Justiça
Como o Senado recebeu a decisão de Gilmar que dificulta impeachment no STF
O Congresso avalia retaliações e teme o avanço da ‘judicialização’ sobre competências legislativas
A decisão liminar de Gilmar Mendes que restringiu à Procuradoria-Geral da República a prerrogativa de apresentar pedidos de impeachment contra ministros do STF caiu no Congresso Nacional como um “terremoto”. O movimento, interpretado por senadores como uma intervenção na arquitetura constitucional, desencadeou um raro consenso entre alas ideológicas distintas: elas sentiram que seu espaço de poder se reduziu.
Nos bastidores, o sentimento predominante entre senadores foi descrito como “surpresa irritada”. Eles relatam que a decisão surgiu em um momento de alta tensão entre Legislativo e Judiciário, quando o Senado buscava afirmar protagonismo diante da sucessão no STF e da negociação interna sobre indicações para a Corte. Para lideranças, Gilmar mexeu em uma engrenagem sensível justamente quando a Casa percebia ter mais condições de influenciar o rumo do tribunal.
“É a PEC da Blindagem deles”, provocou reservadamente um senador em contato com CartaCapital. A leitura imediata entre congressistas é que a liminar muda não apenas o procedimento do impeachment, mas a lógica de freios e contrapesos entre os Poderes. Para senadores, o movimento representa um “encolhimento” do papel da Casa Alta, que passa a depender do crivo de um procurador-geral – figura que, além de nomeada pelo presidente da República, mantém diálogo constante com o próprio STF.
A irritação não se limitou à ala bolsonarista. Integrantes do Centrão também avaliaram que a mudança desidrata competências históricas do Senado.
Congressistas da direita, porém, reagiram com mais estridência. Desde o início da legislatura, esse grupo trabalha com o horizonte de conquistar maioria suficiente no Senado para submeter ministros a processos de impeachment. A decisão de Gilmar é vista por esse grupo como o fechamento de uma porta. Sem o protagonismo do Senado, a chance de confrontar ministros como Alexandre de Moraes, alvo preferencial, fica praticamente inviável.
No centro e na esquerda, a reação foi menos barulhenta. Aliados do governo enxergaram a decisão com ambivalência. Por um lado, avaliam que o aumento do quórum e a exigência de filtro do PGR reduzem o risco de aventuras políticas contra o STF. Por outro, interlocutores do Palácio do Planalto reconhecem que a liminar pode ser interpretada como um gesto de desconfiança do Judiciário em relação ao Legislativo, no momento em que a articulação para aprovar nomes para o Supremo é sensível.
Já há discussões, inclusive, para reagir à decisão de Gilmar — de propostas de emenda à Constituição até uma pressão política aberta sobre o STF. Existe, contudo, o reconhecimento silencioso de que pouco pode ser feito até o plenário decidir se confirma ou revoga a liminar.
O acúmulo de tensões cria uma incerteza sobre a postura do plenário da Corte e aumenta a temperatura entre instituições que, nos últimos anos, se acostumaram a conviver em estado permanente de desconfiança.
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