Política

Nelson Teich é criticado no Senado por ainda tentar “entender” a pandemia

Repetidas vezes, ministro disse que busca ‘entender o que acontece’ com a covid-19; para parlamentares, postura revela falta de ação

O ministro da Saúde, Nelson Teich, fez sessão remota com senadores. Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado
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O ministro da Saúde, Nelson Teich, foi criticado em audiência pública no Senado Federal, nesta quarta-feira 29, por repetidas vezes dizer que ainda busca informações para entender a pandemia do novo coronavírus. Um dia após o Brasil atingir recorde no número de mortes pela doença, os parlamentares cobraram voz de comando do ministro em relação às orientações de isolamento social.

A audiência foi realizada em sessão remota, por videoconferência. Nos minutos iniciais, Teich afirmou que “vai buscar informações detalhadas em cada região”, para estabelecer diretrizes de isolamento nos estados e municípios. Segundo ele, “falar em covid Brasil é uma simplificação exagerada” e é preciso segmentar o enfrentamento à doença por regiões.

“Uma coisa importante que a gente tem que entender: primeiro, a gente vai buscar informação detalhada de cada estado e região. Num país continental como esse, o comportamento da doença é diferente nas regiões. Então, você tem áreas críticas que a gente tem que abordar e priorizar, e ao mesmo tempo onde a gente vai enxergando o que está acontecendo nos outros lugares”, disse o ministro, em sua apresentação inicial.

Para senadores, a postura de Teich revela falta de ação do Ministério da Saúde.

O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) afirmou que Teich mostrou “coragem” ao substituir Luiz Henrique Mandetta no comando da pasta, em plena pandemia, porque o presidente Jair Bolsonaro “teve a ousadia de trocar o técnico da seleção brasileira” no meio do jogo. Em seguida, pediu para que o ministro cite “três verdades” que já descobriu após ocupar o posto.

“Já ouvi o senhor dizer muitas vezes que quer fazer pesquisa, que quer fazer perguntas, que quer ter dados para poder ter respostas. Entendo isso, mas quero fazer uma pergunta muito simples. Por favor, me cite três verdades que o senhor já descobriu no Ministério. Três certezas. Três coisas que o senhor já sabe. E me diga três ações concretas”, indagou Guimarães.

Na mesma linha crítica a Teich, o senador Weverton Rocha (PDT-MA) disse que “falar que ainda vai realizar estudos e entender, isso é muito grave, porque a cada 24 horas nós temos milhares de casos”. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) declarou que “não vale mais a desculpa de que estamos estudando e avaliando”.

Tucanos também acusaram o ministro de inércia. Mara Gabrilli (PSDB-SP) disse que Teich é “leniente” com a postura de Bolsonaro em confundir a população.

“Tem que mostrar pulso firme nesse país. O senhor não pode ser mole. Vai acabar com a biografia do senhor”, protestou.

Por sua vez, Tasso Jereissati (PSDB-CE) afirmou que Teich denota “dubiedade” e “indecisão” nas ações contra o coronavírus. O tucano pediu uma orientação clara do ministro para que as pessoas fiquem em casa e afirmou que, em coincidência com sua entrada na direção do Ministério da Saúde, os índices de isolamento nos estados apresentaram queda.

“Estou tremendamente frustrado em relação às respostas que o senhor deu até o momento. Acho que há uma dubiedade muito séria. Diz que precisa conhecer melhor a doença e melhorar os testes. No entanto, no meio dessas incertezas, existe uma certeza: que o distanciamento social é a única maneira de impedir a explosão de casos”, criticou o senador.

Em defesa a Teich, o senador Esperidião Amin (PP-SC) manifestou solidariedade e afirmou que a postura expressa “humildade” em seu trabalho. Ao mesmo tempo, pediu que o ministro informe não somente sobre os compromissos que assumiu, mas também os que cumpriu.

“Aplaudo as suas dúvidas, porque elas revelam humildade, e não falta de firmeza. Eu tenho muito medo é de quem tem convicções sobre o que não conhece. Muitos que se arvoram à condição de professor, de Deus, em meio a uma pandemia onde nós somos tão ignorantes no ponto de vista científico”, disse o parlamentar. “Por favor, transmita informações claras, não sobre compromissos assumidos, mas sobre o cumprimento de compromissos.”

O senador Major Olímpio (PSL-SP) também protegeu Teich e disse que não é possível cobrar dele uma conduta que deve ser adotada pelo presidente da República.

O ministro da Saúde se defendeu das acusações e assegurou que tem tomado providências contra a covid-19, como a realização de reuniões com os governadores. Segundo ele, a pesquisa de dados não impede que ele aja contra a crise, porque a busca por informações é uma necessidade contínua. Além disso, frisou que o Ministério “nunca mudou a orientação oficial de manter o distanciamento”.

“A falta de informação não te permite enxergar bem o que está acontecendo”, disse. “Agora, buscar informação o tempo todo não tem a ver com não estar fazendo alguma coisa, ou estar esperando as coisas acontecerem. São coisas diferentes. A gente trabalha e tem ação o tempo todo. E ao mesmo tempo a gente continua buscando informações cada vez melhores. Uma coisa não exclui a outra.”

Ministro busca entender pandemia desde que entrou

Desde que entrou no cargo, em plena pandemia, Teich tem reiterado a sua preocupação em “tentar entender o que acontece” com a covid-19.

Em discurso de 16 de abril, quando foi anunciado ministro, Teich afirmou que “é fundamental que a gente tenha informação cada vez maior sobre o quê que acontece com as pessoas, com cada ação que é tomada”; disse que “é tudo confuso”; que é preciso “entender claramente o que está acontecendo”; que é necessário “trabalhar na área de dados e inteligência, para entender cada ação que a gente toma”.

Em 17 de abril, no seu discurso de posse, reforçou sobre “a importância da informação” e disse que “a pobreza de informação sobre a doença leva à ansiedade e ao medo”.

“Uma das coisas que vai nortear a gente é essa parte da informação. Capturar isso cada vez melhor, mais detalhado. Uma das coisas que é importante a gente fazer nesse momento é juntar o que a gente tem de informação na saúde, em outros ministérios, e trabalhar isso de uma forma para a gente tentar ampliar esse número de informação, trabalhar o detalhamento dele, olhar o que está faltando”, declarou.

Dez dias depois, o Brasil ultrapassou a China em número de óbitos do novo vírus e registrou 474 vítimas fatais em 24 horas, maior marca no intervalo de um dia no país.

Mas o recorde de mortalidade não fez Teich dedicar maior tempo para esclarecer o cenário e informar novas medidas. Pelo contrário: o ministro fez uma coletiva “relâmpago” de 15 minutos e apenas reconheceu que há tendência de piora da epidemia no Brasil, sem informar dados ou ações concretas. Perguntado sobre o que tem feito para dar assistência aos estados mais afetados, foi econômico.

“Hoje a gente está trabalhando para dar suporte aos estados e municípios. A gente ofertou, tem uma parte financeira, tem os respiradores, tem os EPIs [equipamentos de proteção individual], tem recursos humanos”, disse.

Em seguida, Teich pediu para o novo secretário-executivo da pasta, general Eduardo Pazuello, complementar a resposta. O único número citado por Pazuello foi o fornecimento de 185 respiradores aos estados com mais casos, a partir da quarta-feira 29.

Momentos depois, Bolsonaro disse que lamenta o recorde, mas não pode fazer nada para conter a letalidade pelo coronavírus no país.

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