Política

Decisão do Conama desencadeia onda de ações e manifestações de repúdio

Parlamentares e entidades afirmam que governo esvaziou papel regulador do Conselho para reduzir proteção ambiental

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Foto: Gilberto Soares/MMA
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Partidos e entidades formaram uma onda de ações e notas de protesto nesta segunda-feira 28, contra a decisão do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), sob o poder do ministro Ricardo Salles, de revogar resoluções que delimitavam faixas de proteção em manguezais e restingas.

 

Entre as normas revogadas, estão a resolução 302/2002, que estipula como Área de Proteção Permanente (APP) uma faixa de 30 metros ao redor de reservatórios artificiais – no caso de áreas urbanas – e de 100 metros  nas áreas rurais; e a resolução 303/2002, que previa uma faixa de 300 metros em áreas de restinga e de manguezais.

A bancada do PSOL na Câmara dos Deputados encaminhou um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) em que pede que o Congresso Nacional suspenda a decisão do Conama.

Como justificativa, a legenda alegou que há “grave retrocesso socioambiental” e que as medidas foram estabelecidas porque houve mudanças na composição do Conselho, que reduziram para 22 membros um quadro que contava com 100 titulares e 100 suplentes.

Líder do PSOL na Câmara, a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) afirmou a CartaCapital que a sigla também quer que um projeto de 2019 seja votado. O texto em questão revoga a intervenção que o governo federal fez no Conama, que reduziu a participação de ambientalistas e de membros da sociedade civil, mantendo grupos empresariais.

“Os cientistas avaliam que são as áreas de maior biodiversidade marinha. Acontece que o lobby de hotéis e a especulação imobiliária fizeram com que o Ministério do Meio Ambiente trabalhe para esses setores”, diz a parlamentar. “Enquanto o Conama atuar como uma correia de transmissão da política do Salles, os retrocessos no meio ambiente vão permanecer. Ele deveria ser um órgão regulador, e acaba se tornando uma extensão, um braço do ministro.”

Horas antes, o líder da Minoria na Câmara, deputado federal José Guimarães (PT-CE), também apresentou um PDL para sustar os efeitos da decisão do Conama. “Não vamos permitir a boiada passar”, escreveu em sua rede social.

Os petistas também protocolaram uma ação popular na 16ª Vara de Justiça Federal de Brasília, assinada pelos deputados Enio Verri (PT-PR), Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Nilto Tatto (PT-SP), para suspender a reunião do Conama.

“O Judiciário está aguardando mais quantos hectares de área verde e animais serem queimados para afastar Salles do governo?”, questionou Gleisi.

Presidente do Conselho do Meio Ambiente (CMA) no Senado, Fabiano Contarato (Rede-ES) anunciou que também vai entrar com ação popular na Justiça Federal para derrubar a medida do Conama.

“Os mangues são o berçário da biodiversidade costeira e sua degradação traz um alto impacto ambiental e social. O ministro do Meio Ambiente quer transformá-los em resorts de luxo e fazendas de carcinicultura”, acusou o senador, em nota.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) declarou na internet que seu partido acionará o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), para impedir as revogações das resoluções.

Marina Silva, principal quadro da Rede Sustentabilidade, também repudiou o ato do Conama e acusou o governo de esvaziar a representatividade e a competência técnica do órgão.

“O governo transformou o CONAMA em uma mera instância de homologação. O ato de simplesmente revogar as resoluções fundamentadas em estudos e dados científicos é um completo desvirtuamento de suas funções”, escreveu.

Entidades rechaçam decisão

Em coro, o Greenpeace Brasil chamou o ato de “revogaço” e disse que a fragilização do Conama pelo governo possibilitou que Salles avançasse com a desregulamentação da proteção ambiental.

Além das normas 302 e 303, o Greenpeace também critica a revogação da resolução 284/2001, porque “ficam extintos critérios federais para licenciamento ambiental de empreendimentos de irrigação, com o intuito de agilizar o processo de licenciamento, a pedido de parte do agronegócio”.

Outra suspensão apontada pela organização é a da resolução 264/1999, que vedava a queima de resíduos agrotóxicos, organoclorados e resíduos de serviços de saúde.

“Até hoje, esse material passava por um processo detalhado de tratamento e destinação. Com a sua revogação e a aprovação de uma nova resolução para disciplinar o licenciamento de fornos para queima de resíduos, tais proibições deixam de valer, e tudo poderá ser incinerado, permitindo a liberação para a atmosfera de substâncias tóxicas e prejudiciais à saúde”, afirmou o Greenpeace.

A Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema) publicou uma nota em que diz que “os servidores da área ambiental foram surpreendidos” com a convocação da reunião em que as decisões foram tomadas.

A entidade cobrou que o Congresso Nacional aprove outro Projeto de Decreto Legislativo, do deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), que suspenderia as mudanças no Conama em 2019. Além disso, pediu que “seja julgada imediatamente” a ação impetrada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no STF, que também se opõe às alterações na composição do órgão colegiado.

Outra manifestação de repúdio é de autoria da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa), que reúne promotores e procuradores da área ambiental.

Documento assinado pela presidente da Abrampa, Cristina Seixas Graça, apontou “vícios de ilegalidade”.

“O regime jurídico da proteção especial jamais poderia ser revogado ou reduzido, nem por força de lei, quanto mais por decisão administrativa de um colegiado com vício de representatividade da sociedade civil, e sem uma prova técnica cabal que justifique melhor forma de proteção dessas áreas, sob pena de ofensa ao preceito constitucional do artigo 225, parágrafo 1º, III, da Constituição da República Federativa do Brasil”, diz a manifestação.

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