Política

“Desastre e omissão”: Ex-ministros da Saúde avaliam gestão de Pazuello

General será efetivado nesta quarta-feira e terá de lidar com o corte orçamentário na Saúde

(Foto: Erasmo Salomão/MS)
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Três meses e meio depois de ocupar interinamente o cargo de ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello será efetivado no posto, em cerimônia agendada para esta quarta-feira 16, às 17h, no Palácio do Planalto.

A nomeação é um “desastre”, na visão do médico e ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, que ocupou o cargo durante o governo da ex-presidente Dilma Roussef. “Sacramenta a ocupação militar do Ministério da Saúde em meio à maior pandemia da história do País”, avalia.

Outro ex-ministro da pasta, Humberto Costa, que atuou na gestão do ex-presidente Lula, classifica a nomeação como um “equívoco profundo” e cita omissões de Pazuello frente ao ministério.

Marcas da gestão Pazuello

Pazuello assumiu o cargo no dia 16 de maio, um dia depois de Nelson Teich – o segundo ministro a ocupar a pasta na pandemia, depois de Luiz Henrique Mandetta (DEM) – pedir demissão. Criticado por não ser da área da saúde, o general do Exército foi enaltecido pelo presidente Jair Bolsonaro em diversas oportunidades, por sua capacidade de gestão e por seu conhecimento logístico, o que poderia ajudar estados e municípios a obterem recursos e desenharem ações de combate à Covid-19 com mais facilidade.

Na contramão do que foi prometido, Padilha entende que o que marca a atuação de Pazuello é a “explosão de casos” da doença, além da “paralisação total da capacidade de resposta do Ministério da Saúde e do Sistema Único de Saúde (SUS)”.

“É um ministro que chegou com o discurso da capacidade logística e se torna efetivo com 9 milhões de testes estocados no Ministério. Enquanto isso, o Brasil está abaixo dos 50 países com o maior número de testes para cada milhão de habitantes“, complementa.

Além de não ver traços de uma gestão eficiente no combate à Covid-19, Humberto Costa fala em omissão do atual ministro e em “uma postura de boicote ao trabalho de estados e municípios na promoção do isolamento social”.

Militarização da Saúde e explosão de casos

Pazuello também liderou uma mudança de protocolo no Ministério da Saúde, anunciada após a saída de Teich e pretendida pelo governo desde a gestão Mandetta.

A nova diretriz determinou que os pacientes procurassem as unidades de saúde mesmo diante de sintomas leves da doença.

Outra mudança significativa foi em relação à autorização médica para prescrever a hidroxicloroquina para tratar casos leves de Covid-19, ainda que não haja comprovação científica da efetividade da medicação. O ministro, assim como o presidente Bolsonaro, é defensor do uso off label do remédio.

“Ele colocou como orientação do Ministério a utilização de fórmulas milagrosas, que não têm nenhum tipo de efeito concreto sobre a doença”, critica Costa, que ainda cita o desmonte do Ministério da Saúde.

Segundo ele, “profissionais técnicos, preparados, foram substituídos por pessoas sem formação na área da Saúde“. Até maio, Pazuello já havia nomeado cerca de 20 militares para postos importantes na pasta.

Para Padilha, a ocupação militar da pasta “tem total responsabilidade sobre a progressão dos casos e mortes por Covid-19”.

No dia em que Pazuello chegou ao comando do Ministério, o Brasil tinha um total de 15.662 mortos e 233.511 casos confirmados. Ele se efetiva no cargo de ministro com 133.207 óbitos e 4.384,299 milhões de casos confirmados, segundo levantamento do consórcio de imprensa, divulgado na terça-feira 15.

“As Forças Armadas serão cobradas disso na história. A ocupação é feita por generais e militares da ativa, eles não estão na reserva, ou seja, é uma ação das Forças Armadas. A principal responsabilidade, nesse sentido, talvez seja a de calar qualquer tipo de voz dissonante por parte do Ministério da Saúde em relação aos arroubos genocidas de Bolsonaro. A pasta se calou diante de posturas do presidente, como as incitações à aglomeração [Pazuello chegou a participar de algumas delas]. O Ministério também se calou diante dos vetos de Bolsonaro a leis aprovadas pelo Congresso Nacional, caso da proteção dos povos indígenas, da obrigação de uso de máscaras em locais de aglomeração, do benefício aos trabalhadores de saúde vítimas da Covid-19. Todos os vetos foram acompanhados por um silêncio absoluto da pasta. Há uma responsabilidade direta”, afirma Padilha.

Desafios do novo ministro

Para Padilha e Costa, é central, embora não esperado, que Pazuello enfrente o corte da ordem de 35 bilhões de reais no orçamento do SUS para 2021, conforme previsto pelo governo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), enviada ao Congresso Nacional.

Os ex-ministros reiteram que a pandemia do novo coronavírus causou o represamento de muitas demandas de saúde pelo País e que isso deve sobrecarregar o sistema em 2021.

 

“O governo Bolsonaro foi irresponsável ao não promover efetivamente o controle dos novos casos de coronavírus. Com isso, hospitais, UTIs e demais estruturas do SUS ficaram sobrecarregadas e não conseguiram dar vazão a outros atendimentos. Estamos falando de cerca de 300 mil cirurgias adiadas, e também do adiamento de diagnósticos importantes de câncer, doenças cardíacas, acompanhamento de doenças crônicas, interrupção da oferta de medicamentos de uso contínuo”, enumera Padilha.

Costa afirma que o orçamento sinalizado colocará o País diante de “uma crise de financiamento da maior gravidade”. O ex-gestor entende que Pazuello não tem peso político para enfrentar o Congresso Nacional e sinaliza “um ano trágico para a saúde brasileira”.

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