Economia
Congresso derrota o governo e derruba veto de Lula à desoneração da folha
Benefício às empresas pode gerar impacto de 20 bilhões de reais para as contas públicas, segundo projeções do governo
O Congresso Nacional derrubou o veto do presidente Lula (PT) ao projeto que prorroga até 2027 a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia. Foram 60 senadores e 378 deputados contrários ao veto, contra 13 senadores e 78 deputados favoráveis à manutenção do veto.
A desoneração é um benefício fiscal concedido a empresas que, supostamente, têm alta empregabilidade no País.
O incentivo é baseado na justificativa de que a desoneração gera empregos e que a sua suspensão pode provocar demissões em massa. A política foi estabelecida no governo de Dilma Rousseff (PT).
Na prática, a desoneração permite que os empresários passem a pagar uma alíquota de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Sem essa política, os impostos seriam equivalentes a 20% da folha de pagamentos.
Conforme mostrou CartaCapital, a eficiência da desoneração para a geração de empregos divide especialistas. Alguns creem que a política incentiva a empregabilidade, mas outros avaliam que ela não gerou efeitos.
Recentemente, um estudo do pesquisador Marcos Hecksher, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, sustentou que as empresas beneficiadas pela desoneração não fazem parte dos setores que mais empregam no Brasil. As áreas que recebem os incentivos são:
- Calçados;
- Call center;
- Comunicação;
- Confecção e vestuário;
- Construção civil;
- Construção e obras de infraestrutura;
- Couro;
- Fabricação de veículos e carroçarias;
- Máquinas e equipamentos;
- Proteína animal;
- Têxtil;
- Tecnologia da Informação;
- Tecnologia de Comunicação;
- Projeto de circuitos integrados;
- Transporte metroferroviário de passageiros;
- Transporte rodoviário coletivo;
- Transporte rodoviário de cargas.
Ao vetar a proposta, Lula afirmou que não poderia haver desoneração às empresas sem contrapartida para os trabalhadores. A decisão foi aconselhada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT).
O texto também reduz de 20% para 8% a contribuição de administrações municipais para o financiamento da Previdência Social dos funcionários públicos municipais. A regra vigora para municípios com até 142.633 habitantes, que totalizam cerca de três mil municípios, segundo projeções do Congresso.
Projeções apontam perda de 20 bilhões de reais para o governo com a medida. A derrubada do veto de Lula ocorre num momento em que o Ministério da Fazenda tenta ampliar a arrecadação de impostos para alcançar a meta fiscal de déficit zero em 2024, o que representaria total equilíbrio entre receitas e despesas.
Com a movimentação do Congresso para derrubar o veto de Lula, o governo se esforçou para dialogar por uma alternativa à desoneração. O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), afirmou que uma nova proposta seria apresentada ainda neste ano.
As negociações, no entanto, fracassaram. Segundo o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), Haddad informou, na quarta-feira 13, que não foi possível chegar a um acordo e que novas negociações ficam para o ano que vem.
“Vamos tratar assim: é uma derrota contabilizada. O governo está à disposição de continuar a debater com esses setores”, afirmou Randolfe, antes da votação.
Para revisar a desoneração, o governo pretende persistir na tese de que a política é inconstitucional, por suposto choque com regras aprovadas na reforma da Previdência. A base de Lula argumenta que, naquela ocasião, o Congresso havia incluído um dispositivo que não permitia mais benefícios ficais às empresas.
Questionado, o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), admitiu que o tema pode parar no Supremo Tribunal Federal.
“Não fiz uma avaliação profunda dessa tese, mas, em todas as instâncias, tanto do Senado, quanto da Câmara, afirmou-se a constitucionalidade do projeto da desoneração”, disse. “Obviamente, isso também pode estar sob o crivo do veto do presidente quanto do próprio Supremo Tribunal Federal, mas a nossa posição foi sobre não só a constitucionalidade, como a sua extrema conveniência para a economia do Brasil.”
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