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São Paulo precisa de plano em defesa da vida, não de mudança no Plano Diretor

‘Além de indefesa frente a doença, a população sofre com a recessão econômica e a crise social’

Ladeira Porto Geral esquina com rua 25 de março, maior shopping aberto do mundo, com grande aglomeração de pessoas em 2021. (Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas) Ladeira Porto Geral esquina com rua 25 de março, maior shopping aberto do mundo, com grande aglomeração de pessoas. (Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas)
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No dia 26 de maio de 2021 completaram-se 460 dias desde que foi registrado o primeiro caso de Covid-19 no município de São Paulo. De lá para cá, 772.503 pessoas foram contaminadas, sendo que mais de 30 mil morreram. Um ano e três meses da maior tragédia que já se abateu sobre a cidade. E que está muito longe de acabar, conforme mostra o gráfico abaixo.

Este gráfico, que apresenta a média móvel diária dos casos de Covid-19 registrados pela Fundação Seade, órgão pertencente ao Governo do Estado de São Paulo, mostra que a pandemia teve uma primeira onda que se iniciou no fim de fevereiro de 2020, atingiu um pico de 3.200 casos diários no meio de agosto e depois caiu até 650 casos na metade do mês de outubro.

Logo em seguida, veio a segunda onda, saindo desse patamar e atingindo 4.500 casos diários no início de abril, quando voltou a cair até 2.000 casos no início de maio.

Na segunda onda, os hospitais públicos e privados da cidade atingiram sua capacidade máxima de atendimento e houve pacientes que não encontraram vaga em UTI. No início de maio inicia-se provavelmente uma terceira onda (ver círculo vermelho no gráfico), que parte de um patamar muito maior do que o das duas primeiras, com os hospitais próximos da sua capacidade, e que pode portanto revelar-se ainda mais mortal. Onda que a vacinação, em ritmo extremamente lento por irresponsabilidade do governo federal, não tem conseguido atenuar.

Além de indefesa frente a doença, a população sofre com a recessão econômica e a crise social que se aprofundaram. O desemprego explodiu, as oportunidades de trabalho informal rarearam. Bares, restaurantes, creches privadas, pequenas empresas de comércio e serviços fecharam as portas. Incapazes de pagar o aluguel, muitas famílias se juntaram aos mais de 30.000 moradores de rua.

E o que fez a prefeitura da maior cidade do Brasil frente a esse cenário que já dura 15 meses? Implantou o auxílio monetário municipal para os desempregados? Adiou o pagamento dos impostos municipais e abriu linhas de crédito subsidiado para as micro, pequenas e médias empresas? Distribuiu máscaras de qualidade nas estações de metro e terminais de ônibus? Obrigou as empresas de ônibus a colocar toda sua frota na rua, para diminuir a lotação dos veículos? Manteve funcionando os hospitais de campanha? Obrigou a Sabesp a manter o abastecimento de água constante, impedindo o corte sistemático do fornecimento nas favelas e bairros das periferias? Acolheu os moradores de rua em hotéis e em repúblicas? Abriu restaurantes populares? Abriu banheiros públicos para atender a quem não tem casa? Distribuiu cestas básicas nas favelas e bairros populares? Priorizou a vacinação nos bairros periféricos, onde os índices de contaminação e mortes são maiores? A resposta para todas essas perguntas é não.

Indiferente a essa tragédia e à sua responsabilidade com a população da cidade, a prefeitura iniciou a revisão do Plano Diretor Estratégico e colocou na Câmara Municipal projetos de lei para rever a Operação Urbana Água Branca, além de criar os projetos de intervenção urbana, no Centro, na Vila Leopoldina, no Jurubatuba e no Tamanduateí.

Todos os projetos de lei que já estão na Câmara propõe mudanças que beneficiam o capital imobiliário, diminuindo a contrapartida que os empreendimentos novos pagam para o Fundo de Desenvolvimento Urbano – Fundurb. Consequentemente, isso diminui a capacidade da prefeitura implantar programas emergenciais de habitação e mobilidade urbana. Por outro lado, tais ações beneficiam muito o capital imobiliário, cuja atividade não para de crescer na cidade desde 2018.

De fato, ao se analisar os dados da prefeitura, observa-se que a arrecadação média da outorga onerosa do direito de construir – contribuição paga pela construção dos grandes edifícios – passou de valores da ordem de 20 milhões de reais mensais nos anos de 2012 a 2017, para 50/60 milhões mensais entre 2019 e 2021, mostrando que a indústria imobiliária não foi afetada em nada pela crise sanitária. Aliás, essa observação vem no mesmo sentido das notícias que dão conta que os mais ricos aumentaram seu patrimônio durante a pandemia.

Os projetos de lei que já estão na Câmara revelam o que a prefeitura pretende com a revisão do Plano Diretor neste momento em que não se pode realizar audiências públicas presenciais: reduzir a participação da sociedade e eliminar a resistência à alteração dos dispositivos legais que controlam a produção imobiliária e geram recursos para os programas sociais.

Contra esse processo, em que o debate está restrito apenas a entidades escolhidas pela própria prefeitura e é orientado por um conselho formado exclusivamente por representantes dos interesses imobiliários, foi lançada a Frente São Paulo pela Vida. São 472 entidades da sociedade que se uniram para dizer não à alteração do Plano Diretor sem participação social e propor a união de São Paulo – prefeitura, câmara e sociedade civil – em torno do que realmente importa: um plano emergencial em defesa da vida.

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