Sociedade
MP pede arquivamento de 90% de inquéritos que apuram mortes cometidas por policiais
Em 2016, Ministérios Públicos das duas cidades apresentaram denúncias de apenas 30 casos, das 316 mortes por agentes de segurança


Um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgado pelo UOL nesta sexta-feira 12, aponta que os Ministérios Públicos do Rio de Janeiro e de São Paulo pediram o arquivamento de 90% das investigações que apuravam mortes cometidas por policiais no ano de 2016.
O levantamento mostrou que dos 139 casos de mortes por agentes de segurança pública na capital paulista, apenas dez se tornaram ações penais, 7,2% dos casos. Já na capital fluminense, dos 177, somente 11,3% das denúncias foram levadas à Justiça. Os demais casos foram arquivados.
O estudo também levantou a falta de celeridade dos Ministérios Públicos em caso de mortes envolvendo policiais.
Especialistas em segurança pública, ouvidos pelo portal, atribuem a omissão das promotorias à falta de qualidade das investigações policial. Para eles, a impunidade de agentes envolvidos em casos do tipo gera um círculo vicioso com mais mortes cometidas por agentes.
“Todas as pesquisas já realizadas sobre o tema mostram um cenário igualmente preocupante, com proporções de arquivamento de homicídios de autoria de policiais acima dos 90%. Estou falando de pesquisas nos anos 1990, 2000 e 2010”, disse Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum.
No estado do Rio de Janeiro, o período entre a abertura de investigação e o arquivamento é, em média, quase nove anos. Em São Paulo o tempo cai para dois anos.
A falta de celeridade no processo investigatório apresentada pelo Fórum é corroborado por estudo do Instituto Sou da Paz, que mostrou que 54% dos assassinatos cometidos em São Paulo no ano de 2018 não foram denunciados no final de 2019.
No Rio, o cenário é pior: 86% dos casos não foi apresentado à Justiça no mesmo período.
Excludente de ilicitude
Segundo dados do Fórum, argumentos defendendo “legítima defesa” e cumprimento do “estrito dever legal” são usados com frequência para justificar o arquivamento dos casos.
Caso comprovadas essas justificativas, o agente não poderá ser responsabilizado pelas mortes e o procedimento investigativo deverá ser arquivado, conforme o Código Penal brasileiro.
No entanto, o levantamento identificou casos com provas do uso ilegal da força por PMs em serviço.
“A pesquisa mostrou que são muito raros os casos em que há denúncia e, em geral, não decorrem de ação de policiais no horário de serviço e, sim, casos de brigas ou conflitos banais ou mesmo acidentes de trânsito. Ou seja, o excludente de ilicitude já é tão amplo que nem transforma em processo a maioria dos casos de homicídios provocados por policiais”, afirmou Samira Bueno.
No Rio de Janeiro, 55% das denúncias levadas à Justiça foram assinadas pelo mesmo promotor, que apontou que os policiais tentaram camuflar os crimes usando os argumentos de excludente de ilicitude.
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