Economia

Os questionamentos de deputados a Haddad sobre a subvenção do ICMS

Reunião de líderes da Câmara com ministro da Fazenda termina sem acordo para votação do projeto e falta de respostas a parlamentares

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, recebeu pelo menos dois questionamentos sobre o projeto que regula benefícios fiscais por meio das subvenções do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, em reunião com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e líderes partidários nesta quarta-feira 8.

Segundo parlamentares que estiveram no encontro, na residência oficial de Lira, o ministro acolheu as críticas sobre o temor de que as novas regras prejudiquem empresários e disse que ainda deve estudar possíveis alterações na proposta.

Os congressistas, portanto, permanecem sem respostas e não têm perspectivas de data para votação, nem forma de tramitação, nem relator.

Conforme mostrou CartaCapital, o projeto que trata da subvenção do ICMS é a pauta de arrecadação prioritária de Haddad na reta final deste ano no Congresso. O petista quer mexer nos incentivos fiscais cedidos a empresários para obter pelo menos 35 bilhões de reais no ano que vem.

Atualmente, os governos estaduais concedem descontos no ICMS, como forma de oferecer às empresas um ambiente mais atrativo para os negócios. Esses benefícios permitem que as empresas economizem na compra de itens para modernizar as suas atividades, como a aquisição de equipamentos e a ampliação de estrutura. São as chamadas “subvenções para investimentos”.

Desde os anos 1970, os recursos que as empresas economizam com esses incentivos não eram alvos de impostos federais. No entanto, o governo Lula (PT) diz que empresas passaram a usar esses descontos no ICMS no custeio do dia a dia, e não apenas na compra de itens de modernização. O problema é que muitas delas passaram a incluir essas economias com custeio na isenção dos impostos federais.

O projeto, então, consiste em possibilitar que o empresário se livre da tributação federal somente quando fizer uso desses incentivos para investir de fato na ampliação de seus negócios.

Segundo apurou a reportagem, Haddad compareceu na reunião de líderes da Câmara para reduzir resistências e argumentar a favor do projeto. Os questionamentos dos líderes, sem respostas, foram sobre:

  • O aspecto retroativo do projeto;
  • A nova lógica da tributação.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O aspecto retroativo do projeto

Parlamentares expuseram o temor de que as novas regras prejudiquem empresários que, nos últimos anos, instalaram negócios sob a perspectiva de receber os benefícios fiscais que agora podem ser suspensos.

Outra preocupação é de que empresários tenham que arcar com os valores de forma retroativa, ou seja, pagando impostos que, para a Fazenda, deveriam ter sido pagos nos cinco anos recentes.

Haddad não apontou como resolver essas questões, segundo parlamentares.

A posição da Fazenda é de que o imbróglio começou com o governo de Michel Temer (MDB). Antes disso, havia uma separação que permitia que subvenções para custeios fossem excluídas dos benefícios fiscais voltadas para subvenções de investimentos.

No entanto, em 2017, foi aprovada a Lei Complementar 160, que estipulou que todos os benefícios de ICMS “são considerados subvenções para investimento”, o que teria possibilitado que empresários incluíssem os custeios nesse rol de benefícios.

A ideia pregada na época era a de flexibilizar os incentivos para acabar com a “guerra fiscal” e melhorar o ambiente de negócios nos estados. Haddad, porém, critica a perda de arrecadações no período deste então.

Apesar da mudança na lei, a aplicação virou caso de Justiça. Em julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, o Carf, houve entendimentos divergentes sobre qual a condição para que o governo federal conceda o benefício quando há benefícios em ICMS.

Neste ano, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu o entendimento de que, em regra, os empresários só podem obter o benefício fiscal do Imposto de Renda e na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, impostos federais, quando a subvenção do ICMS for para investimentos.

Haddad vê a posição do STJ como favorável à sua proposta e argumenta que o seu objetivo é regulamentar a decisão dos magistrados. Há, porém, o receio de que, caso o Congresso não entre em acordo com o seu projeto, os empresários voltem a recorrer na Justiça, dessa vez no Supremo Tribunal Federal.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A nova lógica da tributação

Conforme mostrou CartaCapital, uma das principais polêmicas do projeto está relacionada à devolução dos créditos direcionados às subvenções de investimentos. A questão também foi levantada na reunião, segundo parlamentares ouvidos pela reportagem. Ainda que o projeto de Haddad permita o benefício fiscal de IR e CSLL sobre as subvenções de ICMS, a forma da tributação ocorreria de forma diferente.

Enquanto, hoje, as empresas já abatem diretamente as economias com os investimentos nos impostos federais, a proposta da Fazenda é de que os empresários sejam tributados sobre essas receitas.

Em seguida, os empresários comprovariam o que é de fato investimento, e só um ano depois receberiam uma compensação financeira equivalente pela Receita Federal, por meio de uma plataforma digital.

Parlamentares reportaram queixas de uma tributação mais ampla e querem restringir essa possibilidade, de acordo com fontes que estiveram na reunião. A proposta é vista pelo mercado como uma extrapolação da decisão do STJ e provoca desgaste com governadores.

Além disso, empresários reclamam de aumento de incertezas, porque mais dinheiro passaria a deixar o caixa por conta da tributação ampla, sem uma previsão exata do quanto a Receita recompensaria com o crédito.

Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Indefinições sobre votação, tramitação e relator

Após a reunião, Haddad disse à imprensa que encontrou os parlamentares “para explicar e para ouvir o que eles estão apurando na base” e relatou ter exposto “a origem do problema”.

Segundo ele, a proposta está “em construção” e mencionou a expectativa de aprovação até o fim do ano, mas confirmou não ter sido combinada data para votação, nem forma de tramitação, nem designação de relator.

O governo federal tem cerca de sete semanas para aprovar o texto na Câmara e no Senado, caso a ideia seja ter a tributação votada ainda neste ano.

Os parlamentares ainda debatem se o projeto tramitará por meio de Medida Provisória ou Projeto de Lei.

Na primeira alternativa, as regras entram em vigor a partir da sua divulgação e têm um prazo para serem validadas pelo Congresso. No caso da subvenção do ICMS, as normas já foram publicadas por meio da MP 1.185/2023, e a permanência desse formato apressaria o rito no Legislativo. Essa é a vontade do governo.

Na segunda alternativa, o projeto tem tramitação mais lenta e dá a Lira mais poderes sobre o texto.

Segundo parlamentares, a definição de MP ou PL influencia na designação de quem será o relator. O nome cotado até o momento é do deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE), mas, segundo deputados, essa escolha não foi pacificada na reunião, ainda que o pedetista tenha estado presente.

Um dos líderes ouvidos pela reportagem afirma que Lira deve escolher um relator com quem tenha mais proximidade caso decida a tramitação por projeto de lei.

Há ainda a expectativa sobre duas decisões do governo. Uma delas diz respeito à definição da nova meta fiscal: caso haja a decisão de flexibilizar o alcance do déficit zero para o ano que vem, parlamentares temem desaceleração nas votações de projetos que tratam de arrecadação de impostos.

Outra está relacionada às distribuições de cargos do governo ao Centrão. Após ceder dois ministérios e a presidência da Caixa Econômica Federal, Lula ainda é cobrado por ceder vice-presidências do banco estatal e o comando da Fundação Nacional de Saúde, a Funasa.

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