Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

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‘Vinicius de Moraes era apaixonado pela capacidade do samba de cantar a dor’, diz a neta Mariana

Quase 30 anos depois de se tornar cantora, Mariana de Moraes lança um álbum sobre a obra do inesquecível compositor

Foto: Reprodução
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Mariana de Moraes recebeu um conselho quando subiu ao palco para cantar pela primeira vez, aos 26 anos: “Até que você seja reconhecida como uma pessoa que tem um dom, talento para cantar, não cante nada de Vinicius, porque vai ser uma coisa oportunista. Mesmo que seu sentimento não seja oportunista, não faça”.

As palavras vieram da tia, a cineasta Susana de Moraes, filha mais velha de Vinicius de Moraes. Mariana entendeu o recado e inseriu apenas três canções do poeta em quatro discos na carreira. Mantinha apenas no repertório de shows as composições do avô.

Mas, em 2018, ela se convenceu de que já era hora de gravar Vinicius, depois de a cantora Miúcha, irmã de Chico Buarque e falecida naquele ano, instigá-la. O projeto foi, então, alinhado, mas vieram a pandemia e, em 2022, a morte do pai, Pedro de Moraes (segundo filho de Vinicius).

Passada a tormenta, em outubro, mês a marcar os 110 anos de nascimento do poeta, saiu o álbum Vinicius de Mariana (Selo Sesc), o quinto disco da cantora, desta vez só com canções do avô.

A foto da capa do álbum, com a menina Mariana no colo de Vinicius, foi feita em um hotel em Paris, no fim dos 1970. Ela vivia com a mãe, a atriz Vera Valdez, no exílio. Vinicius passava mais uma vez na capital francesa para uma temporada de shows.

Mariana se lembra de ter recebido de presente naquela mesma época um gravador, como incentivo do avô para registrar sua “linda voz”. “O Vinicius, além de um talento extraordinário e da dedicação à poesia e à música, era um grande generoso”, diz.

Sobre o álbum, elaborado durante a pandemia, ela conta que não queria fazer um disco triste, apesar das mortes pela Covid-19 e do descalabro do governo Bolsonaro.

“Eu me relaciono muito com o aqui e o agora”, diz. “Eu senti que estava deprimida. Havia um governo terrível, havia um luto imenso, havia as angústias pessoais de cada um no seu isolamento.”

Optou, então, por resgatar da obra de Vinicius algumas composições de referência afro nas quais o luto, a luta e as celebrações são realizados com danças. “O Vinicius era apaixonado pela capacidade que o samba tem de cantar suas dores, dançando e celebrando a vida”, afirma.

O álbum Vinicius de Mariana tem arranjos de João Donato e Guto Wirtti e participação de Chico Buarque, Mart’nália, Zé Manoel, Jussara Silveira, Carlinhos Sete Cordas, Robertinho Silva, Marcelo Jeneci, entre outros.

A cantora exalta o fato de ter conseguido que João Donato, que faleceria em julho deste ano, fizesse alguns arranjos para o disco. “Ele topou o projeto porque amava o Vinicius”, conta.

O repertório do disco é marcado por afro-sambas. Canto de Pedra Preta (Baden Powell, Vinicius de Moraes) e Canto de Xangô (Baden Powell, Vinicius de Moraes) abrem o trabalho.

A terceira, Maria Moita (Carlos Lyra, Vinicius de Moraes), Mariana considera quase um afro-samba.

Tristeza e Solidão (Baden Powell, Vinicius de Moraes) é, na avaliação da cantora, a mais bonita da dupla e a menos conhecida dos históricos afro-sambas compostos pelos dois.

Na sequência do álbum, Arrastão (Edu Lobo, Vinicius de Moraes). “Coloquei esta porque fala de orixás, da prosperidade, da alegria”, conta.

Quando a Noite me Entende (Antônio Maria, Vinicius de Moraes) é uma canção pouco conhecida de Vinicius, e a cantora afirma tê-la incluído no disco porque Zé Celso (Mariana foi atriz do Teatro Oficina) e Miúcha sempre a alertavam de que quando fosse gravar o avô, não esquecesse de inserir essa composição.

O disco segue com Só me Fez Bem (Edu Lobo, Vinicius de Moraes) e Desalento (Chico Buarque, Vinicius de Moraes), uma escolha do próprio Chico.

A política Marcha da Quarta-Feira de Cinzas (Carlos Lyra, Vinicius de Moraes) é uma referência ao momento sombrio vivido no período do antigo governo.

Onde Anda Você (Hermano Silva, Vinicius de Moraes) e Eu Não Existo Sem Você (Tom Jobim, Vinicius de Moraes), uma homenagem à filha, são a antepenúltima e a penúltima faixas.

O álbum encerra com Mundo Melhor, composição de Pixinguinha e Vinicius de Moraes, pilares da música brasileira, assim como Tom Jobim.

Assista à entrevista de Mariana de Moraes a CartaCapital:

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