Justiça
Ronnie Lessa e Élcio Queiroz são condenados pelo assassinato de Marielle
Lessa recebeu uma pena de 78 anos e 9 meses de prisão, enquanto Élcio foi condenado a 59 anos e 8 meses


O ex-policiais militares Élcio Queiroz e Ronnie Lessa foram condenados, nesta quinta-feira 31, pelos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista Anderson Gomes. Réus confessos, eles foram sentenciados quase 2.500 dias depois do crime. As penas foram anunciadas pela juíza Lucia Glioche, que preside o 4º Tribunal do Juri do Rio de Janeiro.
Lessa recebeu uma pena de 78 anos e 9 meses de prisão, enquanto Élcio foi condenado a 59 anos e 8 meses. Eles também terão de pagar uma pensão ao filho de Anderson e indenizar familiares das vítimas em um total de 3,53 milhões de reais.
O promotor Eduardo Morais, integrante da equipe do Ministério Público fluminense envolvida no julgamento, afirmou que o órgão analisará a diferença nas penas impostas aos réus.
“A princípio, vimos uma diferença de 20 anos do Élcio para o Ronnie. Me parece uma discrepância grande, mas vamos ver com calma o que a juíza considerou. Se for o caso, vamos recorrer.”
Ambos respondiam pelos crimes de duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa da vítima); tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves, assessora de Marielle que estava no veículo; e receptação do Cobalt prata, clonado, usado na execução.
Marielle e Anderson foram assassinados na noite de 14 março de 2018 dentro de um carro na região central do Rio. Lessa e Queiroz estavam no Cobalt prata e seguiram a vereadora desde a Casa das Pretas, na Lapa, onde ela havia participado de um evento. A dupla emparelhou ao lado do veículo onde estava a psolista e disparou.
A vereadora foi atingida por quatro tiros, enquanto Anderson levou três. Fernanda sobreviveu e foi atingida apenas por estilhaços. Os dois assassinos foram presos dois dias antes de o crime completar um ano, em março de 2019. Lessa foi o autor dos disparos contra o veículo em que Marielle estava. Queiroz dirigia o Cobalt prata.
Ao ler a sentença, a juíza Lúcia Glioche chamou a atenção para os anos de dor que os familiares de Marielle e Anderson passaram e disse que a decisão dos jurados não acaba com o sofrimento. “Talvez Justiça fosse que o hoje o dia jamais tivesse ocorrido, talvez Justiça fosse Anderson e Marielle vivos”, disse.
“A Justiça por vezes é lenta, é cega, é burra, é injusta, é errada, é torta, mas ela chega. Ele chega para aqueles que como os acusados acham que jamais serão atingidos pela Justiça.”
A leitura da sentença foi aplaudida pelos que estavam no plenário. Familiares de Marielle que acompanharam o julgamento se emocionaram com o resultado. Ao final, afirmaram à imprensa que a condenação dos ex-policiais representa um marco para a democracia brasileira, mas não encerra a luta pela completa responsabilização dos envolvidos no crime.
“Nenhuma sentença é reparadora. Nenhuma condenação é restauradora da ausência. Não é felicidade o que sinto. O corpo e o coração permanecem tensos. Mas há a sensação de algum alívio em ver alguma materialidade nisso tudo, uma explicação e uma responsabilização que tanto foi esperada, construída com a luta incansável de nós”, afirmou Mônica Benício, viúva de Marielle.
No mundo político, a reação foi imediata. A presidenta nacional do PSOL, Paula Coradi, comemorou o desfecho e disse aguardar pela condenação também dos autores intelectuais do assassinato. “Que não haja impunidade”, emendou. Na mesma linha, a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), enviou um “abraço de afeto” aos familiares da vereadora e Anderson.
Os acusados de serem mandantes são os irmãos Domingos e Chiquinho e Brazão — respectivamente, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e deputado federal. Já o delegado Rivaldo Barbosa, chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro à época da execução, é acusado de agir para prejudicar as investigações. Os três estão presos desde 24 de março.
Marcelo Freixo, amigo de Marielle e presidente da Embratur, classificou a condenação como “histórica” e disse que a “conivência de sucessivos governos do Rio com o crime organizado e com os bandidos que matam em nome dos interesses de poderosos” tirou a vida de vereadora.
“A Justiça deu um passo muito importante hoje. A luta agora segue pela condenação dos mandantes e para que essa estrutura criminosa que está dentro das instituições do Rio de Janeiro seja efetivamente enfrentada”, acrescentou o ex-deputado federal em postagem nas redes sociais.
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