Augusto Diniz | Música brasileira

Jornalista há 25 anos, Augusto Diniz foi produtor musical e escreve sobre música desde 2014.

Augusto Diniz | Música brasileira

É no Morro do Vidigal que se celebra Sérgio Ricardo e seus 90 anos

Músico e cineasta se estabeleceu no local na década de 1970, permanecendo por lá até quase a sua morte, em 2020

Foto: Acervo Sérgio Ricardo
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Depois de lançar o samba de sua autoria, Zelão, em 1960, o inquieto Sérgio Ricardo foi encorajado a transformar a letra da canção em filme. Na segunda metade dos anos 1970, o músico e cineasta compra um apartamento e um barraco em uma das áreas mais pobres do Morro do Vidigal, no Rio de Janeiro, para escrever o roteiro tendo como o ponto de partida o personagem de sua composição.

Zelão é um personagem que perdeu o barraco numa tempestade. A música tem hoje mais de 70 regravações. O filme, no fim, acabou não saindo, mas na ocasião ele se envolveu com os moradores numa luta contra a remoção para instalação de um empreendimento.

Usando de seu conhecimento, a ação deu certo. Por conta disso, acabou se ligando fortemente à comunidade. Sérgio Ricardo passou a fazer sua diversificada produção artística no Vidigal, tendo muitas vezes o local como inspiração. O seu conhecido longa-metragem Bandeira de Retalhos (2018) é centrado na história da remoção que se envolveu no lugar.

Em 2019, após sofrer fratura no fêmur, contra a sua vontade, teve que deixar o Morro do Vidigal devido à dificuldade de caminhar pelas escadarias do bairro. No ano seguinte, no mês de junho, veio a falecer aos 88 anos. Agora, em 2022, a família prepara alguns eventos para comemorar os seus 90 anos de nascimento.

“Um artista de uma obra tão vasta. A obra do Sérgio Ricardo pertence ao povo. Que era popular, mas foi arrancada. Na ditadura, ele se opôs muito ao governo e foi censurado. Esse resgate da memória é como se fosse uma anistia. Um direito de todos terem acesso à sua arte”, diz seu filho, o também músico João Gurgel.

“Além de cantor e compositor renomado, é uma referência no cinema, nas artes plásticas, na literatura. É uma pessoa injustiçada pelo sistema. Seus 90 anos não podem passar em branco. Quero fazer o máximo que puder para divulga a obra dele”.

Conversação de Paz

João Gurgel nasceu no Vidigal. O seu contato com a arte foi aos 10 anos com o grupo Nós do Morro, antigo projeto cultural instalado no local. Dali teve contato próximo com a comunidade.

Há dois anos inaugurou o estúdio multimídia Vidigal, onde desenvolve seus trabalhos artísticos e para terceiros. Ele mora no apartamento onde também fica o estúdio, ambos herdados do pai, num conjunto de prédios no acesso ao complexo.

Ano passado, João Gurgel lançou o álbum Conversação de Paz – Um Tributo a Sérgio Ricardo. São sete releituras de emblemáticas canções do pai: Conversação de Paz, Emília, Cacumbú, Bate Palma, Folha de Papel, Bichos da Noite e Lá vem Pedra.

Agora, para comemorar os 90 anos de nascimento de Sérgio Ricardo, ele lança em formato de videoclipe as músicas gravadas. O primeiro já saiu e é de Cacumbú, canção de tom político característica de seu autor. O próximo clipe será da composição Bate Palma. O primeiro videoclipe, produzido pelo próprio João Gurgel, é uma animação. Outros deverão também ser em animação ou filmado no formato convencional de videoclipe.

Seguindo as comemorações, João e a irmã Marina Lutif irão recriar o show Cinema na Música de Sérgio Ricardo, que foi o último dele. O projeto conta com repertório de trilhas e trechos de filmes de Sérgio Ricardo.

No show-tributo que João Gurgel está programando de fazer neste ano, aproveitando para lançar o seu disco em homenagem ao pai, a proposta é ser o mais multimidiático possível, que é a representação maior de Sérgio Ricardo. No final do ano, deve ocorrer também um grande evento multimídia, em sua homenagem, com várias participações.

Está programada ainda a exposição física do acervo Sérgio Ricardo Memória Viva, além da regravação de músicas dele por novos artistas. O grupo Nós no Morro tem previsão de encenar uma peça do homenageado nos seus 90 anos de nascimento.

Sérgio Ricardo é um dos maiores multiartistas que este País teve. Ficou um tanto marcado por quebrar seu violão no palco e lançá-lo contra o público que o vaiava no Festival da Canção de 1967. Mas sua produção é vigorosa e vale acesso ao seu acervo virtual para conhecer seu vasto legado.

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