Educação
Vereadores aprovam a criação de escolas cívico-militares em Aracaju
A implementação, porém, cabe à prefeita Emília Corrêa (PL), que tem expressado contrariedade à matéria
Em sessão marcada por embates, a Câmara de Vereadores de Aracaju aprovou nesta quinta-feira 4 o projeto de lei que institui um programa de escolas cívico-militares na capital sergipana. O texto ainda passará por novas votações na Casa e, depois, segue para sanção da prefeita Emília Corrêa (PL).
Moana Valadares (PL) apresentou a proposta em agosto, mas a tramitação acelerou nesta semana em uma tentativa de “salvar” emendas parlamentares do marido da vereadora, o deputado federal Rodrigo Valadares (União-SE), destinadas ao programa. Como a modalidade sequer existia na capital, seria preciso criá-la antes para que os recursos da União atendessem ao objetivo.
O projeto abre caminho para que a gestão municipal firme convênios com militares da ativa e da reserva, instituições armadas e até entidades privadas para gerir as instituições de ensino municipais, inclusive aquelas dedicadas à educação infantil.
O projeto diz que as escolas poderão ser convertidas em cívico-militares com base em indicadores de “vulnerabilidade social, violência e desempenho” — parâmetros que, em outros estados, servem de justificativa para implementar a modalidade em comunidades mais pobres.
De acordo com o texto, a conversão de uma escola ao modelo cívico-militar será precedida de consulta pública à comunidade escolar. Militares não poderão exercer funções de docência, direção ou orientação pedagógica, trabalhando apenas em atividades de caráter disciplinar, cívico-formativo e de apoio à segurança.
Parlamentares de PT, PSB e PSOL se manifestaram contra o projeto, aprovado com apoio de 12 vereadores. Camilo Daniel, presidente do diretório petista em Aracaju, afirmou à reportagem que acionará a Justiça para barrar a implementação do programa.
Quem também rechaçou a proposta é o vereador Isac Silveira, líder da prefeita na Câmara. Emília tem expressado contrariedade à matéria por considerá-la inconstitucional, conforme relatou a pelo menos dois interlocutores ao longo da semana.
A gestora está de saída do PL de Jair Bolsonaro e deve se filiar ao Republicanos nos próximos dias. A troca de legenda teria irritado o casal Valadares, que apostava nela como cabo eleitoral para as eleições de 2026. A votação a toque de caixa, avaliam aliados de Emília ouvidos sob reserva por CartaCapital, seria uma forma de “constrangê-la” e “pressioná-la por uma posição diante da base bolsonarista”.
Para o Sindicato dos Profissionais do Ensino do Município de Aracaju, o Sindipema, a criação do programa de escolas cívico-militares é inconstitucional e compromete “o pluralismo e a gestão democrática” nas escolas.
O modelo existe desde os anos 1990 e ganhou fôlego nas últimas duas décadas, principalmente sob o governo Bolsonaro. Em 2019, o então presidente deu caráter nacional à modalidade por meio do Programa de Escolas Cívico-Militares (Pecim), até então restritas a programas estaduais e municipais. O programa foi encerrado nos primeiros meses da atual gestão Lula (PT).
Mesmo assim, o modelo não desapareceu. Estados governados por aliados ou ex-aliados de Bolsonaro — como Paraná, Goiás, Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e o Distrito Federal — mantêm ou ampliam seus próprios programas.
Outros, como Rio Grande do Sul, mesmo sem alinhamento político com a extrema-direita, também investem na continuidade. Há também unidades no Rio de Janeiro e no Pará, estados que nunca fizeram parte do Pecim, mas têm programas ligados às PMs locais.
Em junho de 2025, o Comitê de Direitos da Criança da ONU recomendou que o Brasil proíba a militarização das escolas públicas. A manifestação ocorreu em resposta a uma denúncia de parlamentares do PSOL sobre o programa de escolas cívico-militares instituído em São Paulo pelo governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos).
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