Justiça
Na véspera de seu voto, Fux tensiona sessão e se reafirma como contraponto a Moraes
Os advogados de Bolsonaro e outros réus veem no ministro a chance de adiar o processo ou abrir divergência no mérito


O ministro Luiz Fux evidenciou nesta terça-feira 9 seu papel de contraponto ao colega Alexandre de Moraes no julgamento realizado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal sobre o núcleo duro da tentativa de golpe de Estado.
Fux será o terceiro a votar, provavelmente na quarta-feira 10. Mostrou divergências com o relator, porém, antes mesmo de chegar a sua vez de proferir o voto: no início da sessão desta terça, interrompeu Moraes e tensionou o clima ao reclamar de Flávio Dino, que se manifestara durante a fala do relator.
“O aparte foi pedido a mim, não a vossa excelência”, reagiu Moraes. Dino assegurou, com um pingo de ironia, que não atrapalhará o voto de Fux: “Pode dormir em paz”.
A interferência ocorreu quando Moraes examinava as chamadas preliminares — questionamentos das defesas sobre eventuais vícios do processo, como a competência do STF. Fux avisou que só se pronunciaria a respeito no momento de seu voto.
Foi o bastante para reacender expectativas no entorno de Bolsonaro. Advogados do núcleo central torcem para que Fux peça vista do processo, o que poderia adiar o julgamento por até três meses, e, sobretudo, que divirja de Moraes no mérito da acusação.
Não por acaso, o ex-presidente fez acenos a Fux até em suas alegações finais no processo. Citou um precedente aberto pelo ministro em 2022, segundo o qual a voluntariedade em delações premiadas não depende da liberdade de locomoção, mas da “liberdade psíquica” do colaborador. A menção não foi gratuita. Fux já criticara publicamente os múltiplos depoimentos de Mauro Cid, algo que Moraes relativizou no início da sessão desta terça.
Os advogados de Bolsonaro agarraram-se a esse argumento: sustentam que Cid teria perdido a liberdade psíquica diante da pressão sofrida, o que invalidaria a colaboração.
Não foi o único sinal da defesa do ex-capitão a Fux. Os advogados pediram a absolvição nos cinco crimes imputados, mas, em caso de condenação, defendem que a acusação de golpe de Estado seja absorvida pela de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
A tese ecoa ponderações apresentadas por Fux em março, quando a Primeira Turma aceitou a denúncia contra o duro do golpe. Moraes, por sua vez, reiterou nesta terça a possibilidade de condenar pelos dois crimes.
Mais do que uma discussão conceitual, a divergência de Fux pode ter implicações concretas. Uma eventual divergência de Fux poderia abrir caminho para embargos infringentes, recurso exclusivo de decisões não unânimes que permite reexaminar o mérito. Caso a condenação seja por 5 a 0, restariam à defesa apenas embargos de declaração — sem poder de mudar a essência da decisão.
Se a Primeira Turma optar por aplicar as penas máximas de cada crime, Bolsonaro poderá ser condenado a até 43 anos de prisão. A hipótese é pouco provável — ele é réu primário —, mas serve para dimensionar o tamanho do risco que corre. Em caso de condenação, a defesa pretende pleitear que o ex-presidente siga em prisão domiciliar, a exemplo do benefício concedido a Fernando Collor.
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