Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

Augusto Diniz | Música brasileira

João do Vale remete em ‘Carcará’ o sertanejo forte e o ideal de liberdade

Cantor e produtor Gabriel Vale, neto do maranhense, regravou a emblemática música que lembra o início da luta contra a ditadura

João do Vale. Foto: Divulgação/reprodução
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João do Vale nasceu em Pedreiras, no Maranhão, no dia 11 de outubro de 1934. Agora em 2022, na data, o Google chegou a homenageá-lo em um Doodle, versão modificada do logotipo da plataforma. De família pobre, passou a infância e parte da adolescência no interior maranhense. 

Foi para capital do estado e depois para o Rio de janeiro – nesse trajeto, fez de tudo para sobreviver. Com composições debaixo do braço, foi abrindo espaço na música, sendo gravado por artistas conhecidos da época, até estrear o musical Opinião, ao lado de Nara Leão (depois Maria Bethânia) e Zé Kéti, primeiro manifesto musical contra o regime militar já em vigência, em 1964.

O roteiro do espetáculo contava com algumas de suas músicas, mas foi Carcará (composta com José Cândido) que mais repercutiu. A letra é a descrição da luta pela vida, encarnada numa ave de rapina típica do Nordeste.

Carcará/ Come inté cobra queimada/ Mas quando chega o tempo da invernada/ No sertão não tem mais roça queimada/ Carcará mesmo assim não passa fome…” e depois segue: “Carcará/ Pega, mata e come/ Carcará/ Não vai morrer de fome…”

O maranhense morreu em 1996, mas deixou dois discos solos gravados. Pela representação sublime em sua obra do sertanejo forte e do ideal de luta, ainda que metaforicamente, é colocado ao lado de Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro como o símbolo maior da arte musical nordestina. Mesmo semianalfabeto, compôs mais de 400 canções.

O cantor e produtor Gabriel Vale, neto de João do Vale, fez uma releitura contemporânea de Carcará, disponível nas plataformas digitais. O single vai desaguar em um EP a ser lançado por Gabriel em janeiro, com duas releituras de músicas de João do Vale (uma é Carcará) e duas autorais.

“É desafiador regravar uma canção grande e eternizada por grandes intérpretes da música brasileira”, diz Gabriel. “Escolhemos gravar Carcará para homenagear o João, pela canção ser um símbolo de resistência e luta no período da ditadura militar. É necessário resgatá-la pensando o momento político atual do Brasil, de crescimento da fome, das desigualdades e do autoritarismo. É a nossa forma de reagir a esses tempos estranhos”.

Gabriel Vale, nascido e criado em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, preserva e divulga a obra do avô desde a adolescência. O músico palestra sobre a história e a obra de João do Vale em escolas e universidades.

“Meu avô me conheceu quando eu tinha meses de vida. Ele faleceu no mesmo ano que nasci (1996)”, lembra. Gabriel, hoje com pós-graduação em gestão empresarial, não vive da arte e cita a realidade de milhares de artistas brasileiros da dificuldade de sobreviver da música – como João do Vale, que morreu pobre assim como nasceu, mesmo deixando um rico legado. 

A emblemática música Cárcara foi regravada por Gabriel, acompanhado por um time de bons músicos: Adelson Viana (sanfona), Alexandre Ito Primo (contrabaixo acústico), Carlos Malta (sopro), Robertinho Silva (cajon), Roberta Ribeiro e Walter Fernandes (vocal) e Tuninho Villas (violão, sintetizadores, samples e produção). A releitura de Carcará sai pelo selo Casa com a Música em parceria com o Sindicato Nacional dos Compositores Musicais.

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