Saúde

Sambistas da periferia de SP fazem campanha na luta contra o coronavírus

Músicos que moram na zona sul da capital paulista relatam ajuda e dificuldades

Grajaú, na zona sul de São Paulo (Foto: Augusto Diniz)
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Pessoas envolvidas no movimento do samba no extremo sul da capital paulista contam os esforços e dificuldades para tentar amenizar o impacto do coronavírus na periferia da cidade mais atingida pela epidemia.

No populoso bairro do Grajaú, Jefferson Santiago, fundador e percussionista do Pagode da 27, uma das mais importantes rodas de samba de comunidade de São Paulo, afirma que a preocupação com o vírus existe parcialmente entre os moradores.

“Tem um grupo que tem informação e está respeitando. Tem outro que não se deu conta do que se trata a epidemia. O pessoal fica em bar. A criançada continua jogando bola na quadra”, relata ele, que vive na localidade e depende da música para sobreviver.

Nesses lugares, o boato de pessoas possivelmente infectadas corre solto, mas a confirmação é incerta. “Não conheço ninguém. Mas toda hora tem boatos de que deram entrada no Hospital do Grajaú com sintomas.”

Mas a inquietação maior é com o ganha-pão. “Aqui na periferia as pessoas têm trabalho autônomo, por conta própria. E a economia que gira aqui são de pequenos comércios que estão bem afetados. Antes já se passava dificuldade, agora está pior.”

Uma campanha do Pagode da 27 tenta arrecadar alimentos aos mais necessitados do bairro. Esse trabalho tem sido conduzido por Flávio Sarmento Barboza, responsável pela área social da roda de samba.

Morador do Grajaú e professor de línguas, ele não reconhece os moradores preparados para lidar com a epidemia. “Talvez por questão de espaço, de capacidade de controlar seus hábitos a todo momento. Mas tem que se cuidar. Quando começarem a ver as pessoas próximas doentes, farão esforço a mais.”

Flávio diz que tem visto dificuldade financeira de vários moradores do Grajaú com a quarentena. “Neste mês de abril, as necessidades vão aumentar e não sabemos até quando”, avalia.

“O que mais me preocupa é a capacidade do nosso sistema de saúde pública de atender a todos que precisarem. Receio que muitas pessoas morram sem atendimento.”

Vela apagada

O Samba da Vela, a mais tradicional roda de samba de São Paulo, com 20 anos em atividade, não está funcionando por conta da quarentena assim, como o Pagode da 27. No casarão em Santo Amaro onde se realiza o encontro às segundas-feiras, a vela está apagada.

José Marilton da Cruz, o Chapinha, fundador do Samba da Vela, mora no Jardim das Flores, próximo à Estrada do M’Boi Mirim.

“Teve uma pessoa da rua, que é diarista, que parou de trabalhar em três casas porque os patrões pediram para ela não ir mais. E ela depende disso de dia para trazer as coisas para casa de noite”, conta ele sobre uma dos conhecidos que teve que ajudar.

“A gente não sabe como vai ficar. Vai ser duro. Já estou vendo quando o Samba da Vela voltar. Como vamos fazer para ajudar o povo. A gente sempre fez campanha.”

Para Chapinha, “perder emprego a gente suporta, tem condição de arrumar, mas se perder a saúde, danou-se.”

O sambista William Fialho, também ligado ao tradicional Samba da Vela e integrante do grupo A Tríade CPF, vive no Jardim Ibirapuera e é outro morador da Zona Sul de São Paulo. Ele tem visto as pessoas apreensivas, se guiando no que a grande mídia tem falado sobre o tema.

“Ao certo mesmo ninguém sabe o que de fato está acontecendo. Estão tentando levar os dias como podem. Muitos estão tendo que ir trabalhar, mesmo com medo, outros estão sem trabalho, e alguns privilegiados conseguem trabalhar de casa”, relata.

“Além de pegar o vírus, vejo que a preocupação maior é a questão econômica, desemprego, falta de dinheiro para as necessidades básicas de sobrevivência.”

O músico conta que existe uma associação cultural no bairro, o Bloco do Beco, que está arrecadando alimentos para os moradores mais vulneráveis.

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