reflexões sobre as relações entre religião e política, que se justificam dado o destacado lugar das religiões na dinâmica social brasileira e as lutas contra os fundamentalismos e neoconservadorismos religiosos e políticos.

Como se sabe, o governo do Brasil, no nefasto período de 2019 a 2022, promoveu explicitamente o esquecimento dos crimes da ditadura militar e a revisão falseada da história do país. Esperava-se esconder feridas nunca saradas e cada vez mais latejantes – relacionadas aos crimes do Estado de exceção como torturas, desaparecimentos e assassinatos – e minorar o lugar e o protagonismo dos movimentos sociais e de setores democráticos e suas conquistas históricas em prol da democracia em seu sentido amplo.

Lamentavelmente, setores significativos das igrejas brasileiras exerceram um papel nesse processo de apagamento da história e de reforço do obscurantismo e das culturas de violência e de ódio. E o mais grave: estes grupos instrumentalizam a religião para a promoção de práticas excludentes, abusivas e discriminatórias e relativizam situações graves como a tortura, disseminação do ódio e a eliminação de adversários políticos.

No entanto, há também significativa movimentação de grupos dos mais variados ramos religiosos, incluindo cristãos evangélicos e católicos, que, sensibilizados por sua fé, se posicionam pela justiça, pela paz e pela garantia de direitos e democracia. ​Entendemos ser importantíssimo possibilitar às instituições e movimentos que lutam por direitos humanos e à população em geral, espaços de reflexão e de ação que possam iluminar o futuro próximo.

Considerando o acima exposto, que os segmentos democráticos da sociedade brasileira, com os quais nos identificamos e queremos somar forças, possam nesta relevante oportunidade:

– Marcar criticamente, durante este 2024, os 60 anos do golpe militar no Brasil com ações e reflexões sobre a violência e o desrespeito aos direitos humanos, que não acabou, sobretudo para as populações pobres, pretas e periféricas.

 – Reunir e articular setores democráticos, lideranças e grupos sociais, comprometidos com a defesa dos direitos humanos e da cidadania, para pensar e construir formas de ação contra os autoritarismos, que reforcem direitos e democracia no Brasil, inclusive nos espaços religiosos.

Possibilitar formação e avivamento da memória das vítimas e dos resistentes das igrejas, das religiões como um todo e de outros setores sociais, sobre os atos de exceção e violação de direitos perpetrados durante os 21 anos de ditadura militar no país.

– Divulgar, promover e valorizar o relatório da Comissão Nacional da Verdade, apresentado em 2014, em especial as recomendações que ele oferece para políticas públicas de reparação histórica e ações educativas da sociedade civil.

Socializar um conjunto de memórias, principalmente para as novas gerações, inclusive de movimentos sociais e eclesiais, e realizar um balanço do que significam as marcas violentas do golpe militar de 1964 para o contexto atual. Isto, em especial, para grupos que vivem em situação de vulnerabilidade como os povos tradicionais, mulheres, população negra e grupos subalternizados, e assim construir caminhos para a manutenção e o fortalecimento da democracia em nosso país.

Queremos lembrar o passado, inspirar o presente e projetar um futuro democrático, aqui e agora, com justiça e paz.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo