Política

Preocupação com uso da IA cresce e Congresso tenta regular tecnologia antes da eleição

A expectativa é que a comissão especial do Senado que trata sobre o tema apresente o relatório final em março

Foto: Pedro França/Agência Senado
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A regulamentação da inteligência artificial no Brasil deve ser pauta prioritária do Congresso Nacional imediatamente após a retomada dos trabalhos legislativos, em fevereiro. Isso porque, com as eleições municipais se aproximando, parlamentares têm manifestado preocupação com o uso desenfreado da tecnologia.

CartaCapital apurou que a comissão especial do Senado que trata sobre o tema deve apresentar seu relatório final em março. A principal proposta em análise foi apresentada por Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e não menciona diretamente as eleições – mas, segundo integrantes do colegiado, o texto pode incrementar alguns pontos sobre o pleito.

A projeção feita à reportagem por congressistas a par das discussões é que o tema pode ser discutido no plenário ainda no primeiro semestre.

O projeto de Pacheco estabelece diretrizes para desenvolvimento, implementação e uso de sistemas de IA no Brasil. Entre os principais trechos está a possibilidade de identificar “participação humana no ciclo da inteligência artificial” e prevê a responsabilização por pessoas atingidas “de maneira significativa” pelo uso da tecnologia.

Três outras matérias que já tramitavam no Congresso foram incorporados ao texto do presidente do Senado, que também apensou ideias e propostas de uma comissão de juristas que estudou o tema e apresentou um relatório após mais de 70 audiências públicas.

O relator da comissão especial, senador Eduardo Gomes (PL-TO), defende a criação de regras para punir o uso indevido de IA, mas pondera que as discussões sobre o tema demandam cautela e não podem ser conduzidas a toque de caixa.

“A legislação é necessária, mas a gente não pode ter pressa demais e produzir um texto que não vai ter efeito nenhum”, disse a CartaCapital. “É preciso regular e estabelecer parâmetros. A certeza é de que não podemos ficar neste limbo.”

“O primeiro erro é achar que este é um assunto fácil. Não é, principalmente porque há quem confunda a defesa de um ambiente digital seguro com censura prévia ou cerceamento à liberdade de expressão”, acrescentou.

Na Câmara, o presidente Arthur Lira (PP-AL) classificou o tema como “urgente” em conversas recentes com aliados. Sua preocupação é que a campanha deste ano sofra uma enxurrada de material manipulado com inteligência artificial, como fotos, vídeos e áudios.

De acordo com os relatos, a avaliação do parlamentar alagoano é que o Congresso precisa impor balizas contra as chamadas deepfakes. A técnica, amplamente utilizada durante o pleito presidencial na Argentina, permite a adulteração de sons e de vídeos – neste caso, o tom, o timbre e até o jeito de alguém falar são recriados artificialmente.

Há, inclusive, a cobrança dos deputados por uma legislação específica sobre o eventual uso da inteligência artificial em manipulação de declarações para fins políticos.

Até o momento, porém, Lira e Pacheco não se sentaram para discutir qual proposta será priorizada pelas Casas. Interlocutores projetam que o encontro deve acontecer após o recesso do Legislativo.

Uso da IA na mira da Polícia

Em ao menos três estados – Amazonas, Rio Grande do Sul e Sergipe – a utilização da IA é alvo de investigações da Polícia Civil. O caso mais recente envolve o deputado federal sergipano Gustinho Ribeiro, do Republicanos, e a produção de um áudio falso com palavrões.

A esposa do parlamentar, Hilda Ribeiro, é prefeita de Lagarto, no centro-sul do estado, e deve concorrer à reeleição em outubro – a gravação atribuída ao deputado contém insultos a adversários políticos da gestora. “Criminosos montaram um vídeo com minha imagem e um áudio fake, criado por inteligência artificial”, afirmou Gustinho, em nota.

Sergipe, aliás, é considerado um dos laboratórios da Polícia Federal em episódios que tratam de crimes eleitorais cometidos por meio da manipulação de voz, com investigações sobre a divulgação de um áudio falso contra o senador Rogério Carvalho (PT), durante a campanha ao governo estadual em 2022.

A gravação, amplamente divulgada em meio ao pleito, simulava a voz do então candidato Lula (PT) e trazia declarações fraudulentas para prejudicar o parlamentar. Agentes da PF chegaram a deflagrar a Operação Dublê, no final do ano passado, para identificar os responsáveis pelo áudio.

Judiciário também busca caminhos

Do outro lado da Praça dos Três Poderes, o Judiciário também tenta encontrar caminhos para estabelecer limites à IA durante a disputa eleitoral. O Tribunal Superior Eleitoral chegou a publicar, em 4 de janeiro, uma minuta da resolução que deve servir de base para o uso da tecnologia na campanha.

As diretrizes elaboradas pela ministra Cármen Lúcia, que assume o comando da Corte no meio deste ano, ainda precisam ser discutidas em audiências públicas. Depois disso, os ministros terão de bater o martelo sobre as normas em julgamento no plenário até 8 de março.

Como mostrou CartaCapital, o documento que trata de propaganda eleitoral não proíbe o uso da IA, mas exige que a informação sobre o recurso esteja clara. A peça produzida com IA, acrescenta, tampouco pode prejudicar a reputação do adversário.

“(A utilização) de tecnologias digitais, para criar, substituir, omitir, mesclar, alterar a velocidade, ou sobrepor imagens ou sons, incluindo tecnologias de Inteligência Artificial, deve ser acompanhada de informação explícita e destacada de que o conteúdo foi fabricado ou manipulado e qual tecnologia foi utilizada”, diz um trecho do documento.

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