Justiça

Cacique avá-guarani que tomou fuzil da Força Nacional no Paraná é condenado a 15 anos de prisão

A sentença reforça tensão no oeste do estado, onde demarcação inconclusa opõe indígenas a prefeituras e donos de propriedades rurais

Cacique avá-guarani que tomou fuzil da Força Nacional no Paraná é condenado a 15 anos de prisão
Cacique avá-guarani que tomou fuzil da Força Nacional no Paraná é condenado a 15 anos de prisão
Indígenas Avá-Guarani cercam agentes da Força Nacional munidos de arcos e flechas. Foto: reprodução
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A Justiça Federal do Paraná condenou um cacique do povo Avá-Guarani a 15 anos e 10 meses de prisão em regime fechado por tentativa de latrocínio contra agentes da Força Nacional de Segurança Pública. O episódio ocorreu em 6 de setembro de 2024, durante o patrulhamento de um território ocupado pelos indígenas na cidade de Terra Roxa, no oeste do estado.

Segundo o Ministério Público Federal, os policiais tentavam negociar a retirada dos membros dos manifestantes quando aproximadamente 30 indígenas liderados pelo réu, munidos de arcos e flechas, ameaçaram os agentes e conseguiram subtrair o fuzil de um deles. Na sequência, ainda conforme a denúncia do MPF, o indígena teria tentando disparar contra dois dos policiais, mas não conseguir destravar o equipamento.

Vídeos feitos por moradores mostram o momento em que os indígenas cercam viaturas e agentes em uma estrada rural. Instantes depois, ocorre a tomada do armamento. O Ministério da Justiça afirmou à época que os policiais optaram por não reagir para evitar um confronto mais grave, permitindo que o grupo recuasse levando o fuzil.

A defesa do cacique argumentou que a acusação configurava um “crime impossível”, já que a arma não chegou a disparar. A tese, porém, foi rejeitada pelo juiz federal Gustavo Chies Cignachi, que ressaltou em sua sentença que a tentativa de homicídio apenas não se consumou por “circunstâncias alheias à vontade do réu”. Além da condenação, o magistrado determinou que o MPF e a Polícia Federal investiguem suspeitas de falso testemunho por parte de três pessoas que depuseram em defesa do indígena. O cacique responde em liberdade e ainda pode recorrer da decisão.

Entenda o conflito

A disputa entre indígenas e sitiantes em Terra Roxa acumula episódios de hostilidades e violência. A disputa envolve a reivindicação pela demarcação de 24 mil hectares que abrangem 165 propriedades rurais nos municípios de Terra Roxa, Altônia e Guaíra — este último com parte da área em limite urbano.

Parte do território foi delimitado e identificado pela Funai em 2018, segue pendente da demarcação, pois os trabalhos foram paralisados durante o governo de Jair Bolsonaro.

A posse Lula, em 2023, reacendeu expectativas de retomada da demarcação, mas uma ação movida pelas prefeituras de Terra Roxa e Guaíra, apoiada pela Federação da Agricultura do Paraná, a FAEP, manteve a suspensão.

No ano passado, a tensão escalou depois que indígenas ocuparam parte da área em disputa, o que provocou reação de ruralistas. Relatos apontam para cercos armados e ataques contra a Aldeia Yvy Okaju, incluindo restrições de acesso a estradas, alimentos e serviços de saúde. O governo federal chegou a enviar tropas da Força Nacional em diferentes momentos para tentar conter a violência.

Entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025, a escalada resultou em ataques com armas de fogo contra a comunidade, deixando vários feridos, entre eles uma criança indígena de quatro anos.

A reivindicação remonta à década de 80, quando a construção da Usina de Itaipu alagou áreas tradicionalmente ocupadas pelos Avá-Guarani. Neste ano, a hidrelétrica fechou acordo judicial para destinar 225 milhões de reais à compra de pelo menos 3 mil hectares em benefício das comunidades, mas a aquisição ainda não se concretizou.

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