Sociedade

MPL incorpora a periferia nos protestos

Movimento fortalece atividades em bairros como Tatuapé e Pirituba para incentivar atos em regiões afastadas do centro de São Paulo

Movimento Passe Livre organiza atividades em bairros pobres para fomentar o debate entre os que mais sofrem com a qualidade do transporte
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Enquanto o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), deposita suas fichas no passe livre estudantil para minimizar as manifestações contra o aumento da tarifa, o Movimento Passe Livre tem feito atividades públicas diárias nas principais regiões periféricas da cidade. Mais do que organizar passeatas no centro de São Paulo a cada sexta-feira, o grupo aposta neste ano em assembleias, oficina de materiais, discussões, aulas públicas e reuniões com moradores e movimentos de bairros para fortalecer o debate sobre transporte público e organizar pequenos atos simultâneos em regiões afastadas dos grandes centros.

A intenção é aumentar a pressão sobre o poder público. “O dia em que foi revertida a tarifa em 2013, uma quarta-feira, dia 19, foi um dia sem atos do Movimento Passe Livre. E foi um dia em que, pela manhã, o prefeito Fernando Haddad tinha dado entrevista em uma rádio dizendo, claramente, que não era possível reverter o aumento”, lembra Marcelo Hotimsky, um dos porta-vozes do grupo. “O que aconteceu do começou do dia ao fim da tarde, quando teve a revogação? Vários atos descentralizados, não do MPL, mas organizados na periferia. Teve ato na Ponte do Socorro, na Regis Bittencourt. A gente viu que foi nesse momento em que conseguimos reverter o aumento”, explica.

Desde a primeira manifestação convocada pelo MPL neste ano, que aconteceu na última sexta-feira 9, militantes organizam atividades paralelas em Pirituba, Tatuapé, Lapa, Grajaú, Campo Limpo, M’boi Mirim e Parelheiros. “Para derrubar a tarifa, não vão bastar grandes marchas no centro. Vai ser preciso que quem estiver indignado com o aumento se organize, se reúna em seus bairros para discutir os rumos da luta e planejar ações. Essa luta é de toda população”, diz uma mensagem do MPL feita para convocar ativistas nas redes sociais.

As regiões de atuação do movimento foram escolhidas a partir de locais onde o MPL já tem algum tipo de trabalho ou participou de mobilizações anteriores. No bairro do Tatuapé, por exemplo, a assembleia foi realizada na quarta-feira 14 em um espaço do Sindicato dos Metroviários, que tem apoiado o Passe Livre desde 2013. “Está correta a linha de entrar na periferia com tudo”, endossa o sindicalista Alexandre Roldan.

A ideia do MPL não é apenas fazer atividades em que o tema da revogação da tarifa seja debatido. O MPL também pretende marcar manifestações na periferia. Na assembleia em que realizou no Tatuapé, o grupo conseguiu definir um ato para ser realizado no bairro, na terça-feira 20. A ideia é bloquear uma das vias da região para chamar atenção dos trabalhadores da zona leste para a causa da tarifa zero e o aumento de três reais para três reais e cinquenta centavos. “Achamos que seria importante ter protestos na periferia. Nessas assembleias que temos feito têm surgido propostas de atos. Em alguns lugares há sugestão de ações menores, como panfletagem, mas também grandes atos como travamento de grandes vias”, enfatizou Hotimsky.

Além de aumentar a pressão sobre o poder público, a nova estratégia do MPL pode servir para evitar que suas manifestações sejam cooptadas por causas reacionárias, como ocorreu em 2013. Oficialmente, bloquear as pautas conservadoras não são um objetivo do grupo, mas o movimento reconhece que sua nova estratégia pode afastar o público estilo “gigante acordou” dos atos. “Não sei se é uma vacina (contra a direita), mas se as pessoas da periferia começarem a ter a discussão do transporte no cotidiano, isso pode até servir como vacina”, afirma Andreza Delgado, outra representante do MPL. Segundo ela, ao levar a pauta para a periferia, o movimento tenta fazer a população se apropriar da luta. “A discussão tem de ser pautada pelos trabalhadores”, afirma.

Para Pablo Ortellado, professor de Filosofia da Universidade de São Paulo e co-autor do livro Vinte centavos: a luta contra o aumento, a ida do MPL para a periferia pode ser fruto não de uma avaliação crítica sobre 2013, mas de uma necessidade de sobrevivência do movimento. “Acho que é um entendimento do MPL de que eles precisam se reorientar para um trabalho de base e de fortalecimento e organização das comunidades mais afetadas pelo aumento”, afirma.

Além da ida à periferia, outra novidade do MPL na linha de manter os atos sob controle é a adoção de “aulas públicas” antes de cada protesto. A intenção é evitar que outras pautas acabem desvirtuando a luta principal – a de revogação do aumento e a implantação da tarifa zero. “A faixa da frente é contra o aumento da tarifa. Se você veio protestar por qualquer outra pauta, o lugar não é esse”, afirma o porta-voz.

Atividades na periferia

A reportagem de CartaCapital acompanhou os militantes do MPL nas atividades em Pirituba, na terça-feira 13, e no Tatuapé. Uma das ideias que o grupo começou a colocar em prática nesta semana é o que chamam de Boca no Trombone. Trata-se de um microfone colocado na saída de terminais da cidade ou locais de grande circulação para que os usuários digam em via pública o que pensam do transporte público de São Paulo. A experiência em Pirituba, a primeira deste ano, rendeu muitas reclamações.

Movimento Passe Livre Assembleia do Movimento Passe Livre reúne mais de 90 pessoas no Tatuapé

“Uma pergunta para você, Geraldo Alckmin. É fácil para você pegar trem, ônibus quando está perto da eleição né? Você coloca seus guarda-costas, fecha tudo. Pega agora que nem eu: Horário de pico, sete horas, oito horas. Só isso que eu queria dizer. Pensa nisso”, desabafou o segurança Luiz Carlos, de 25 anos, que mora em Itaim Paulista e gasta, todos os dias, entre duas e três horas no transporte público.

Além disso, o grupo tem agendado oficinas de cartazes para que militantes e moradores da região pintem faixas e cartazes com o nome de seus bairros para serem exibidos nos atos que acontecem na região central da cidade, como o que está programa para esta sexta-feira 16, na avenida Paulista. “Uma das coisas que a Prefeitura fala para desmobilizar é que são só estudantes de classe média. É importante a gente ir para o centro marcando posição”, sugeriu Hotimsky na assembleia do Tatuapé.

Para o MPL, a participação dos bairros não centrais vai ampliar a legitimidade da pauta. “É a periferia que explica para nós que não adianta fazer corredor, ciclofaixa, colocar banner de que ‘Quem usa mais paga menos’ porque no bolso do trabalhar [o aumento] vai doer”, afirma Andreza Delgado, outra porta-voz do MPL.

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