Editorial
O eterno mestre
Internado no hospital, o melhor jogador de futebol do mundo e de todos os tempos já está fora de perigo


Mal voltei ao Brasil, em janeiro de 1960, minha primeira preocupação foi assistir ao jogo do Santos contra algum adversário que possivelmente seria o São Paulo. O Santos fez seis gols, dos quais quatro de Pelé e dois de Pepe, o fatal ponta-esquerda. Os gols de Pelé foram extraordinários na sua feitura: ele saiu entre a meia-lua da área santista e passou amplamente pela linha do meio-campo, deixando para trás quem haveria de marcá-lo. Foram quatro tentos praticamente iguais, assinalados por um jogador imbatível.
Uma loja na Rua Estados Unidos, no trecho que vai da Brigadeiro Luís Antônio à Avenida 9 de Julho, vendia o filme dos mil gols de Pelé e, a pedido de amigos e parentes italianos, mandei para a península meia dúzia para atender às solicitações. Pelé foi o maior jogador de futebol de todos os tempos e acaba de voltar ao seu quarto de hospital, da mesa de cirurgia, fora de perigo, o que me deixou satisfeito. Estive com ele duas vezes, uma delas ao almoçar na casa de um amigo comum. Afável e simpático, a despeito da incrível marca de gols, extraordinário butim que ele carregará para sempre.
“Ele é o atleta perfeito”, disse-me certa vez Sócrates. E acrescentou: “Há quem queira compará-lo a Maradona”. O genial argentino, na Itália, levou ao título nacional o time do Napoli, para justificar a escrita surgida à porta de vários cemitérios napolitanos: “Vocês não sabem o que perderam”. Tão genial, a ponto de ser capaz de fazer um gol com a mão, la mano de Diós, sem ser percebido. “Mas Pelé não precisou disso, foi o maior de todos e não se discute”, disse ainda Sócrates. De 1958 a 1970, com Pelé no comando, a seleção canarinho foi imbatível.
Os jornalistas brasileiros que estão no Catar são, antes de mais nada, torcedores fanáticos e a última que tive a desventura de ouvir da boca deles, mais de uma vez, é que Casemiro é o melhor do mundo. Trata-se de um jogador de boa qualidade, autor de um bonito gol insólito no seu currículo. Os nossos vanguardistas da pelota deveriam saber que há vários meio-campistas de grande qualidade, para enfeitar os gramados mundo afora, assim como há várias seleções habilitadas a derrotar o escrete brasileiro. Um pouco de comedimento é aconselhável, a bem de uma cobertura correta dos embates no Catar. •
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1237 DE CARTACAPITAL, EM 7 DE DEZEMBRO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “O eterno mestre “
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