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Rafael Correa: ‘A lawfare não destrói só a vítima, abala a democracia’

Em passagem pelo Brasil, o ex-presidente do Equador denuncia os impactos da perseguição jurídica sobre a democracia

(Foto: Sebastião Moura/CartaCapital)
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A convite de movimentos populares e do PSOL, o ex-presidente do Equador, Rafael Correa, está no Brasil para o lançamento de um observatório de lawfare na América Latina, o Centro de Estudos Latino-Americanos Pela Democracia (CELAD), integrado por professores, juristas e intelectuais do campo do Direito.

Durante uma breve passagem pela capital paulista, na quinta-feira 30, o ex-mandatário denunciou a perseguição jurídica da qual vem sendo vítima em seu país. “A lawfare não destrói só a reputação da vítima, mas abala a democracia dos países”, sentencia. 

Ao contrário de Lula, que amargou 580 dias preso em Curitiba, o ex-presidente equatoriano decidiu deixar do país até que o nó jurídico fosse desatado.Desde que deixou a presidência, em 2017, vive asilado na Bélgica com a família. “Se Lula não tivesse sido preso e pudesse ter sido candidato em 2018, Jair Bolsonaro jamais teria sido eleito”, completa. Se ex-vice, Jorge Glas, passou 5 anos preso, e recebeu liberdade condicional apenas em novembro do ano passado. 

 Antes de chegar ao Brasil, esteve na Argentina, onde participou do Fórum Mundial dos Direitos Humanos, iniciativa do governo do país.  Também participaram os ex-presidentes da Bolívia, Evo Morales, da Colômbia, Ernesto Samper, e do Uruguai, José Mujica; além da senadora uruguaia, Lucia Topolansky, a vice-presidente argentina, Cristina Kirchner e intelectuais argentinos e brasileiros. 

Segundo ele, o campo progressista tem se articulado em todo o continente para conseguir frear o avanço da perseguição jurídica que atingiu diversos líderes. “Esta segunda onda progressista é mais intensa e talvez seja também mais estável que a primeira”, aposta. “Temos mais experiência e sabemos o que fazer. Mas precisamos estar atentos, porque a direita também sabe o que fazer.”

Para Correa, a eleição de Lula no Brasil foi um “vendaval de esperança”, porque pela primeira vez as maiores economias do continente estão sob a administração de governos progressistas: Brasil, Argentina e Colômbia, além do Chile e da Bolívia.

No Equador, a perseguição política começou depois que Correa foi traído pelo seu sucessor Lenín Moreno, que se elegeu com a benção do partido Revolução Cidadã, e tão logo assumiu a presidência, passou a atender à agenda da oposição. Apesar disso, o partido de Correa ganhou espaço nas últimas eleições regionais ao conseguir eleger prefeitos nas cidades mais populosas do país. 

Ao lado de Correa, no Armazém do Campo, estavam o dirigente nacional do MST, João Pedro Stédile, o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, Analu, porta-voz da Marcha Mundial das Mulheres e Frei Beto. Medeiros, em tom de brincadeira, anunciou que os movimentos populares brasileiros lançariam uma campanha “Volta, Correa”, e Stedile completou “vamos de ônibus de São Paulo a Quito para celebrar sua vitória, presidente Correa”.

“O importante não é que eu volte à presidência, mas sim que o Equador volte para o seu povo”, retrucou o líder equatoriano, e na sequência agradeceu a solidariedade dos movimentos populares brasileiros: “me emociona que o Brasil se preocupe com o que está acontecendo no Equador porque somos um pequeno país que sequer faz fronteira com vocês. Mas esse movimento é muito importante, porque o que estamos passando lá se deve em grande parte à negligência”. 

Na onda dos governos progressistas na América Latina, a Revolução Cidadã esteve à frente da presidência do Equador durante dez anos e dois mandatos. Neste período, o país viu 7 milhões de pessoas saírem da condição de pobreza extrema, e os índices de segurança pública melhorarem. Além disso, políticas públicas de inclusão social e ampliação do Ensino Superior se expandiram por todo o território equatoriano.

Segundo Correa, hoje o Equador é um dos países mais violentos do mundo, devido à crise do governo com o narcotráfico e a falta de investimento em segurança. “Saímos de 5.6 mortes para cada 100 mil habitantes para o alarmante índice de 24 mortes a cada 100 mil habitantes. Tudo que havíamos conquistado com uma polícia moderna, bem equipada e bem treinada foi destruído em poucos anos”, denunciou. 

O evento contou com a tradicional mística do MST, uma celebração à terra, que traz o provimento para uma vida sustentável através da produção de alimentos orgânicos. Os alunos da Escola Nacional Florestan Fernandes fizeram uma apresentação com músicas tradicionais da resistência latino-americana, cujo repertório inclui Mercedes Sosa, Victor Jara e Quilapayún. De quebra, Correa voltará para a Bélgica com uma cesta de alimentos orgânicos produzidos nos assentamentos do Movimento Sem Terra e o icônico boné do MST. Durante toda a atividade, o clima foi de celebração e esperança pelo retorno de uma nova onda progressista que possa ser, de fato, mais profunda e mais estável. 

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