Sociedade

FEP faz ato contra apoio da Fiesp à ditadura

Cerca de 30 manifestantes da Frente de Esculacho Popular protestaram contra apoio logístico da federação e do banco Itaú à repressão

Ato reuniu cerca de 30 pessoas
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Cerca de 30 pessoas se juntaram à Frente de Esculacho Popular (FEP), nesta quarta-feira 9, em um ato para denunciar o suposto apoio da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e do banco Itaú à ditadura civil militar que vigorou no País entre 1964 e 1985.

Antes de sair em direção à Fiesp, o grupo colocou cartazes em canteiros da avenida nos quais tentava explicar por que o Itaú colaborou com a ditadura. “Os vínculos do Itaú com a ditadura foram tamanhos que um de seus controladores, Olavo Setúbal, foi prefeito nomeado (sem voto popular) de São Paulo, de 1975 a 1979. Em 2014, o mesmo banco distribuiu uma agenda a seus clientes, chamando o dia 31 de março de “aniversário da Revolução de 1964”, dizia o cartaz.

Os manifestantes levaram até a entrada na Fiesp, no número 1.313 da avenida Paulista, a faixa que dizia “Fiesp financiou a ditadura civil militar”. Apoiados pela bateria da Fanfarra do M.A.L., os presentes gritavam frases de ordem como: “Não esquecemos a ditadura” e “Assassinatos e tortura!”.

“A Fiesp é o símbolo da ditadura, que beneficiou a classe dominante. Não à toa Geraldo Resende de Mattos ia todos os dias ao Dops entregar listas com nomes dos trabalhadores a serem perseguidos pelo regime”, disse ao microfone Ivan Seixas, ex-militante do Movimento Revolucionário Tiradentes e atual assessor da Comissão Nacional da Verdade e da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. Ele lembrou ainda que livros de visita do Dops de São Paulo mostram que o “Dr. Geraldo” frequentava o centro de repressão e tortura até quatro vezes por semana entre 1971 a 1978. “A Fiesp deu dinheiro para a repressão, para o Dops, para o DOI-Codi. Temos de exigir que faça retratação pública e reparação às famílias dos trabalhadores.”

Da mesma opinião comparte Maria Amélia Teles, ex-militante do PCdoB que lutou na Guerrilha do Araguaia. “As empresas devem ao Estado brasileiro uma prestação de contas e deveriam ser punidas”, disse. “Monumentos, criação de centros de memória, financiamento de projetos pedagógicos para uma formação cidadã e nomear estruturas dessas empresas com nomes de mortos e desaparecidos durante a ditadura são algumas das opções de reparação.”

O folheto que era distribuído aos transeuntes em frente à sede da Fiesp criticava o apoio da federação e de empresários, como Henning Boilesen (Ultragaz), Gastão de Bueno Vidigal (Banco Mercantil de São Paulo) e João Batista Leopoldo Figueiredo (Itaú e Scania), à repressão. O informe falava também que empresas como a “Ultragaz, Ford, Volkswagen, Camargo Correa e Chrysler auxiliaram também na infraestrutura, fornecendo carros blindados, caminhões e refeições pré-cozidas”.

A caminho do metrô, a estudante Joana Ramos, 16 anos, contou estar surpresa com as informações que o protesto tratava de revelar. “A Fiesp para mim era uma coisa importante. Achei que ajudasse a população e não a torturasse. Fiquei decepcionada.”

Marcha dos Trabalhadores. O ato marcado que durou das 12h às 14h, no entanto, parecia esvaziado. Em frente ao Masp, também na avenida Paulista, uma passeata envolvendo as principais centrais sindicais bloqueou a passagem de carros e ônibus que seguiam em direção ao centro. Segundo a Polícia Militar, a 8ª Marcha da Classe Trabalhadora por Mais Direitos e Qualidade de Vida, organizada pela CUT, Força Sindical, CTB, Intersindical, UGT, CGTB e Nova Central, reuniu cerca de 10 mil pessoas.

Do outro lado da avenida, dentre as 30 pessoas que acompanharam a FEP em direção à Fiesp, no entanto, ex-militantes como a italiana Tereza Isenberg carregavam fotos de presos políticos cujos corpos estão até hoje desaparecidos. “Sei bem o que são os anos pós-ditadura. Se não tivermos o cuidado de denunciar e lutar contra esse veneno, o autoritarismo voltará”, disse Tereza que ajudou brasileiros durante o exílio na Itália.

De acordo com o grupo que organizou o ato, apesar de geralmente os alvos dos “esculachos” serem agentes da repressão, torturadores e médicos legistas que assinavam laudos falsos para encobrir mortes pelas mãos de agentes torturadores do Estado, a ideia de buscar responsabilizar a Fiesp e o Itaú teve como objetivo lembrar que a ditadura não foi apenas militar, mas teve uma forte presença do braço civil da sociedade, especialmente do empresariado.

“A Fiesp patrocinou o golpe, denunciou os trabalhadores e usufruiu do golpe”, afirmou o deputado Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão da Verdade “Rubens Paiva”. “Para haver reparação, tem de haver o desprezo do povo brasileiro: um selo para identificar ou uma lista com todas as empresas que colaboraram, inclusive as multinacionais. Não podemos esquecer que o Dr. Geraldo, como cão de guarda, assistia às sessões de tortura às quais éramos submetidos.”

Segundo a FEP, documentos do SNI (Serviço Nacional de Informação) mostram que empresários colaboraram com a ditadura, através do fornecimento de informações sobre seus trabalhadores, através das chamadas listas negras, contribuições financeiras (as caixinhas) e apoio logístico aos centros de tortura como o DOI-Codi de São Paulo, em troca de favorecimento econômico por parte do Estado.

“A grande decepção em relação à Comissão Nacional da Verdade é que ela não traz em nenhum momento a opção de punição dos torturadores agentes do Estado, dos médicos legistas e dos financiadores que fizeram o Brasil passar por essa ditadura extremamente sangrenta”, explica Lavínia Clara Del Roio, uma das membros da FEP e filha do ex-militante da ALN José Luiz Del Roio. “E enquanto a impunidade do passado não é enfrentada, a impunidade do presente a gente vê cotidianamente na violência policial, nas mortes na periferia”, concluiu.

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