Política

O que pensa o novo líder do PT na Câmara sobre deportação de Bolsonaro, apoio a Lira e base de Lula

Em entrevista a CartaCapital, Zeca Dirceu (PT-PR) também projeta a atuação da bancada bolsonarista após os atos terroristas no DF

O deputado Zeca Dirceu (PT-PR). Foto: Wikimedia Commons
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Depois de uma acalorada discussão interna, a bancada do PT definiu o deputado federal Zeca Dirceu (PR) como o líder do partido na Câmara ao longo de 2023. A decisão ocorreu após uma disputa entre correntes do partido: a Construindo um Novo Brasil sustentava o nome de Zeca para 2023 e o de Odair Cunha (MG) para 2024. Outros grupos defendiam a indicação de Lindbergh Farias (RJ).

A tendência é de que Cunha assuma em 2024, Lindbergh em 2025 e e Pedro Uczai (SC) em 2026.

Dirceu será o primeiro líder do PT na Casa sob o novo governo Lula. Ele assumirá o posto em 1º de fevereiro, semanas após a ação terrorista de bolsonaristas em Brasília, com desafios desde a primeira hora, a exemplo da concretização do apoio do partido à reeleição de Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Casa.

Em entrevista a CartaCapital nesta segunda-feira 9, Zeca Dirceu projetou, direto de Brasília, a reação aos atos golpistas, a relação do novo governo com o Congresso Nacional e a aproximação do PT com Lira, um fiel aliado de Jair Bolsonaro (PL) ao longo dos últimos anos.

Confira os destaques:

CartaCapital: Qual é o seu balanço dos atos terroristas de domingo?

Zeca Dirceu: Um balanço muito negativo, muito triste e preocupante. Não é um fato isolado, porque temos uma sequência de fatos nos últimos anos que desembocaram nisso. Bolsonaro é o grande responsável. Sempre foi o estimulador, o incentivador, e agora se omite, manda mensagens cifradas. O governo do Distrito Federal, o governador e o secretário de Segurança Pública, foram totalmente omissos. A gente vinha alertando desde o final de dezembro sobre essa movimentação, os deputados estavam atentos a isso. Agora, precisa de fato identificar e punir todos os que participaram e todos os que ajudaram a organizar e a financiar não só os atos de terrorismo em Brasília, mas o que ainda acontece na maioria dos estados, com ocupação de rodovias, refinarias de petróleo, bloqueios próximos a aeroportos. Tarefa árdua, mas que, com a tecnologia que a gente tem hoje, temos toda a condição de colocar em funcionamento.

Sugeri ao ministro Alexandre de Moraes que o Tribunal Superior Eleitoral e o Ministério Público reativem o aplicativo Pardal, que as pessoas já sabem utilizar. Ali dá para anexar foto e vídeo e formalizar as denúncias. É o jeito mais fácil de identificar todos os que participaram desses atos.

O Ministério da Justiça acolheu uma sugestão nossa e disponibilizou um endereço de e-mail [[email protected]] para todo mundo mandar foto, vídeo, nome, identificação de quem estava lá presente nos atos e de quem, a partir dos municípios e dos estados, divulgou ônibus, pagou ônibus, financiou os atos.

É um processo em curso que acho que vai ter um resultado muito amplo. Vai ter muita gente presa, muita gente condenada, muita gente multada pelo que aconteceu.

CC: O senhor acredita que a investigação chegará a Bolsonaro? Nos EUA, deputados pedem que Joe Biden não dê “refúgio” a ele.

ZD: Vai chegar nele, nos filhos e nos aliados mais próximos. Infelizmente, alguns deputados e senadores terão ligações com o que aconteceu. Alguns continuam descaradamente dando publicidade positiva nas suas redes sociais para fotos e vídeos de ontem. Há deputados estaduais, vereadores e congressistas comemorando o que aconteceu.

É uma rede muito grande, de muita gente graúda e importante, que vai ter de sofrer também o rigor da lei. Tolerância zero, anistia zero para quem quer que for.

E se os Estados Unidos tomarem a decisão de deportar o Bolsonaro, será uma medida muito bem-vinda, uma ótima iniciativa inclusive para relação dos dois governos e dos dois países, porque ele é um delinquente que está foragido, escondido e cometendo ilegalidades. Não reconhecer até agora o resultado da eleição é uma grave atitude, uma grave ilegalidade que está ajudando a estimular esses atos criminosos e terroristas tão graves.

CC: O que o senhor espera da bancada bolsonarista a partir de fevereiro, semanas após os atos terroristas?

ZD: Espero que a grande maioria dela não se curve a esse ambiente de terror, de crime, de golpismo. Que faça oposição, critique o governo, cobre do governo o que foi pactuado com a população. É assim que se faz oposição, e foi assim que fizemos, mesmo em 2016 a presidenta Dilma tendo sofrido um golpe, mesmo em 2018 o PT tendo perdido a eleição para uma máquina de fake news e financiamento ilegal.

Tivemos o comportamento que tem de ser o de quem faz oposição: denunciar erros, cobrar promessas e exigir avanços de que o País necessita. Então, é isso o que a gente espera.

CC: O Ministério da Defesa de Lula podia ter agido de forma mais enérgica para desmobilizar os acampamentos golpistas?

ZD: A cobrança tem de ser feita a quem de fato detém a responsabilidade sobre a segurança pública [no Distrito Federal], que é o governo do DF, com o governador e o secretário de Segurança Pública. Não cabe ao Ministério da Justiça ou ao Ministério da Defesa ser o ator principal para se responsabilizar e cuidar da segurança pública em Brasília e no DF.

CC: Quais serão as prioridades de sua gestão na liderança do PT na Câmara?

ZD: Manter a bancada unida, em sintonia com a Direção Nacional do partido, em parceria plena com os partidos da federação e com as bancadas da federação. PCdoB e PV são parceiros importantes dessa nova legislatura. E manter a bancada em diálogo permanente com o presidente da Câmara, Arthur Lira, com a Mesa Diretora e com os demais líderes partidários. Principalmente, manter a bancada com uma grande sintonia ao que é importante e necessário para o presidente Lula, o governo federal e o País.

O momento exige de todos nós mais diálogo, mais entendimento, mais transparência e mais clareza nas decisões e uma unidade que talvez a gente jamais teve, que vai muito além dos partidos de esquerda, que vão oficialmente dar sustentação ao governo.

O que está em jogo é muito sério, é a normalidade democrática para o País novamente e é interromper esse ciclo de terror, ódio e violência que o Bolsonaro durante quatro anos, dia e noite, estimulou.

CC: Parte do PT e da militância criticou o apoio à reeleição de Lira. O senhor acredita que a bancada votará integralmente nele?

ZD: Sempre entendi – e inclusive me posicionei às vezes até diferente da maioria da bancada em eleições anteriores – que a disputa da presidência da Câmara não é, na verdade, uma disputa, mas uma organização de forças e de proporcionalidade para a ocupação dos espaços de comando e de poder na Câmara.

Não é hora de fazer luta política, marcar posição, mostrar distinção entre partidos e deputados. O que está sendo oferecido ao PT é bastante razoável: que o PT ocupe um cargo de destaque na Mesa Diretora, talvez até dois. Pode ser a vice-presidência, pode ser a 1ª Secretaria ou outros cargos importantes, para que o PT tenha o seu espaço devido nas principais comissões – na Comissão de Constituição e Justiça, na Comissão Mista de Orçamento.

É isso o que está em jogo. E acho que está muito bem encaminhado, da maneira como foram feitas as tratativas. Agora, vencida essa etapa traumática, a gente vai ter de retomar isso com mais detalhes, até porque a decisão tem de acontecer até o dia 1º de fevereiro. Mas estou muito otimista, muito confiante.

Acho que os acordos estão bastante razoáveis. Que o que foi combinado seja cumprido, para que os espaços de que o PT precisa, a que tem direito e que são importantes para o presidente Lula, o governo e o Brasil sejam assegurados.

O PT, ao longo dos últimos anos, por decisões equivocadas na hora de compor nas eleições de presidência da Câmara, acabou ficando em espaços secundários, em comissões de menor importância, sem exercer o poder que o tamanho da bancada determina e permite. Então, acho que estamos corrigindo uma sequência de decisões que não foram das mais acertadas em outras legislaturas. Estou aqui desde 2011, então já tem um acúmulo que me permite fazer essa reflexão.

CC: Lula não governará só com a esquerda. Quais são os principais desafios para construir uma base na Câmara?

ZD: O presidente Lula gosta da política, se dedica à política. Então, tenho plena convicção de que ele vai conseguir montar uma ótima base de sustentação ao governo. Vai ter todo o nosso apoio, todo o nosso auxílio. É claro que tem temas mais complexos, mais polêmicos, quando envolvem as questões da economia, da Previdência, do mundo do trabalho, dos costumes. Mas a gente vai estar aqui muito atento.

CC: Partidos com bancadas de peso, como União (59 deputados), MDB (42) e PSD (42) se sentem contemplados pela divisão dos ministérios?

ZD: Acredito que sim, mas é um processo não concluso. Por isso, há algumas insatisfações justas, por exemplo de um partido como o PV. Está na federação, tem seis deputados e precisa ter um espaço para participação maior no governo. Mas é uma questão só de tempo, porque o processo não foi totalmente concluído.

CC: Ainda é possível atrair o Republicanos (41 deputados)?

ZD: Acredito que é possível atrair o Republicanos e até outros partidos. Da parte do presidente Lula e da nossa parte, haverá sempre um esforço muito grande para a gente ter uma frente, a mais ampla possível, dando sustentação ao governo.

CC: O PT sai unificado da eleição para a liderança na Câmara, com um rodízio definido para os próximos anos?

ZD: Com certeza. Foi um processo de muito diálogo, muito entendimento, altamente positivo e que contemplou a todos. Algumas outras etapas ainda precisam ser vencidas, como a ocupação do espaço nas comissões. O PT terá a presidência de comissões das mais importantes e terá a relatoria de temas dos mais importantes que vão tramitar na Câmara.

Então, vou estar muito atento para manter esse equilíbrio, algo ao qual eu já vinha me dedicando, porque há muito tempo eu coordeno a Construindo um Novo Brasil, que é a corrente que há muito tempo tem o maior número de deputados da bancada.

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