Política
‘Temos todos os elementos que apontam para o genocídio’, diz Silvio Almeida sobre o povo Yanomami
O ministro não descartou possível responsabilização de Bolsonaro e Damares, mas atrelou a possibilidade ao andamento das investigações


O Ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, disse que já há elementos suficientes para provar que houve crime de genocídio contra o povo Yanomami, e que resta apenas identificar os autores do ato.
“Um crime tem que ter materialidade e também autoria. A gente já tem a materialidade, agora a gente precisa achar a autoria”, disse em entrevista à Folha de S. Paulo. Ou seja, temos todos os elementos que apontam para o genocídio: a tentativa de destruição do modo de vida que permite que aquela comunidade continue existindo conforme as suas tradições e sua cultura; impedir que as pessoas retirem justamente desse modo de vida a forma da sua subsistência material; impedir que as pessoas possam expressar sua cultura; negar, quando é sua responsabilidade, auxílio diante de algo que pode dizimar um determinado povo”.
O ministro não descartou possível responsabilização ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e à ex-ministra Damares Alves, mas atrelou a possibilidade ao andamento das investigações.
“Precisamos apurar, mas não se chega a uma tragédia desse tamanho sem responsabilidade”, acrescentou. “Essa pasta é responsável por relatar e por apontar as violações de direitos humanos e encaminhar as providências necessárias para isso, então o que nós vimos foi uma omissão que, a depender daquilo que for levantado nas investigações pelos órgãos competentes, a gente pode classificar como omissão criminosa. Há fortes indícios de omissão”.
Almeida ainda chamou de ‘inédita’ a situação verificada junto aos povos indígenas, que enfrentam grave crise humanitária. “Ao que me consta, nunca existiu uma ação que tivesse um caráter deliberado de virar as costas para o problema, pelo menos não desse jeito, com um processo de desmonte das instituições. O que vivemos nos últimos quatro anos é inédito desde a redemocratização”.
O ministro ainda defendeu que seja pensado um novo modelo econômico para a região, e considerou ‘incompatível’ o bem estar dos yanomamis com o garimpo realizado na região. “Para além da retirada dos garimpeiros, é preciso um trabalho de reconstrução da matriz econômica, para não cair nas garras do garimpo ilegal [novamente]”, ponderou, ao defender estratégias articuladas com o Ministério do Desenvolvimento Social.
“A gente tem que discutir como fazer com que a região possa se sustentar, que as pessoas vivam dignamente sem depender da atividade do garimpo. Isso só acontece se houver uma intervenção do Estado, estabelecendo as condições materiais para outro modo de existir, outro modo de organização econômica”.
Sobre um possível apoio aos trabalhadores do garimpo ilegal, Almeida reconheceu que a situação requer um olhar cuidadoso, mas disse não gostar de se referir a essas pessoas como vítimas.
“Não gosto dessa dicotomia vítima e culpada, prefiro exploradores e explorados. Mas, se a gente for utilizar o termo vítima, isso cabe aos yanomamis, que estão passando fome, tendo sua vida destruída, não têm mais como reproduzir a sua existência naquela que historicamente é a região em que eles se reproduzem enquanto povo. Mas isso não quer dizer que a gente não tenha que olhar essa situação com o cuidado que ela merece”.
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